Montes Claros – As estiagens prolongadas castigam o Norte de Minas seguidamente. Diante desse quadro, os produtores rurais precisam criar meios para conviver com a seca, buscando alternativas para racionalizar o consumo de água, para manter a produção de alimentos, seja por meio da agricultura ou pela pecuária. Uma das opções encontradas é o cultivo da palma forrageira para complementar a alimentação do rebanho leiteiro no período crítico da seca, cujos efeitos também são sentidos no comércio na cidade, afetando duramente a economia regional.
Leia Mais
Secas afetaram as demarcações de lotes no BrasilLivre da seca, soja dá a volta por cimaSeca e custos 'azedam' produção de leite em Minas Pragas avançam com a seca e desafiam indústria do pequiTruta vence a seca, cresce e projeta criação mineiraHorta circular sobrevive à seca no Norte de MinasO uso da planta começou a ser disseminado no semiárido mineiro há quatro anos. Já foram distribuídas cerca de 200 mil mudas (raquetes) para pequenos produtores de 27 municípios. “Quem recebia a palma firmava o compromisso conosco de, no primeiro ano de colheita, disponibilizar pelo menos 10% das mudas para outros produtores. Assim, fomos multiplicando a cultura na região, pois ela consegue aguentar os longos períodos de estiagem que estamos passando aqui”, afirma o coordenador técnico da Emater-MG em Janaúba, André Caxito.
Em nova etapa do projeto, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), está prevista a instalação, até setembro, de sete unidades demonstrativas da palma forrageira no Vale do Jequitinhonha, nos municípios de Leme do Prado, Minas Novas, Chapada do Norte, Berilo, José Gonçalves de Minas, Jenipapo de Minas e Francisco Badaró.
“Vamos capacitar os extensionistas da Emater para repassarem o conhecimento técnico em todas as unidades demonstrativas que plantarem a palma”, anuncia a pesquisadora Polyanna Oliveira, chefe da unidade experimental da Epamig em Nova Porteirinha (Norte de Minas). Lá estão sendo pesquisadas duas variedades da palma forrageira, a chamada palma gigante e a miúda ou doce.
PRODUTIVIDADE A palma deve ser plantada 30 dias antes do início do período chuvoso e é colhida um ano após o plantio. “Depois disso, o produtor tem palma o ano inteiro, e não precisa esperar o período da seca para utilizá-la”, explica André Caxito. Muito resistente ao clima árido, com custo baixo e necessidade de pouca água, a espécie pode alcançar uma produção de até 120 toneladas por hectare. Essa quantidade é suficiente para alimentar 10 vacas leiteiras em produção durante oito meses, segundo a Emater-MG. “Muitas vezes, o produtor planta milho ou sorgo, mas a estiagem entre uma chuva e outra o faz perder a lavoura e ter prejuízos. A palma aguenta essas condições”, afirma Jair Mendes, técnico da Epamig no Campo Experimental de Acauã (Vale do Jequitinhonha).
Apesar de oferecer muita água e ser fonte de energia para o animal – podendo substituir em até 70% a energia fornecida pelo milho –, a palma tem baixo teor de fibra, proteína e matéria seca.
A cultura foi adotada como alternativa para a convivência com a seca pelo produtor Uelton Moreira Cangussu, no município de Janaúba. Ele iniciou o cultivo há cinco anos em uma área pequena (pouco mais de meio hectare), onde plantou 4 mil raquetes. “A palma é uma cultura muito resistente à seca e tem um custo baixo”, afirma Uelton, que, satisfeito com o resultado, pretende dobrar a área plantada no próximo ano.
O pequeno agricultor disse que, agora que chegou o período mais crítico da seca, vai iniciar o corte da palma para alimentar suas 18 vacas de leite. Acrescentou que sua intenção é manter o rebanho com a alimentação alternativa até dezembro. “O paladar da palma é muito bom e o gado tem bom rendimento na produção de leite”, acrescenta.
