"Se quiserem atribuir a queda ao mago Merlin, não tem problema. Os criminosos, sem diálogos cabulosos, sabem porque os crimes caem. Trabalhamos para melhorar a vida das pessoas e o que importa é que os crimes continuem caindo." Quem conhece Sergio Moro de longa data dificilmente identifica o ex-juiz em postagens como essa, feita por ele logo no começo deste ano. Na ocasião, o ministro comentava a redução dos índices de criminalidade em todo país.
Resta a dúvida se esse novo Moro vai ter apetite para voltar a magistratura, desta vez como ministro do Supremo Tribunal Federal (STF); ser vice na chapa presidencial de Bolsonaro em 2022 ou mesmo concorrer com seu atual chefe nas próximas eleições presidenciais.
Bolsonaro terá pelo menos duas oportunidades de fazer indicações ao STF, pois se aposentarão, em razão de idade, os ministros Celso de Mello, em 2020, e Marco Aurélio Mello, em 2021. É extremamente improvável que Moro seja o nome para a vaga deste ano. Hoje, o ministro é o principal ativo político do presidente, com a maior aprovação da esplanada: na última pesquisa Ibope, atuação de Moro é avaliada como ótima/boa por 53% dos brasileiros, contra 30% de Bolsonaro, uma diferença de 23 pontos percentuais.
Com uma imagem melhor que a do presidente, Moro tende a ser bastante útil para manter o apoio da população ao governo em um ano que ainda serão apresentadas pautas altamente impopulares, como a reforma administrativa. Por outro lado, evidente que Bolsonaro não pode passar a imagem de dependência do seu ministro e é nesse ponto que os aliados podem se afastar.
No fim do ano passado, o presidente sancionou o pacote anticrime com 25 vetos; mas manteve o juiz das garantias, contra a sugestão do Ministério da Justiça. A medida define que o juiz que supervisionar e presidir as investigações não poderá atuar no julgamento, como forma de garantir que os direitos dos investigados e dos réus sejam respeitados. Para Moro, a criação dessa nova figura é inviável, pois 40% das comarcas do país têm somente um juiz. Bolsonaro justificou a ratificação dizendo que não pode ir contra o Parlamento todo o tempo, mas o fato é que o presidente deliberadamente escolheu a opção que enfraquece seu ministro mais popular.
Já não é a primeira vez que o presidente faz isso. No ano passado, o presidente chegou a afirmar que o comando da Polícia Federal – subordinado direto do ministro Sergio Moro – precisa dar uma “arejada” e chamou de “babaquice” a reação de integrantes da corporação às declarações dele sobre trocas em superintendências e na diretoria-geral.
Sergio Moro não só manteve o comando da PF com Maurício Valeixo como ainda distribuiu agrados neste início de ano. O ministro criou mais 516 postos de liderança na corporação, por meio da transformação de cargos comissionados em funções de confiança. Valeixo se manifestou sustentando que a medida deu mais "responsabilidades de liderança a um maior número de servidores". Evidentemente que nada disso poderia ser feito sem o aval do presidente, o que demonstra a dinâmica do morde e assopra que baseia a relação dos dois mandatários.
Pelas declarações do entorno de Bolsonaro, a composição de uma chapa forte em 2020 parece ser a opção mais desejada. Aliás, o próprio Bolsonaro já se manifestou sobre essa possibilidade. Ele disse que é cedo para apostar na composição com o ex-juiz da Operação Lava-Jato. Mas afirmou que Moro, apesar de ainda não ter virado político, “está em adaptação” e arrematou: “Agora, tem de perguntar pro Moro se ele quer, ele agora sabe o que é política.”
O que se comenta em Brasília é que Moro tomou gosto pela coisa, mas não se sabe se toparia ser vice de Bolsonaro, caso entenda que tem capital político suficiente para ser cabeça de chapa. Moro nunca falou abertamente sobre essa possibilidade, mas nos bastidores o Podemos, partido do senador Alvaro Dias, nutre esperanças que o ex-juiz poderia se candidatar, rompendo com o atual chefe. Já existe informações circulando que parte da ala militar vê a candidatura de Moro com boa opção, caso Bolsonaro se desgaste mais ao longo do mandato.
Nesse caso Bolsonaro ainda teria a segunda vaga no STF para tentar tirar Moro da disputa. Como ainda faltam quase 2 anos para a aposentadoria de Marco Aurélio Mello, essa ainda pode ser uma possibilidade viável. O fato é que quem antecipou as discussões eleitorais foi o próprio presidente e hoje seu adversário mais forte não está na oposição, mas sim no Ministério da Justiça.