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Estado de Minas MOTOR PARA A VIDA

Manter-se com esperança é o primeiro passo para conseguir superar as adversidades

Estar confiante mesmo diante de problemas e situações difíceis traz a crença por dias melhores


postado em 09/12/2019 13:25 / atualizado em 07/01/2020 17:54

Gabriel Lucas, de 15 anos, teve a perna esquerda amputada depois de ser atingido, em julho, or uma linha chilena, quando voltava de um treino de futebol(foto: Túlio santos/EM/D.A Press )
Gabriel Lucas, de 15 anos, teve a perna esquerda amputada depois de ser atingido, em julho, or uma linha chilena, quando voltava de um treino de futebol (foto: Túlio santos/EM/D.A Press )
Inspiradora, doce, singela e especial. Repleta de significados, a palavra esperança está embutida em diferentes realidades. A fé corajosa no futuro, a cura de uma doença, a realização de um sonho, a espera pela vitória, questões financeiras, a expectativa sobre dias melhores. Com o novo ano que se aproxima, é hora de renovação e mudança de ciclos. Nesse ponto, se manter confiante pode ser o primeiro passo para transformações importantes.

A história de um grave acidente vivenciado pelo garoto Gabriel Lucas Alves Nascimento, de 15 anos, em Belo Horizonte, tem um final feliz, e continua em um curso positivo de melhora. Em 20 de julho deste ano, ele passou por uma experiência traumática que ganhou visibilidade nacional, ao ser atingido por uma linha chilena. Na perna esquerda, o ferimento foi tão sério que decepou vasos sanguíneos, veias, artéria, o nervo ciático, músculos e tendões, chegando até os ossos. Gabriel chegou ao hospital em estado de choque, havia perdido 65% do sangue do corpo e tinha 3% de chance de sobreviver.

A primeira cirurgia teve o objetivo imediato de restabelecer sua vida, quando os médicos conseguiram reconstituir algumas veias. Mas a perna acabou perdendo a funcionalidade e, com a eminência de uma infecção generalizada, os médicos deram duas opções para os pais: a amputação ou entubar Gabriel, porém, no segundo caso, havia também risco de sequelas ou de que ele nem mesmo voltasse à vida. "O Gabriel teve risco sério de morrer. Entretanto, sempre tivemos esperança em sua melhora. Temos uma base cristã, uma fé firme em Deus, cremos que Ele está no controle. Não questionamos o porquê. Temos esperança no Senhor, sentimento que se concretizou com a recuperação do Gabriel. Fica agora a gratidão por ele não ter perdido a vida", relata a mãe, Regina Alves Rosa Nascimento.

VIVO 

Gabriel conta que, em um primeiro momento, teve medo, mágoa, angústia, tristeza em perder a perna. Depois do procedimento inevitável, começou a conhecer outras pessoas amputadas, fez amigos, trocou experiências e, com todo apoio e orações, foi, aos poucos, se tranquilizando. "Sempre tive a esperança em continuar vivo." Em agosto, Gabriel recebeu a doação de uma prótese e, com o tempo, voltou à rotina. Hoje, divide o tempo entre a escola e as sessões de fisioterapia para ajudar na adaptação com a prótese. "Agora, sonho ser jogador de futebol de amputados. Já comecei a dar os primeiros chutes. Acho que a lição que fica é: acredite!"

A fé corajosa no futuro
Sentimento profundo e sereno que faz avançar diante de atribulações, a esperança é como uma mola propulsora para motivar a persistência em busca de dias melhores

"Tem momentos na vida que até pelas coisas ruins agradecemos" - Kelly Cristina (foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press)
Kelly Cristina Costa, de 44 anos, tem uma história de superação. Enfrentou dois aneurismas, um derrame, um período em coma, afundamento do olho esquerdo (o que afetou a visão) e perda de uma parte da cabeça, problemas de memória, convulsões, além de quadros de depressão, complexo de inferioridade e pensamentos sobre morrer. Teve chateações também por causa do divórcio. Uma coisa foi se sucedendo à outra e ela passou por seis cirurgias.

"Sempre fui ansiosa, agitada, queria abraçar o mundo. Mas às vezes a gente enfrenta muita coisa ao mesmo tempo. Comecei a tomar antidepressivos, a ficar pouco sociável, muito triste, sem ânimo, sem vaidade, sem autoestima", lembra. "Tem momentos na vida que até pelas coisas ruins agradecemos. De alguma forma você melhora, cresce e aprende. Estava presa em um buraco bem fundo, precisava me levantar. Mas nunca perdi a fé e a esperança", acrescenta.