Outro produtor norte-mineiro que recorreu à palma foi Amaral de Castro Oliveira, que cria gado de corte no município de Mamonas, um dos mais castigados pela estiagem na região. “Ninguém plantava antes, mas quando a seca pegou, todo mundo começou a apostar na palma.
Sem água, mais custos
A seca reflete diretamente no aumento de custos para o pecuarista Oswaldo Miranda, que tem uma criação de animais da raça nelore em sua fazenda, Estância OMJ, no município de Montes Claros. O produtor relata que, após quatro anos seguidos de estiagens prolongadas, se viu obrigado a investir na alimentação alternativa para manter o rebanho diante da falta de pasto, destruído pelo sol forte.
“O meu custo aumentou em cerca de 25% a 30%”, lamenta Miranda, que investiu em capineira e silagem para poder alimentar os animais na maior parte do ano. Ele explica que o custo de produção é variável. “No caso de um bezerro, que come menos, é menor. Mas, para manter uma vaca adulta, a despesa praticamente dobra”, ressalta o agricultor, que usa silagem de milho e sorgo.
A fazenda dele fica localizada em uma região de terras férteis, na beira do Rio Verde Grande. Mesmo assim, a maior parte da pastagem foi devastada pela escassez de chuvas. Atualmente, ele conta com cerca de 100 bezerros que são alimentados com ração, presos no curral, como se estivessem no sistema de confinamento, embora a criação seja do sistema extensivo (pastagem).
Oswaldo Miranda destaca que “colocar o gado no cocho” foi a única maneira que ele encontrou para se manter na atividade e evitar prejuízos ainda maiores com a perda de animais.
O pequeno agricultor Gilmar Leite Caetano, de 44 anos, fez algumas inovações no plantio de hortaliças no seu sítio, na comunidade de Abóboras/Serra Velha, no município de Montes Claros. O objetivo dele: gastar menos água e conviver com a seca. “Temos que nos adaptar à severidade da crise hídrica”, afirma Gilmar.
O pequeno produtor recorre a variedades resistentes à falta de chuvas e adota técnicas para economizar água. Uma delas é o uso da chamada “cobertura morta”, matéria orgânica como capim e folhas secas nos canteiros de alface e alho. “A cobertura morta aduba a terra, cobre o solo e garante maior umidade, diminuindo o consumo de água”, explica Gilmar. Outra técnica adotada por ele é o plantio consorciado de couve, repolho, rúcula e outras hortaliças com banana. “As bananeiras fazem sombra e impedem que as plantações fiquem expostas ao sol o dia inteiro. Dessa forma, diminui a evaporação e dá para economizar água”, explica o sitiante.
Respingos no comércio
A estiagem prolongada reflete diretamente na queda das vendas no comércio das cidades do Norte de Minas. Mesmo os comerciantes que trabalham com produtos e equipamentos que ajudam o agricultor a conviver com a falta de chuvas afirmam que “não ganham dinheiro com a seca”. Proprietário de uma loja de rações, defensivos, vacinas e outros produtos agrícolas em Montes Claros, João Newton Pereira Lopes explica que não tem lucros com a seca porque o fenômeno afeta a economia regional, diminuindo a circulação de dinheiro. “No geral, ao contrário de aumentar, as vendas diminuem e ficam dispersas.
Lopes afirma que, na verdade, procura orientar os produtores rurais nas ações para o convívio e superação dos efeitos da estiagem. “Ficamos apagando incêndio, na tentativa de impedir perdas maiores. Por exemplo, se chega um criador e diz que vai vender uma vaca magra, com prejuízo, a gente orienta que ele alimente o animal para engordá-lo e ganhar algum dinheiro”, explica.
Ailton Santos Souza, também dono de uma revenda de insumos, afirma que a estiagem prolongada afeta toda cadeia produtiva. “Se não tem pasto, toda a cadeia econômica do agronegócio desmorona”, diz. Etelmiro Mendes Rocha, dono de uma empresa que trabalha com ordenhadeiras mecânicas e outros equipamentos e materiais para pecuária observa que a produção de leite na região teve uma queda de 30%, por causa da seca. “Nossas vendas diminuíram na mesma proporção”, lamenta..