Jornal Estado de Minas

Agricultor do Sul de MG aposta em morangos livres de agrotóxicos

Se o sistema orgânico de plantio ainda pode ser considerado um diferencial, novas técnicas e estruturas para o cultivo ainda podem nos surpreender, como vem sendo feito no sítio Santo Antônio, localizado na comunidade do Pessegueiro, município de Extrema, no Sul de Minas. Com experiência no cultivo de hortaliças sem a aplicação de agrotóxicos ou fertilizantes sintéticos, em 2017 o agricultor familiar Jorivaldo de Andrade decidiu também produzir morangos orgânicos. “Abracei a ideia. Se eu fosse produzir o morango convencional, seria apenas mais um no mercado. Além disso, tem a parte de bem-estar. Minha mulher valoriza produtos orgânicos. Tenho uma filha pequena que pode, tranquilamente, pegar o morango que produzo e colocar na boca”, comenta.

 



Focado na sustentabilidade, Jorivaldo optou por transformar calhas em canteiros, por serem duráveis, podendo ser usadas por vários ciclos. A estrutura fica suspensa por cavaletes de madeira e preenchidas com composto orgânico. “Além do material reciclado, as calhas suspensas favorecem o manejo. São frequentes os depoimentos de produtores de morango com dores na coluna por trabalharem muito tempo agachados para cuidar dos canteiros convencionais, que ficam no chão”, explica Hélio João de Freitas Neto, engenheiro agrônomo da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG).

 

A estrutura foi armada sob uma estufa de 175m² e tem sistema de irrigação por gotejamento, o mais adequado para a produção do morango. Doadas por uma indústria especializada em produtos reciclados, as calhas receberam furos para a drenagem da água. A cada ciclo de produção, o composto orgânico que fica nas calhas precisa ser reforçado ou substituído. O engenheiro agrônomo da Emater-MG relata que, no sítio Santo Antônio, foram testados seis diferentes tipos de composto orgânico, para saber qual melhor se adaptava à cultura.

 

Também foram feitos testes em oito variedades de morangos, sendo que a escolhida foi a PRA Estiva, que produz o ano todo. A produção na propriedade é a mesma registrada nos plantios convencionais da região, cerca de 1 quilo por pé. “Estou muito satisfeito com a produção de morangos. A produção não é grande, já que eu cuido dela sozinho. Na verdade, eu e Deus. Mas faço o que gosto”, comenta Jorivaldo, que vende o quilo do produto por R$ 25, preço acima da média do mercado. Na lista de clientes estão amigos, uma escola do município e um restaurante de Monte Verde, na Serra da Mantiqueira.



 

O Sítio Santo Antônio ainda está em fase de adaptação para ser certificado com o selo de propriedade orgânica. Mesmo assim, a propriedade recebe a visita de outros agricultores da região, interessados em conhecer o sistema de produção orgânica em calhas recicladas. Tanto que, na comunidade vizinha, já existe um produtor de morango convencional usando o material reciclado para fazer os canteiros. No último ano, o case de Jorivaldo foi o vencedor do Programa MelhorAção da Emater-MG na Unidade Regional de Pouso Alegre.

SUSTENTÁVEL Pela legislação brasileira, considera-se produto orgânico, seja ele in natura ou processado, aquele que é obtido em um sistema orgânico de produção agropecuária ou oriundo de processo extrativista sustentável e não prejudicial ao ecossistema local. Para serem comercializados, os produtos orgânicos deverão ser certificados por organismos credenciados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), sendo dispensados da certificação somente aqueles produzidos por agricultores familiares que fazem parte de organizações de controle social cadastradas, que comercializam exclusivamente em venda direta aos consumidores.

 

A Região Sul concentra a produção de morango em Minas Gerais, respondendo por 86% da safra no estado. De acordo com a Emater-MG, o estado produz 100 mil toneladas da fruta por ano e conta com aproximadamente 30 produtores orgânicos, que devem produzir em torno de 200 toneladas de morangos. Segundo o pesquisador José Ernani Schwengber, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), os dados de crescimento da produção de morango orgânico no Brasil não são precisos. Porém, ele acredita que essa cultura deva crescer em taxas muito próximas das que se encontram para os produtos orgânicos em geral, em torno de 20% ao ano.



 

Com relação aos investimentos, a implantação do método orgânico tem praticamente o mesmo custo – preparo do solo, adubação orgânica, cobertura do solo e tuneis, mudas, mão de obra – que o convencional, avalia o pesquisador da Embrapa. “As diferenças fundamentais estão na não aplicação de agrotóxicos e adubos fertilizantes via fertirrigação, que são usados no sistema convencional. Por outro lado, a necessidade de mão de obra no sistema orgânico é maior, exigindo maior atenção e cuidados por parte do produtor”, explica José Ernani.

 

Um fator que pode estimular o consumo do morango orgânico é a desconfiança geral de que esse fruto sempre se apresenta vinculado ao consumo de agrotóxicos. Dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) mostram que aproximadamente 50% dos morangos analisados têm algum problema de contaminação, porém, de acordo com José Ernani, outros produtos apresentem taxas de contaminação muito próximas a esta.