Jornal Estado de Minas

VITALidade

Como viver até os 100 anos: os segredos das zonas azuis



A empresa de streaming Netflix lançou um documentário, do jornalista e escritor Dan Buettner, no qual investiga as razões pelas quais em alguns pontos do planeta as pessoas vivem mais, melhor e com mais qualidade de vida. O documentarista viajou para cinco locais, denominados Zonas Azuis, buscando investigar o que fazia daquelas populações as mais longevas do mundo, nos dando indícios de que, talvez, muito do que sabemos sobre longevidade pode não ser tão óbvio quanto pensamos.



Primeiramente o documentarista foi a Okinawa, no Japão, que já foi considerada pela Organização Mundial de Saúde como a população mais longeva da história humana. Naquela comunidade foi verificado que havia menos casos de diabetes, 1/5 a menos de casos de doenças cardíacas e pouquíssimos casos de demência. Na pequena ilha ele notou que os longevos consumiam em média cerca de 2.000 calorias por dia e sua alimentação tinha como base os carboidratos complexos, que equivalia a 67% de tudo o que ingeriam. O segredo para uma ingestão controlada de alimentos se deve a um costume de parar de comer quando estão 80% satisfeitos. Os longevos não costumam ir a academias, mas fazem suas atividades domésticas e geralmente cuidam de hortas. 
Além disto, o documentarista constatou que, em meio à epidemia de solidão enfrentada pelos idosos, em Okinawa essa população fazia parte de grupos sociais chamados Moai, que são pequenos grupos de pessoas que se visitam, praticam atividades em conjunto e se apoiam mutuamente. Outro ponto também percebido foi que os habitantes da ilha tinham um profundo senso de propósito. Eles não se aposentam e ficavam inativos, pois ainda acreditam que têm uma missão a cumprir no mundo, de modo que se sentem importantes e necessários à comunidade a qual pertencem.

De lá, o documentarista viajou para a região da Sardenha, na Itália, que tem dez vezes mais centenários do que nos Estados Unidos, por exemplo. Primeiramente ele observou que a área era montanhosa, o que fazia com que os habitantes tivessem que praticar caminhadas diárias com algum esforço, mas observou que eles só caminham, nunca correm. Como em Okinawa, os idosos eram ativos e se moviam todo o tempo, mas sempre de maneira moderada. Ele notou que as práticas de cultivo e domésticas daqueles habitantes se assemelhavam às de mil anos atrás. 



Em relação à alimentação, comiam pães fermentados e os feitos com carboidratos complexos, o que reduzia sua carga glicêmica e constatou que, diverso do que ocorre no mundo, onde existem cinco mulheres para cada homem centenário, na Sardenha, essa proporção era de um para um. Percebeu que os homens trabalhavam no pastoreio e que sua carga de estresse no trabalho era baixa, já que trabalham de modo racional. Segundo o documentarista, o estresse atrapalha na longevidade e aumenta a incidência de riscos cardiovasculares.

Em relação à rede social de apoio, o documentarista percebeu que são muito fortes os laços familiares, de modo que não internam seus idosos em asilos ou casas de repouso, fazendo do cuidado ao ancião um modo de unir ainda mais os membros do grupo. Na família, os integrantes valorizam a sabedoria do idoso e entendem que sua ligação com eles é um tesouro que deve ser preservado.

Após a estada na Sardenha, o documentarista foi visitar uma comunidade em Loma Linda, na Califórnia, onde foram estudados 96 mil Adventistas do Sétimo Dia, que viviam cerca de seis anos a mais que a média dos norte-americanos. Lá constatou que eles mantinham uma rotina de exercícios não exaustiva e tinham hábitos de vida saudáveis. Seus membros afirmam que a comunidade se une em torno de uma doutrina de saúde que conduziria à santidade.



Os Adventistas do Sétimo Dia de Loma Linda são profundamente adeptos do voluntariado, o que lhes confere um senso de propósito, melhora a memória e os laços sociais. Em relação à alimentação, o documentarista constatou que 35% dos membros eram veganos e todos consumiam alimentos integrais, frutas, verduras e oleaginosas, o que faz com que pesem cerca de nove quilos a menos que seus compatriotas. 