Por sugestão de uma amiga, procurou a dança do ventre, que pratica desde agosto, e diz que é um sonho realizado - foi voltando a ser o que era. "Sempre fui brincalhona. A dança me dá força, é no dia da aula que dou gargalhadas. E com minhas colegas de dança, uma ajuda a outra. É uma bênção. Fiz novas amizades, recuperei a vontade de me cuidar de novo, levanta o astral. Voltei a me amar."

Consolação Pereira diz que ainda vai conseguir comprar um carro para transportar as frutas e legumes que recolhe com a ajuda de seu cavalo (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press)
Consolação Pereira diz que ainda vai conseguir comprar um carro para transportar as frutas e legumes que recolhe com a ajuda de seu cavalo (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press)

Consolação Barbosa Pereira, de 54 anos, não esconde que só sabe escrever seu nome. Praticamente não frequentou a escola e, além da dificuldade com a escrita, também não sabe ler. Mãe de cinco filhos e avó de quatro netos, quando mais nova trabalhou como faxineira, até que adoeceu. Teve trombose, diabetes, pressão alta, problemas do coração e acabou sendo afastada do emprego. Hoje mora sozinha, os filhos são todos casados. Há 15 anos, ela se dedica à criação de animais. Todos os dias sai de casa em sua carroça e vai a um sacolão pegar as sobras de verduras, legumes e frutas para manter porcos, galinhas, patos, carneiros, cachorros e os cavalos que puxam a carroça. A intenção é vender os bichos, e no fim de ano a saída é melhor. Ela fala sobre a dificuldade financeira e, na época dos filhos pequenos, até mesmo para dar-lhes de comer. "Mas eu nunca perdi a esperança. Sempre lutei e hoje espero viver tranquila. Tenho uma aposentadoria que também ajuda. Dá para ir levando. Agora meu desejo é construir um muro em minha casa e ter um carro para transportar os produtos, já que eu e os cavalos ficamos cansados de levar a carroça", sonha.

SOLIDARIEDADE

Mãe de um dos mortos na tragédia em Brumadinho, Andresa Rodrigues revela que, apesar de todo sofrimento, tristeza e dor, ela e os outros familiares e amigos das vítimas ainda creem em dias melhores(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
Mãe de um dos mortos na tragédia em Brumadinho, Andresa Rodrigues revela que, apesar de todo sofrimento, tristeza e dor, ela e os outros familiares e amigos das vítimas ainda creem em dias melhores (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
A professora Andresa Rodrigues, de 42 anos, diz que dorme e acorda todos os dias em 25 de janeiro. Seu filho único, Bruno Rocha Rodrigues, de 26 anos, é uma das vítimas da tragédia da Vale em Brumadinho, no início de 2019. "Não consigo me desprender da lama", conta Andresa. O rapaz, recém-formado em engenharia, trabalhava na área administrativa da empresa como técnico em processamento, contratado à época havia 10 meses, depois de um período de dois anos de estágio. Seu corpo foi localizado no 105º dia de buscas. "Sonhava em encontrá-lo com vida. Ainda vou encontrar, em outro plano. Ainda temos 14 joias desaparecidas", diz.

Andresa revela que, apesar de todo sofrimento, tristeza e dor, ela e os outros familiares e amigos das vítimas ainda creem em dias melhores, ainda que a vida nunca mais volte ao normal. "Esperamos ver a justiça feita, os responsáveis pela tragédia presos. Se temos um aceno de luz e paz, primeiro é a condenação dos culpados, e depois ver realizado um memorial em homenagem às vítimas. Por hora, nossa principal bandeira é encontrar quem ainda não achamos", pontua, dizendo que as famílias não desistem, acompanham as ações de busca todos os dias, em uma corrente de esperança e solidariedade.

