Jornal Estado de Minas

Crise semeia preocupação no setor

Para Diana Werner,da Isla Sementes, alta nos custos e mudanças climáticas são ruins - Foto: Isla Divulgação
A crise chegou ao setor de sementes, que vive um momento difícil com a instabilidade do cenário econômico e a disparada do dólar. Fabricantes nacionais e grandes multinacionais já estão lidando com uma alta nos custos e queda no faturamento. Carro-chefe no país, as vendas de sementes de soja, responsáveis por 37% do faturamento do setor, apresentaram recuo de 10% em relação ao mesmo período do ano passado.

O presidente da Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem), Narciso Barison Neto, explica que boa parte dos insumos agrícolas é negociada em dólar. “A alta da moeda para um patamar acima de R$ 4 agravou ainda mais a situação do setor. Os custos aumentaram, ao mesmo tempo em que o acesso ao crédito ficou mais restrito”, disse. Para Barison, a melhor remuneração em real para os produtores é uma “ilusão” diante do aumento de cerca de 20% nas despesas da produção. “É preciso reduzir custos e, ao mesmo tempo, oferecer sementes com tecnologia, para não perder a qualidade”, disse.

No entanto, o setor prevê que os cortes realizados pelo governo vão impactar nas ações de pesquisa do segmento. “Mesmo em um ano difícil, o produtor sabe que não pode prescindir dessa tecnologia, sob pena de perder eficiência e competitividade”, observa José Américo Pierre Rodrigues, presidente-executivo da Abrasem.

Segundo ele, na composição do custo de produção, o valor investido em sementes, em tecnologia de ponta, é baixo. “Compensa muito investir em qualidade e não correr riscos”, disse.

A associação alerta para o risco da pirataria de sementes no país. “O risco para a pesquisa que nós vemos no Brasil é o crescente nível de pirataria em culturas como a soja e o milho, já que pode ocasionar problemas fitossanitários e baixa produtividade, com reflexo negativo na qualidade e na colheita de commodities, que têm um peso enorme nas nossas exportações”, observa Pierre Rodrigues.

PREVISÕES

Para o gerente adjunto de Mercado da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Produtos e Mercado, Rafael Vivian, o produtor brasileiro está mais cauteloso com a semeadura. Segundo ele, o preço de commodities está um pouco abaixo do praticado nos últimos anos. “A safra da soja nos Estados Unidos deixa o mercado ainda mais retraído, já que, quando a disponibilidade da semente é alta lá, com altos estoques, o produtor põe os pés no freio aqui”, observa. Segundo ele, a tendência é que o país invista menos na soja, já que é o maior exportador da semente, ao lado dos EUA. “Há ainda a influência da economia da China, principal importadora de milho e soja brasileiros”, aponta.

Rafael avalia que o setor agrícola como um todo vem sentindo a pressão econômica, principalmente em relação à limitação de financiamento e a riscos associados, como o impacto direto nos preços das commodities e outros cultivos.
Ele afirma que os custos de produção e instalação da lavoura sofrem diretamente com a crise econômica. “No cenário atual, o pequeno produtor abre prerrogativas para baratear os custos da lavoura. Ele passa a usar sementes próprias, o que é permitido pela lei, em vez de investir em compras, especialmente das transgênicas, já que elas têm ainda o custo associado à biotecnologia”, explica.

Ainda segundo Rafael Vivian, as sementes envolvem 15% do custo de uma lavoura. Quanto às previsões para o mercado de sementes, o gerente da Embrapa informou que a instabilidade do cenário econômico brasileiro dificulta a análise para os próximos meses e recomenda aos produtores cautela para não comprometer a situação econômica da lavoura. “A disponibilização do Plano Safra pelo Ministério da Agricultura pode trazer um respiro para o setor e ser usada para aumentar o plantio de áreas”, destaca. Para o Plano Safra 2015/2016, serão destinados R$ 187,7 bilhões, ante os R$ 156,1 bilhões do ciclo anterior.

PREOCUPAÇÕES


Quem produz e negocia semente também reclama. Segundo Cláudio Zago, diretor do Negócio de Sementes do Grupo Agroceres (Biomatrix e Santa Helena), com unidades de produção de milho em Patos de Minas e Ipiaçu, o alto custo de produção deve provocar redução na safra de verão e o aumento na safrinha. Segundo ele, a diminuição deve chegar aos 15% na safra de verão, alcançando uma área de 16 milhões de hectares, e um aumento de 10% na safrinha, com 9 milhões.
“O verão tem declinado a produção de milho, à medida que a soja aumenta”, disse.

Na avaliação da presidente da gaúcha Isla Sementes, Diana Werner, o segmento é fortemente afetado pela situação climática crítica. “Há outras dificuldades, como a alta nos custos de transporte, bem como de muitos insumos básicos, e a alta do dólar, que tende a acelerar a inflação”, afirma.

Em meio às dificuldades diante da crise e da alta competitividade, a multinacional Advanta Sementes ainda aposta no potencial produtivo da agricultura brasileira. Tanto que anunciou no mês passado a sua estreia no mercado nacional de soja. Claudio Torres, CEO global, confirmou investimentos de R$ 200 milhões no Brasil nos próximos anos. Pesquisa e desenvolvimento e produção são as áreas que receberão uma parte considerável desse valor.

No Brasil, a empresa tem estação de pesquisa e desenvolvimento em Uberlândia, no Triângulo Mineiro. “Do montante investido, R$ 100 milhões vão para o melhoramento genético em Minas e no Mato Grosso”, disse Edison Kopacheski, CEO da Advanta Sementes no Brasil.

Com o nome de Vereda, a linha de sementes de soja contará inicialmente com duas variedades com estreia comercial em 2016 e com volume disponível para cobrir 60 mil hectares. Antes, porém, pequenos volumes de semente serão distribuídos gratuitamente para até 600 produtores rurais. “A ideia é apresentar o produto para os agricultores. Em todo o país, isso deve representar cerca de 5 mil hectares”, revela.

A Monsanto também pretende manter os investimentos no Brasil. A previsão de aportes da empresa em seus negócios no país está em torno de US$ 150 milhões.
Parte deste valor será direcionada para a unidade de produção de sementes em Paracatu, no Noroeste mineiro. “Estes investimentos são consistentes com os últimos anos devido a visão de longo prazo da empresa”, observa Leonardo Bastos, diretor de Marketing da Monsanto..