Segundo a doutrina religiosa que seguem, eles guardam um dia da semana para um verdadeiro descanso, já que entendem que toda preocupação é inútil e suga suas forças. Aqui o pesquisador notou que as zonas azuis até então pesquisadas tinham em comum a manutenção da espiritualidade, o que proporcionaria, além do conforto existencial, também uma forte ligação com a comunidade da qual fazem parte.
Em seguida, o documentarista se dirigiu a Ikaria, na Grécia, e percebeu a necessidade de se olhar para a história e para a geografia do lugar para compreender o segredo da longevidade de seus habitantes. Em Ikaria, em meio a um solo infértil, eles precisaram desenvolver modos de se alimentar usando plantas locais - o que, com o tempo acabou fazendo com que desenvolvessem hábitos alimentares profundamente saudáveis.





O documentarista notou que os habitantes dali bebem muitos chás, tais como sálvia, alecrim e málvia, isto para citar os conhecidos por nós, e os adoçam com mel, mas não é qualquer mel. O mel de Ikaria não é pasteurizado, ou seja, não é fervido, o que faz com que conserve as propriedades naturais. Seus habitantes também consomem vinho, mas o vinho que eles mesmo fabricam, sem químicos ou aditivos, e do mesmo modo que era fabricado dois mil anos atrás. 

Sobre a convivência comunitária, percebeu que os jovens mantêm as tradições e as celebram cantando e dançando, o que o fez concluir que os exercícios físicos não precisam ser dolorosos ou cansativos, mas, ao contrário, podem ser fonte de divertimento e convivência social. O documentarista afirmou, ao sair de Ikaria, que teve uma epifania ao perceber que uma parceria feliz pode ser fonte de longevidade e concluiu que, nas zonas azuis, as pessoas reforçam e investem nas relações familiares.

Saindo de Ikaria, o documentarista foi para Nicoya, na Costa Rica, que é uma zona rural isolada no norte do país e tem três vezes e meia mais centenários que a média global, e fazendo uso de pouca ou nenhuma medicação. A renda dos habitantes é cerca de 1/6 da renda dos norte-americanos, mas sua idade biológica é de cerca de 10 anos a menos que a cronológica.



Ele percebeu que os habitantes, mesmo os centenários, mantinham uma rotina forte de trabalho. No entanto, só o faziam em um período do dia, deixando o restante do tempo para atividades que lhes dão prazer. Como em Okinawa, os locais têm muito senso de propósito, por eles chamado de Plan de Vida, o que os mantém ativos e necessários em suas comunidades.

Um dado que chamou muita atenção do documentarista foi que o gasto com saúde dos locais era de 1/10 daquele feito pelo sistema norte-americano. Todavia, seus habitantes tinham acesso a medicamentos e os médicos iam visitar os pacientes, a exemplo do que acontece no Brasil com os médicos de família; e tal situação permitia que houvesse intervenções de saúde antes de a doença se instalar. Percebeu o documentarista que um sistema de saúde eficiente é também um fator de longevidade.

Obviamente que não temos no documentário uma pesquisa científica, mas em 2009 suas conclusões foram aplicadas na pequena comunidade de Albert Lea, nos EUA, e o resultado em um ano foi o aumento da expectativa de vida de seus habitantes, o que pode indicar que seus resultados puderam, de algum modo, ser comprovados.



Em sua fascinante jornada pelas Zonas Azuis do mundo, o documentarista Dan Buettner nos presenteou com valiosas lições sobre longevidade e qualidade de vida. Suas descobertas revelam que a chave para uma vida longa e saudável vai além de simples fórmulas mágicas e repousa em princípios simples e atitudes profundas.

Comer bem, cultivar conexões sociais significativas, praticar exercícios moderados e ter um senso de propósito na vida são os pilares que sustentam essas comunidades excepcionais. Embora não se trate de uma pesquisa científica definitiva, as experiências nas Zonas Azuis e o impacto positivo em comunidades como Albert Lea sugerem que podemos aprender com essas lições e buscar uma vida mais longa e plena. O segredo para viver até os 100 anos pode não ser um segredo afinal, mas sim uma fórmula que todos nós podemos aplicar em nossas vidas.