Força para passar por tudo com tranquilidade

Com a filha, Ester, de 6 anos, e o marido, Danilo, Elaine Vieira quase não sobreviveu à gravidez e ao parto, e hoje comemora a vida feliz em família (foto: Arquivo Pessoal)
Com a filha, Ester, de 6 anos, e o marido, Danilo, Elaine Vieira quase não sobreviveu à gravidez e ao parto, e hoje comemora a vida feliz em família (foto: Arquivo Pessoal)
Quando ficou grávida pela primeira vez de Ester, aos 24 anos, a atendente Elaine Nunes Vieira encontrou o verdadeiro sentido da felicidade. Mas havia muito por vir. Quando entrou no quinto mês de gestação, começou a ter uma indisposição que foi se agravando rapidamente, com a subida da pressão arterial. Em um primeiro momento, ao recorrer aos médicos, eles não observaram nada de anormal, no entanto esse foi um grande equívoco. Voltou ao hospital em menos de 24 horas da consulta inicial, e finalmente os profissionais de saúde tiveram consciência do risco que corria.

Elaine apresentou um quadro de pré-eclâmpsia, chegou ao centro de saúde com a gengiva sangrando, sangue sem coagulação e o rim praticamente parado, sem conseguir urinar. Foi encaminhada às pressas para a cesariana, quando a gravidez ainda não havia chegado ao sexto mês. Era alto o risco de morte tanto para ela quanto para a menina, e os médicos até pediram ao seu marido, Danilo, escolher entre uma das duas para sobreviver. "Nessa hora, ele disse que não iria escolher, que tinha certeza que as duas sairiam ilesas. Ele se viu sozinho, a família mora no interior. Teve que buscar a esperança onde não tinha, todos no hospital não acreditavam na nossa recuperação, mas ele resolveu acreditar", conta Elaine.

No instante do parto, mais um problema. Elaine teve a síndrome de hellp, uma das complicações obstétricas mais temidas e perigosas, que coloca em xeque tanto a vida da mãe quanto a do bebê. Era uma situação de sangramento constante. A garota nasceu, pesando menos de um quilo, e as duas foram direto para o CTI. Elaine chegou a ser desenganada. "Tive que procurar força, precisava sair dali. Minha filha era tão pequena, pensava quem ia ficar com ela, o fato de ter nascido me deu força para melhorar", recorda-se.

ORAÇÕES

Os familiares ficaram desesperados com a situação de Elaine, e os médicos davam sua morte como certa. Foi aí que um de seus tios, pastor, compareceu ao hospital e intercedeu por ela, com uma unção e orações. Qual seria a surpresa quando, em um próximo momento, o sangramento estancou. Para a melhora completa, foi rápido. "Tive muita força para passar por tudo isso, e uma oportunidade de uma vida melhor, com a esperança de ter uma família, e esse é um sonho realizado. Sempre quis me casar e ser mãe de uma menina", conta Elaine.

Hoje, aos 30 anos, ela diz que, quando viu tudo desmoronando, pensou em desistir. "Não sei explicar. É um força maior que mim mesma, e até agora eu me emociono. Parece que escutava uma voz forte e doce dizendo que ia conseguir. Sou casada com o homem que eu desejava e agradeço a filha que Deus me deu. Ainda tem muita coisa pela frente". A pequena Ester, aos 6 anos, é uma criança feliz, inteligente e saudável, tem uma vida normal e divide o tempo entre a escola e o balé. "A dificuldade sempre existe, depende de como você encara. Encontrei forças de onde não tinha, estava aqui dentro, mas eu não sabia. Todo mundo tem essa força", diz. 

PALAVRA DE ESPECIALISTA

Flavio Valvassoura - Pastor, escritor e conferencista internacional, autor do livro O Deus da esperança: Motivação e alegria em meio às dificuldades da vida, lançamento da Editora Mundo Cristão

ÂNCORA DA ALMA


(foto: Arquivo Pessoal)
(foto: Arquivo Pessoal)
"Ninguém sobrevive sem esperança. A esperança não é a última que morre, é a primeira que nasce.  É a força propulsora que nos ajuda a olhar para o amanhã na expectativa de que algo extraordinário está prestes a acontecer, nos ensina a nunca desistir. A fé precisa ser acompanhada da esperança. Juntas, mantêm a perspectiva de dias melhores. A esperança é a âncora da alma. Faz nosso coração seguro mesmo diante de um cenário de desesperança. Sem esse sentimento estamos fadados a desistir. A esperança é o combustível que move a vida. Escuto histórias de pessoas que se recusaram a acreditar no decreto do fracasso. São aqueles que, mesmo quando o mundo e as pessoas ao redor tentam convencê-los a desistir, a esperança sussurra em seus ouvidos: tente mais uma vez. A esperança faz olhar para frente, sempre conduzirá a um futuro de possibilidades. Quando permitimos ser guiados pela esperança, ela nos apontará o destino ideal que tanto perseguimos. A Bíblia afirma que a esperança é como boas novas vindas de uma terra distante. É uma feliz antecipação de que algo bom vai acontecer, é esperar por algo bom. Sendo assim, mente, corpo e espírito são renovados. A esperança é o antídoto para o desespero. Quando somos movidos pela esperança ficamos mais encorajados a caminhar em direção ao amanhã."

