Premiados em festivais internacionais e requisitados por muitos chefs de cozinha, os queijos artesanais mineiros brigam para conseguir uma regulamentação nacional. Após a polêmica ação da vigilância sanitária que barrou a venda do produto em um estande no Rock in Rio – 160 quilos de queijo foram jogados fora –, o governo de Minas apresentou um projeto de lei que dispões sobre a produção e a comercialização dos produtos no estado. Mas objetivo dos mais de 30 mil produtores do queijo artesanal mineiro (que produzem todo ano cerca de 50 mil toneladas) é conquistar normas nacionais para que o produto ganhe cada vez mais espaço no país.
Muitos queijos artesanais, com selo de inspeção estadual, não têm o selo do Serviço de Inspeção Federal (SIF), que é questionado por vários produtores pela burocracia dos órgãos federais, o que não significa que sejam impróprios para consumo. O modo de se produzir o queijo foi registrado como patrimônio cultural imaterial brasileiro pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), mas muitos produtores ainda sofrem com restrições para vender suas mercadorias.
A polêmica no Rock in Rio acabou se tornando um fato positivo para os produtores dos queijos artesanais, uma vez que mobilizou vários chefs de cozinha e mestres em gastronomia em defesa da regulamentação do produto. “Foi um fato importante para chamar a atenção do país e do Ministério da Agricultura para que dê a devida importância ao setor. Lutamos para ter um queijo dentro dos padrões e garantir sua qualidade. Mas lutamos também contra o excesso de burocracia”, explica o secretário de Estado da Agricultura de Minas Gerais, Pedro Cláudio Coutinho Leitão.
Segundo o secretário, das 259 queijarias certificadas no estado que produzem o tipo minas artesanal, apenas três conseguiram o certificado para vender em outros estados. “Será importante reconhecer também nossas pesquisas. Porque é a partir delas que avançamos na legislação. Por exemplo, só podemos reduzir o tempo de maturação do queijo se tivermos pesquisas que mostrem que isso é seguro”, ressalta Pedro Leitão.
Os produtores artesanais também se mobilizam para cobrar avanços na regulamentação e pedem mais rapidez do Ministério da Agricultura para discutir o tema. “Esperamos que o governo federal reconheça a capacidade da fiscalização nos estados. Hoje, um produto já certificado em Minas, por exemplo, não serve no estado vizinho. Algo sem lógica, que depende de uma regulamentação do Ministério da Agricultura”, explica o produtor de queijo e presidente da Comissão do Queijo Minas Artesanal, Túlio Madureira, que teve dois produtos premiados em festival na França, em junho.
Para participar dos festivais internacionais, os produtores mineiros precisam esconder os produtos tão desejados no exterior e correm o risco de ter a mercadoria confiscada antes de embarcar. “Temos que levar o queijo dentro das bolsas. Mas lá somos tratados como rei por produzir um queijo de extrema qualidade. Na França, o produto é fiscalizado, são feitas análises para comprovar que ele jé seguro e de qualidade. No Brasil, enfrentamos uma barreira econômica e política, em que se volta apenas para critérios técnicos da produção e muitas vezes nem se olha o produto”, conta Túlio Madureira.
Avanço em Minas
Na semana passada, poucos dias após a polêmica no festival de música do Rio, o governo de Minas enviou à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) um projeto de lei para normatizar os queijos artesanais. A proposta torna obrigatório o registro no Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) de todo estabelecimento produtor de queijo artesanal.
A identificação desses queijos será feita por meio de estudos do processo produtivo, da região produtora e pela tradição histórico-cultural local. Os queijos deverão obedecer padrões sanitários regulamentados e o transporte deverá ser compatível com a natureza do produto, para que as condições sejam preservadas. O texto ainda prevê inspeções da fiscalização sanitária periodicamente e penalidades para quem descumprir as normas.
O superintendente de Apoio à Agroindústria da Secretaria de Estado da Agricultura, Gilson Sales, avalia que a tentativa do governo de regulamentar a produção de queijo artesanal em Minas pode acelerar o processo de reconhecimento das marcas e de novos tipos de queijos produzidos em pequenas propriedades rurais no estado.
“Antes falávamos de queijo minas artesanal, agora falamos queijos artesanais mineiros, com vários produtos. Temos o requeijão moreno, o queijo cabacinha, o queijo da mantiqueira, o queijo cru de cabra e ovelha, entre muitos outros. Produtos muito requisitados por chefs de cozinha e que podem avançar com a nova regulamentação”, afirma Gilson.
Os queijos artesanais, feitos com leite cru nas propriedades rurais, são diferentes dos produzidos industrialmente, que usam leite pasteurizado e tem processo mecanizado. “São produtores pequenos ou médios, que produzem abaixo de 500 litros de leite. Trabalham com a própria família e passam a tradição para frente, de pai para filho. Uma das vantagens da lei é reconhecer novos produtos, mas que devem atingir as exigências estabelecidas”, diz o superintendente.
Você se lembra?
Reconhecimento internacional
Entre mais de 600 participantes do Salão Mundial do Queijo, o Mondial du Fromage de Tours, na França, 12 queijos artesanais produzidos em Minas Gerais foram premiados pela alta qualidade. Entre eles o vencedor do prêmio Super Ouro entregue a uma produtora de queijo minas de Sacramento, na região de Araxá. A terceira edição do Salão do Queijo que aconteceu em junho reuniu produtores de 32 países.