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COLUNA

Como nossa estupidez é usada para nos manipular politicamente

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Ter consciência da própria estupidez em relação à política talvez seja a única saída para a mediocridade do debate público que começa a se desenhar para o próximo ano eleitoral. O exercício de autoconhecimento é difícil, mas não impossível. No último artigo do ano, este espaço será dedicado a alguns exemplos de como nossa estupidez é usada para nos manipular politicamente.





Talvez o principal sentimento para te convencer a ir – e votar – em uma direção é aquele inerente ao instinto de sobrevivência: o medo. Os maiores absurdos da humanidade foram cometidos por medos completamente irracionais. Medo de judeus, medo do comunismo, medo do capitalismo, medo de perder privilégios, e por aí vai.

Quando algum candidato tentar incutir o receio de que, por exemplo, existe uma grande conspiração global de incentivo ao homossexualismo, pergunte como ele votou – caso tenha sido deputado ou senador – no fundo eleitoral. Sim, porque no momento em que você se preocupa com a conspiração global, você esquece que foi aprovado um aumento do fundo de R$ 5,1 bilhões para campanhas, enquanto tem criança pedindo carne para o Papai Noel.

Pois é, amigo leitor, as formas de diversionismo são muito variadas. Repetir slogans contra ou a favor de determinado candidato também é uma forma excelente de fugir da profundidade comprometedora. Enquanto você fica publicando em rede social coisas do tipo “candidato xx pela mudança”, “candidato y pela família, tradição e sei lá o quê”, passa despercebido como esse político votou em relação à isenção de IPTU para templos religiosos em imóveis alugados ou sobre a possibilidade de uma deliberação mais rápida sobre regularização dos jogos de azar no Brasil.





O debate raso faz com que exista pouca ou nenhuma responsabilidade pelo que esses parlamentares fazem em Brasília durante seus quatro anos de mandato. São leis que interferem diretamente na sua vida, leitor, mas que simplesmente passam abaixo do radar do noticiário e obviamente muito longe das campanhas eleitorais.

Jogos de azar, isenção de IPTU de templos religiosos e fundo eleitoral foram objetos de deliberação nessa última semana do ano. Agora, pergunte a si mesmo: você sabe como o senador ou deputado em quem você votou na última eleição se posicionou sobre um desses temas ou qualquer outro, leitor?

Buscar essa racionalidade – e ter consciência da nossa atual estupidez – precisa ser nosso objetivo como sociedade. Aliás, é muito comum em embates políticos o debatedor não discutir o argumento em si, mas uma caricatura desse argumento.

Por exemplo: a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recomendou que o governo passasse a exigir o certificado de vacinação em portos e aeroportos para o coronavírus. O presidente Bolsonaro retrucou: "Estamos trabalhando agora com a Anvisa, que quer fechar o espaço aéreo. De novo, porra? De novo vai começar esse negócio? (...)”. O presidente sabe perfeitamente que nunca houve qualquer recomendação da Agência de fechar espaço aéreo. Mas é mais fácil combater a caricatura do que o fato em si. Isso acontece o tempo todo, leitor.





O combate à pandemia tem sido uma excelente oportunidade de avaliação dos políticos. A criação de factoides em relação à vacinação (chip chinês, relação com AIDS, ineficiência da imunização) foram perpetrados aos montes – aliás, olha o “medo” aí de novo. Quando não se tem mais argumento, inventa-se uma consulta pública sobre a aplicação da vacina em crianças.

Leitor, o que você entende sobre vacinação infantil? Não faz mais sentido confiar na ciência? A minha opinião – e provavelmente a sua – valem muito pouco sobre isso. Trata-se somente de mais uma falácia: o Ministério da Saúde não dá a mínima para o que você pensa sobre vacina.

Desejo a todos que em 2022 tenhamos mais consciência da nossa própria estupidez, para que sejamos um pouco menos sujeitos à manipulação no ano que está por vir.