Em um cenário em que o café commoditie insiste em manter cotação baixa, em alguns casos não chegando a cobrir os gastos do produtor, o investimento em um produto melhor, com maior valor agregado, é uma das melhores saídas para o produtor. O conselho é de Breno Mesquita, presidente da Federação da Agricultura do Estado de Minas Gerais (Faemg), assim como das comissões estadual e nacional de cafeicultura, que afirma que a produção nacional de cafés especiais vem aumentando ao longo dos anos, tendo atingido entre 6 milhões e 10 milhões de sacas, sendo que Minas Gerais é responsável por metade desse volume.
De acordo com Mesquita, o café arábica é mais suave e tem qualidade superior, enquanto o conilon tem mais cafeína e é tido como café de segunda, sendo muito usado na indústria de solúveis. “Mas, hoje, já se produz um conilon especial no Espírito Santo, Bahia e Rondônia”, garante o presidente da Faemg.
Segundo Mesquita, para aprimorar a qualidade do produto é preciso conhecer as técnicas e o manejo correto na colheita e no pós-colheita, muitos deles oferecidos pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – Administração Regional de Minas Gerais (Senar Minas).
“Essas informações são importantes para obter cafés especiais, com qualificação acima dos 84 pontos na escala da Associação Americana de Cafés Especiais (SCAA), Enquanto a saca do café comum é vendida por R$ 400, um café superior pode chegar ao dobro. É claro que o custo é maior, porque os cuidados são maiores, mas o maior valor agregado compensa.”
“Essas informações são importantes para obter cafés especiais, com qualificação acima dos 84 pontos na escala da Associação Americana de Cafés Especiais (SCAA), Enquanto a saca do café comum é vendida por R$ 400, um café superior pode chegar ao dobro. É claro que o custo é maior, porque os cuidados são maiores, mas o maior valor agregado compensa.”
Localizada no município de Machado, na Região Sul de Minas Gerais, a Fazenda Recanto produz cafés de qualidade superior. O proprietário, Afrânio Ferreira Paiva, explica que a primeira medida a ser tomada para obter um bom café é mapear a propriedade e identificar os fatores que favorecem a qualidade do fruto.
Um deles é o clima, mais precisamente a posição geográfica do plantio, que pode ter mais ou menos insolação. No caso do café, deve haver um equilíbrio, nem muito e nem pouco sol.
Um deles é o clima, mais precisamente a posição geográfica do plantio, que pode ter mais ou menos insolação. No caso do café, deve haver um equilíbrio, nem muito e nem pouco sol.
“O clima a gente não domina. É preciso conhecer o histórico da região. Mas o aumento da temperatura vem mudando esse cenário, e, hoje, as floradas uniformes estão se reduzindo, o que aumenta a incidência de grãos em diversos estágios de maturação: o cereja (maduro, com coloração vermelha ou amarela), que é o ideal; o seco, que pode ter sido muito exposto à umidade, o que favorece a contaminação por micro-organismo, comprometendo sua qualidade; e o verde, de baixa qualidade”, explica o produtor.
ESPÉCIES
Outro fator importante é o solo, que deve ser equilibrado, sendo realizadas as correções normais, como a adubação. A escolha da variedade da planta também é determinante para obter produto de qualidade.
Na Fazenda Recanto são usadas variedades já comprovadas da espécie arábica – como bourbon amarelo, catuaí, catucaí, rubi e mundo novo –, algumas delas mais propensas a produzir cafés de qualidade. A propriedade também tem um campo experimental, onde é analisada a evolução de espécies diferentes. Uma delas é a variedade gueixa, de origem africana, mas descoberta no Panamá.
Depois da implantação da lavoura, outra metodologia é usada para comprovar a qualidade do café. Os frutos são analisados a partir de um aparelho chamado refratômetro, que usa a escala Brix para determinar o teor de açúcar no fruto. Mesquita explica que o Brix ideal é a partir de 24, numa escala que varia de zero a 30. É a partir desse teor elevado que se identificam os frutos de maior qualidade, que darão origem a lotes especiais, com maior valor agregado.
“Depois de colhida, a fruta já atingiu todo o seu potencial e não há muito o que se fazer para melhorar as características principais que se identificam em um café, como a acidez, a doçura e o corpo. Todo o cuidado no pós-colheita é feito para preservar as características do fruto”, afirma o produtor, chamando a atenção para a importância de uma secagem benfeita.
Os limites de temperatura devem ser respeitados, assim como a higiene. No processo de lavagem, em que se retira a polpa e faz-se a separação dos grãos, é preciso expor o café à água pelo menor tempo possível, já que isso é prejudicial. Depois, é feita a pré-secagem em terreiros.
Como o volume é grande, a secagem final é feita em secador mecânico. “A vida do café só se encerra quando a bebida é ingerida. Então, é preciso respeitar as normas de qualidade em todos os processos que se seguem – a armazenagem, a torrefação, a embalagem e, finalmente, a extração” ensina o produtor.
Novas técnicas mostram que existe “vida” após a colheita do café. O barista Leo Moço, tetracampeão brasileiro, desenvolveu, ao longo de quatro anos, o Sprouting Process, que resulta em grãos com mais aroma e sabor. O processo foi usado em uma fazenda no município de Carlópolis, no interior do Paraná, e resultou em aumento de mais de 10 vezes no valor da saca produzida, partindo de R$ 450 para R$ 5 mil.
