Quando o assunto é o cultivo do cacau, logo se pensa no estado da Bahia, responsável pela maior parte da produção no Brasil. Mas poucos sabem que Minas Gerais também se dedica a essa cultura, em pequena escala, é verdade, nos municípios de Almenara, Bandeira, Mato Verde e Jordânia, no Vale do Jequitinhonha, ocupando uma área de mais de 100 hectares. Porém, a produção mineira de cacau tem suas particularidades.
Não é de hoje que o cacau está presente na região. No município de Bandeira, há registros dos pés do fruto há mais de 50 anos. Mas os plantios comerciais são mais recentes, nos últimos 20 anos. O município conta até com a Associação dos Produtores de Cacau de Bandeira (Asprocab). Já em Almenara, os cacaueiros estão concentrados no Quilombo Marobá dos Teixeiras. Eles são cultivados há mais de 120 anos no sistema conhecido como cabruca, um tipo de manejo agrofloresta cujos pés de cacau estão integrados à mata nativa.
De acordo com o coordenador de fruticultura da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado Minas Gerais (Emater-MG), Deny Sanábio, 95% do cacau mineiro é produzido em matas, o que traz várias vantagens, como a preservação da mata ciliar e das nascentes, a infiltração de água no solo, o controle da biodiversidade e a manutenção da fauna e flora locais.
ADAPTAÇÃO O plantio a pleno sol, ou seja, em áreas preparadas unicamente ao cultivo do cacau, está sendo desenvolvido em caráter experimental.
Outro ponto positivo é que esta espécie de cacau nativo já está adaptada à biodiversidade, o que minimiza o risco de doenças. É um cenário diferente ao encontrado na Bahia, que cultiva predominantemente espécies híbridas, onde um melhoramento genético produziu plantas mais resistente à Vassoura de Bruxa, fungo que afetou drasticamente a produção na região durante a década de 1990. Segundo Deny, com o melhoramento genético, a doença pode até atingir a planta, mas não a mata.
O cacau é uma cultura de clima tropical, que se desenvolve bem onde tem calor e umidade, motivo pelo qual se adaptou tão bem à Região Nordeste de Minas Gerais. A colheita é prolongada, com frutos verdes, maduros e pós-flor, podendo durar até por quatro meses. Ainda assim, há registros de sua produção (em menor escala ainda) no Sul de Minas Gerais, em algumas propriedades que mesclam seringueira e cacau. Nessa região, onde existe frio acentuado durante três meses, essa cultura é arriscada, acumulando ainda o ônus de estar longe dos centros em que seu processamento é executado.
O coordenador de fruticultura da Emater-MG explica que o manejo do cacau nas matas é bem mais simples, podendo ser comparado quase a um extrativismo, sendo necessário basicamente podar e colher.
TÉCNICAS A partir dessa percepção, a Emater desenvolve desde 2015 o Programa de Produção Sustentável de Cacau e Recuperação de APPs. Em 2017, cerca de 50 produtores participaram de um evento técnico voltado para a demonstração de podas, técnicas de enxertia para produção de mudas e controle de pragas e doenças no cacaueiro. “Podemos afirmar que, por meio da nossa iniciativa, do nosso trabalho e dos resultados colhidos, muitos agricultores já estão produzindo cacau, inclusive pretendendo ampliar suas áreas de produção. Os agricultores de Bandeira e Mata Verde estão recuperando as áreas de APP com plantio de cacau, visando o ganho ambiental e econômico com a venda das amêndoas de cacau. Já foram plantadas 3 mil mudas”, avalia.
“Tínhamos aqui um grande problema de falta de água, com a necessidade de recomposição de matas ciliares.
Há três anos, foi iniciado um intercâmbio entre Minas Gerais e Bahia por meio de uma parceria com o Instituto Biofábrica de Cacau, do município baiano de Ilhéus. O objetivo é incentivar a produção de cacau nos municípios do Vale do Jequitinhonha. Assim, agricultores mineiros visitaram as áreas de cacau do instituto, o laboratório de micropropagação de mudas e até uma agroindústria artesanal de chocolate gourmet localizada em um assentamento.
CHOCOLATE GOURMET “A visita foi muito importante para que os agricultores pudessem ver de perto o método de propagação e como é importante usar mudas de qualidade”, afirma Joselaine. Para a produtora Maria Rosa Pujol, que mora no Quilombo Marobá dos Teixeiras, em Almenara, foi uma viagem fantástica. “Conhecemos outras produções, outras possibilidades. Foi muito bom ver de perto a biofábrica que eles têm”, comenta. Os técnicos do instituto também estiveram em Minas Gerais para conhecer as lavouras cacaueiras. No Quilombo Marobá dos Teixeiras, o que chamou a atenção foi a presença das variedades Pará e Parazinho, que são usadas para a produção de chocolates gourmet e com boa valorização no mercado.
A venda de cacau pelos produtores do Vale do Jequitinhonha ainda é tímida.