Câncer, incontinência urinária, cáries, sapinho, inflamações e até a crise econômica. A própolis verde, antibiótico usado pela medicina popular, tem mais um título para o currículo: está imune à retração econômica do país. A alta do dólar, que ficou acima dos R$ 4 nos últimos meses, é comemorada por produtores que, em menos de um ano, passaram a ganhar cerca de 40% a mais com a venda da própolis para outros países, já que 75% do que é produzido aqui é exportado. Na outra ponta, no mercado interno, a defesa de médicos para o uso desse antibiótico na proteção contra o Aedes aegypti fez disparar em 30% a procura pelo extrato. Produtores comemoram e dizem que, para esse remédio natural, não há crises, e sim um mercado de possibilidades.
São, por ano, 100 toneladas de própolis verde produzidas no Brasil, sendo que cerca de 90% dessa extração está em Minas Gerais. De acordo com dados da Cooperativa Nacional de Apicultura (Conap), com sede em Nova Lima (Região Metropolitana de Belo Horizonte), somente em 2015, o mercado da própolis no país, impulsionado pelas exportações, cresceu 18,8%. Tanto é que, ao contrário da realidade brasileira, a cooperativa precisou aumentar seu número de funcionários para dar conta da demanda. “É um mercado em expansão, e Minas Gerais é o principal estado produtor, já que a própolis daqui tem a melhor qualidade”, afirma o presidente da Conap, Cristiano Carvalho.
São 250 apicultores associados à Conap, sendo que 95% deles são de Minas.
Quanto maior a desvalorização do real, melhor para o produtor. No ano passado, o apicultor recebia da Conap R$ 160 por quilo produzido, hoje, ganha R$ 220, um aumento de 37,5%. “Tenho apicultor que consegue 40 quilos por semana. A safra é de outubro a abril, e, no inverno, é a entressafra”, comenta Carvalho. Apicultor desde 1998, Getúlio Ferreira de Oliveira, de 51 anos, elogia o mercado. “Em 2000, comecei a trabalhar com a própolis e, hoje, ela representa 80% da minha produção. Com ela, formei meus filhos na faculdade”, destaca.
Recentemente, o apicultor, que produz 15 quilos por mês de própolis e tem oito apiários em Minas, foi à Coreia do Sul conhecer as vendas por lá. “O mercado internacional é ainda o nosso melhor comprador”, diz.
O reflexo disso está nos preços. De acordo com a Conap, um frasco de extrato de própolis, que era vendido a R$ 9, agora está, em média, a R$ 10. No inverno, quando chega o período da entressafra, é possível que haja um aumento no valor do produto nas gôndolas dos supermercados e farmácias. O custo do apicultor, segundo Getúlio de Oliveira, é baixo. “Para se ter um apiário, geralmente, combino com o dono de um terreno de lhe entregar um quilo de mel por mês. Há um gasto com transporte e mão de obra. O profissional que me ajuda na colheita, por exemplo, cobra R$ 80 por dia”, revela.
REFERÊNCIA Atualmente, há cerca de 100 municípios mineiros que já têm procedência catalogada e certificada pelo Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA). E Minas Gerais cada vez mais se torna referência mundial na qualidade de sua própolis e que já é o produto apícola com maior volume em exportações atualmente, segundo informações da Federação Mineira de Apicultura.
A colheita da própolis para o cultivo é indicada para outubro. No inverno, especialmente em regiões mais frias, não se deve coletar a própolis na colmeia, para não a deixar desprotegida, exposta às variações de temperatura. Segundo a Conap, o cultivo é bastante simples. “Pedimos para que o apicultor faça a colheita a cada oito dias, para que a própolis não escureça e, assim, não perca valor no mercado”, comenta Cristiano Carvalho. Quando o produtor faz a entrega, na cooperativa, também é providenciada uma análise de laboratório.
Para a exportação, os frascos precisam ter 30% de concentração de extrato seco de própolis, sendo que no Brasil essa concentração é de 11%. “No passado, os japoneses acreditavam que a própolis vinha do eucalipto, mas não. Ela vem do alecrim-do-campo ou vassourinha-do-campo, que é uma planta que dá em área de mineração”, comenta Carvalho, justificando aí a qualidade da produção mineira.
ALÉM DOS FRASCOS O mercado da resina elaborada pelas abelhas vai muito além do extrato. São subprodutos agregados que dão ainda mais impulso à própolis. Que o diga a Pharma Nectar, aberta há 26 anos. Segundo conta o diretor da empresa, José Alexandre Silva de Abreu, a Pharma está direcionada para a parte farmacêutica, transformando a própolis em produtos com utilidade para a saúde, como é o caso das injeções intramamárias, indicadas para tratamento de câncer. “Exportamos para 29 países e, neste momento, um dos melhores para o nosso mercado, aumentamos as vendas e abrimos novas oportunidades. A receita nossa de 2015 aumentou 75% em relação a 2014. E, neste ano, a expectativa é de um aumento de 100%”, revela.
Na loja, localizada na Savassi, na Região Centro-Sul de BH, há prateleiras com vários produtos. Cosméticos, pasta de dente, enxaguante bucal, entre outros. O diretor destaca que a empresa tem parcerias com universidades, como as federais de Ouro Preto e Minas Gerais (UFMG), além da Unicamp, em Campinas (SP). “Temos um projeto com o departamento de odontologia da UFMG, no qual desenvolvemos uma linha que trata o efeito colateral da radioterapia na cavidade bucal de pacientes que, antes, morreriam com esses sintomas. São produtos 100% eficazes”, comenta. Abreu diz que a empresa conta com 477 fornecedores de própolis em Minas. Ele também faz parcerias para o desenvolvimento dos cosméticos, com investimento em tecnologia e pesquisas. “Esse é o caminho para o produtor nesse mercado. As pesquisas são fundamentais”, ensina.
SAIBA MAIS
Origem
A própolis é um produto que está relacionado à proteção da colônia. O termo própolis traduz exatamente essa função, pois é originado das palavras gregas pro (defesa) e polis (cidade ou comunidade), que, nesse caso, é a colônia. As abelhas a utilizam como produto higienizador sobre os favos e paredes internas do ninho e para recobrir animais mortos que não conseguem remover da colmeia, evitando, assim, sua decomposição e contaminação do ninho.
Enquanto isso...
Estímulo no Norte de Minas
Mais de 250 apicultores da região Norte de Minas terão melhores condições de desenvolver suas atividades com o apoio da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). A Companhia firmou convênio com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), em Minas, para prestação de serviços assistenciais em apicultura. O objetivo é melhorar a estruturação de arranjos produtivos locais (APLs) em nove municípios do estado. O trabalho da Emater-MG será voltado ao aperfeiçoamento das técnicas de produção, organização da cadeia produtiva e apoio aos apicultores na preparação da documentação para comercialização aos governos municipal, estadual e federal. A expectativa da Codevasf é de que ao final do projeto haja aumento da produção dos apiários e maior organização da cadeia produtiva, com reflexos positivos na renda dos apicultores..