O barista firmou parceria com o Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) para difundir o Sprouting Process para pequenos produtores do Paraná. Já foram treinados quase 40 técnicos, que estão aplicando o método em suas regiões. De acordo com Cíntia Mara Lopes de Souza, coordenadora do projeto Mulheres do Café do Norte Pioneiro do Paraná, o curso modificou a forma de atuação dos agricultores familiares. “Com as dicas e informações, os produtores perceberam que a qualidade do café é definida no processo de uma colheita seletiva, com grãos na maturação correta, com os diferentes processos de secagem, o que vai agregando mais valor ao produto”, avalia.
Os limites de temperatura devem ser respeitados, assim como a higiene. No processo de lavagem, em que se retira a polpa e faz-se a separação dos grãos, é preciso expor o café à água pelo menor tempo possível, já que isso é prejudicial. Depois, é feita a pré-secagem em terreiros.
Como o volume é grande, a secagem final é feita em secador mecânico. “A vida do café só se encerra quando a bebida é ingerida. Então, é preciso respeitar as normas de qualidade em todos os processos que se seguem – a armazenagem, a torrefação, a embalagem e, finalmente, a extração” ensina o produtor.
Método de processamento
Novas técnicas mostram que existe “vida” após a colheita do café. O barista Leo Moço, tetracampeão brasileiro, desenvolveu, ao longo de quatro anos, o Sprouting Process, que resulta em grãos com mais aroma e sabor. O processo foi usado em uma fazenda no município de Carlópolis, no interior do Paraná, e resultou em aumento de mais de 10 vezes no valor da saca produzida, partindo de R$ 450 para R$ 5 mil.
O café é colhido cereja (maduro), lavado e colocado em bombonas plásticas por 10 a 20 dias. Esses recipientes têm válvulas que criam um ambiente rico em CO² – formado pela própria fermentação, que, sendo mais pesado que o oxigênio, o empurra para fora –, que inibe o desenvolvimento de bactérias e fungos e faz com que as enzimas presentes na casca do café criem uma fermentação natural.
Diferentemente da fermentação por micro-organismos, naquela feita por enzimas (realizada dentro da fruta) o grão usa o açúcar quebrado como energia para aumentar sua maturação, elevando, assim, seu poder de germinação, fazendo com que os grãos mudem sua composição química, aumentando também sua complexidade. De acordo com Moço, outro benefício do Sprouting Process é a obtenção de um lote mais homogêneo, já que todos os frutos foram expostos ao mesmo ambiente.
O barista conta que o processo foi desenvolvido no Paraná, devido à dificuldade de se produzirem cafés de qualidade na região. “O normal do Paraná é chover muito durante a colheita, o que torna muito difícil um pós-colheita benfeito. Então, estudei uma forma de criar uma fermentação benéfica para o café, sem que a chuva e o frio fossem vilões”, explica. A técnica foi inspirada em um processo do vinho chamado maceração carbônica, e devidamente adaptada para o café.
Segundo Moço, devido ao clima favorável, no Brasil, o café chega a ficar 90 dias a menos no pé em relação à Colômbia, por exemplo. Devido a esse fator, o fruto amadurece mais rápido, o que pode ser positivo para desenvolver a polpa, que, no caso do café, não é utilizada. Porém, isso compromete o desenvolvimento do grão, que, com a aplicação do processo, tem seu potencial de germinação prolongado. Por esse motivo, normalmente o café brasileiro é considerado menos denso, com menor composição química interna.
O Sprouting Process é interessante para o produtor que produz mais do que tem espaço no terreiro, que não pode programar a secagem em uma semana (se as condições climáticas forem favoráveis), já que o grão sai praticamente desmucilado (sem a polpa), diminuindo o tempo de secagem. Mas isso não significa que a técnica é inviável para o grande produtor. “Na Fazenda Sequoia, estamos produzindo cerca de 700 sacas nesse processo, que é uma etapa para o produtor que quer atingir um outro mercado, o mercado de superespecial, que paga mais e é a saída para os baixos preços da commoditie”, explica Moço.
COLHEITA SELETIVA
O barista firmou parceria com o Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) para difundir o Sprouting Process para pequenos produtores do Paraná. Já foram treinados quase 40 técnicos, que estão aplicando o método em suas regiões. De acordo com Cíntia Mara Lopes de Souza, coordenadora do projeto Mulheres do Café do Norte Pioneiro do Paraná, o curso modificou a forma de atuação dos agricultores familiares. “Com as dicas e informações, os produtores perceberam que a qualidade do café é definida no processo de uma colheita seletiva, com grãos na maturação correta, com os diferentes processos de secagem, o que vai agregando mais valor ao produto”, avalia.
“Trabalho com café desde 2005 e sempre percebi que ninguém conta seus 'segredos'. Mas, hoje, o café brasileiro não é muito benvisto no cenário mundial dos superespeciais. Isso me atrapalha como barista. Quando participo de campeonatos, existe um preconceito em relação ao café do Brasil e isso afeta meu julgamento final. Assim, minha ideia é multiplicar esse processo para ajudar o Brasil a atingir outro patamar, vendendo para as principais torrefações do mundo, tornando esse preconceito nulo”, afirma Moço.
O barista conta que não esperava por uma procura tão grande este ano, de produtores interessados na técnica. O processo vem sendo desenvolvido em várias partes do país. “Tenho trabalhos em inúmeras regiões e já vendi para o exterior um contêiner desse café, mesmo sem ter produzido. Em Rondônia, estamos fazendo o processo com a espécie conilon também. Meu sonho é que seja a nova commoditie de valorização. Os produtores estão recebendo pelo menos o dobro do valor de hoje. Em outro extremo, no ano passado, pagamos R$ 3 mil pela saca de um produtor que entregou um produto maravilhoso, que vendemos por R$ 212 o quilo”, contabiliza Moço.