Jornal Estado de Minas

Começa a temporada do Pequi


Do cerrado para a mesa, o pequi ganha cada vez mais espaço e foi incluído nos cardápios de escolas da rede estadual de Minas. Mas a popularização do fruto, apelidado de ouro do cerrado, ainda esbarra em fatores como o alto grau de perecibilidade da polpa e entraves na capacitação técnica durante todo o processo produtivo. Além disso, o pequi ainda não dispõe de selo de classificação e obedece às normas gerais de habilitação sanitária definidas pelo Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA). O setor, porém, tem se organizado. A inclusão de mais integrantes ao Conselho Estadual Pró Pequi, que no mês passado subiu de 18 para 24 o número de representantes, reforça o interesse de a cadeia produtiva discutir e buscar soluções para problemas comuns de gestão, como a procura por novos mercados.





Ao conselho estadual é disponibilizada uma conta que abriga recursos oriundos de multas aplicadas a empresas e indivíduos supressores da árvore no cerrado, denominada Recursos Especiais a Aplicar no Pró Pequi. De acordo com a secretária-executiva do Conselho, Maria Tereza Queiroz Carvalho, da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Agrário (SEDA), para cada árvore suprimida é paga uma multa. Em fevereiro deste ano, o fundo dispunha de R$ 1,5 milhão.


Esses recursos foram destinados à utilização definida por dois editais: um sobre o fomento à agroindústria familiar, para compra de equipamentos para beneficiamento de frutos do cerrado e da caatinga (despolpadeira, centrífuga, embaladoras a vácuo, mesas industriais, câmaras de refrigeração, congeladores, entre outros) e o outro edital para financiamento na compra de matéria-prima. “Muitas vezes o produtor tem o equipamento, dispõe de pouco produto, então pode financiar a compra de outros produtores menores e familiares”, explica Tereza.

MERCADO EXTERNO Entre 2012 e 2014, o crescimento da produção de pequi em Minas cresceu 377%, de acordo com Sarah Alves de Melo Teixeira, que realiza estudos para sua tese de doutorado em ecologia, conservação e manejo da vida silvestre, na UFMG. No ano passado, duas cooperativas (Coopejap e Coopsertão Veredas) exportaram uma tonelada de polpa do fruto para o Japão. A partir de 2016, a Secretaria de Estado de Educação incluiu o fruto no cardápio da merenda nas escolas da região do cerrado, atendendo a uma resolução estadual que determina que eles devam ser elaborados respeitando referências nutricionais, hábitos alimentares e a cultura alimentar das localidades. O fruto que era vendido in natura, ganha outras formas, como polpas, óleos, conservas e doces.





A castanha, que pode ser transformada em óleo de alta qualidade, é muito nutritiva, mas tem alto grau de perecibilidade, o que exige maior tecnologia em sua torra e salgamento. Alguns estudos sobre essa noz estão em andamento na Universidade de Montes Claros (Unimontes), mas ainda sem resultados que possam ser considerados seguros, explica o pesquisador da Universidade Sérgio Avelino Mota Nobre. Já o fruto pode ser congelado, permitindo sua utilização em períodos de entressafra.

Gargalos  do campo ao ponto de venda

 

O processamento e a comercialização encontra alguns gargalos, uma vez que se trata de fruto sazonal, que floresce no mês de novembro e produz fruto até meados de fevereiro e março. Geralmente colhido por pequenos produtores familiares, é responsável pelo incremento de renda em torno de 30 mil famílias, somente no Norte de Minas, de acordo com Wdileia Mendes de Oliveira, assessora do Núcleo Gestor da Cadeia Produtiva do Pequi e Outros Frutos do Cerrado, que reúne associações e cooperativas processadoras de pequi e outros frutos, de 18 municípios.


Pesquisador de análise microbiológica e segurança alimentar da área de ciências e da saúde da Unimontes, Sérgio Avelino estuda o pequi há 15 anos. “Primeiro, me chamou a atenção o culto popular do fruto, que é muito rico, uma planta muito falada e que apresentava certa carência de provas científicas de seu valor nutritivo. Sua frequência endêmica garante a alimentação da população, principalmente campesina. Durante quatro meses por ano os sertanejos do cerrado comem o pequi consorciado com arroz (o mais conhecido), mas também com massas, carne de frango, ou no panelaço (cozido no feijão, acompanhado de porco)”.





Outro ponto que chamou a atenção do pesquisador foi o espaço que vinha ganhando no mercado, onde o fruto in natura era predominante, mas passou a ser fatiado e vendido em salmoura. Havia a preocupação sobre manipulação e seu acondicionamento de forma incorreta, que poderia causar infecções alimentares, principalmente em pessoas de menor poder aquisitivo, provocando impactos econômicos significativos aos que o fabricavam de maneira artesanal e tinham o produto como uma complementação de sua renda familiar. Avelino atentou para o fato de a coleta atrelar um negócio a uma rentabilidade coletiva, que é a preservação ambiental.


O pequi é colhido em meio ao cerrado e seu cultivo é considerado inviável devido à necessidade de o agricultor reproduzir no plantio as características do cerrado, o que encarece o processo. A falta de uma cultura exclusiva dificulta os dados sobre estimativas de produção. Uma árvore produz por volta de 200 a 300 quilos do fruto a cada temporada. A planta é muito resistente ao fogo ou à seca e suporta até 8 meses sem chuva.


Segundo os pesquisadores, o fruto tem propriedades medicinais e é fonte antioxidante e anticancerígena, além de ser rico em carotenoide, precursor de vitamina A e de vitamina C. Não há ainda estudos consolidados sobre a longevidade da árvore, mas acredita-se que a produção de frutos se dá entre sete e 10 anos e pode durar até 100 anos. Essas estatísticas são objetos de investigação ainda. A espécie mais comum em Minas é a Caryocar brasiliense, de polpa mais espessa e muitos espinhos. Mas existem outras, como o pequi branco e o sem espinhos.

 

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