Nova chance de vida
Família nunca duvidou da recuperação do filho mais velho, que passou por vários episódios de doenças gravíssimas e, hoje, comemora a saúde e a força do rebento


O casal Moara e Alan do Monte, com os filhos Nicolas e Maria Alice, e suas cachorrinhas Nina e Lulu, conta que o menino se recuperou depois de um transplante de medula(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
O casal Moara e Alan do Monte, com os filhos Nicolas e Maria Alice, e suas cachorrinhas Nina e Lulu, conta que o menino se recuperou depois de um transplante de medula (foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)

O comerciante Alan Batista do Monte, 32 anos, e a empresária Moara Matins da Silva, de 31, têm uma experiência de luta e superação em relação ao filho mais velho, Nicolas Martins do Monte, de 8 anos. O garoto sempre foi uma criança saudável, com uma vida normal de brincadeiras e diversão, até que, em 2014, começou a ficar cansado e com manchas pelo corpo. Á época, estava com 3 anos. Por sugestão de uma funcionária da escola onde estudava, foi levado ao médico. Após passar por exames, o difícil diagnóstico da aplasia medular, rara doença hematológica caracterizada pela produção insuficiente de células sanguíneas na medula óssea que afeta os três grupos de elementos sanguíneos, glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas. Diante da impossibilidade de cura, a expectativa de vida do garoto não passava de 12 meses. O transplante de medula era urgente, e daí começou a batalha dos pais e da família. "Fomos ao chão", conta Alan.

Seis meses após o diagnóstico, em abril de 2015, o pequeno Nicolas chegou a um quadro gravíssimo de saúde, não mais respondia ao tratamento. Uma das médicas que atenderam o menino durante todo esse período, disse a Alan que ele teria que fazer o transplante em São Paulo. "Disse para ela: sou um cara de sorte, vamos fazer aqui, vai dar certo", lembra Alan. Logo, ele começou a percorrer hospitais em Belo Horizonte em busca de algum médico que pudesse ajudar e dar continuidade aos procedimentos. Os médicos e a equipe do hospital onde Nicolas estava, nesse ponto, já estavam sem esperança. "Mas eu tinha certeza que meu filho ia se curar", recorda Alan. O transplante acabou acontecendo - a medula foi conseguida no Paraná.

VALEU A PENA

Após a cirurgia, porém, Nicolas passou por diversas intercorrências. Desenvolveu o vírus Epstein-Barr, um vírus da família da herpes, que pode estar associado a determinadas formas de câncer, depois meningite, com a necessidade de internação no CTI em várias ocasiões. "É uma doença avassaladora, destrói tudo, mas meu filho é um guerreiro, nunca desistiu. Quem sofria mais éramos nós, os adultos, com muito medo e preocupação. Falávamos para ele que ia ficar tudo bem, e ele acreditava. Até que Deus fez um milagre em sua vida e ele saiu do hospital, depois de mais de um ano. Ouvia a voz de Deus me falando que ele ia melhorar. E ele foi só se fortalecendo aos poucos. Na minha opinião, é um tratamento espiritual, tudo vem 99% pela fé. Todos os dias quando acordo e olho para ele, vejo que tudo valeu a pena", comemora Alan.

Assim que fez o transplante, Nicolas pediu aos pais uma irmã, e a mãe tomou conta dele grávida quando estava internado no Hospital das Clínicas, durante o tratamento do Epstein-Barr e a meningite. Hoje, com a pequena Maria Alice, de 3 anos, a relação é de puro amor. "Ela é parte importante do processo de melhora do Nicolas. Também não posso deixar de agradecer o corpo médico e os profissionais da enfermagem do hospital, com o trabalho da doutora Ana Karine Vieira", diz Alan, referindo-se à hematologista pediátrica vice-coordenadora do serviço de transplante de medula do Hospital das Clínicas da UFMG, em BH, que cuidou do caso do garoto.

Alegria levada de leito a leito


"Quando fazemos o trabalho com o palhaço nos hospitais, é como se acendesse o lado saudável da criança, o desejo de brincar, de imaginar, e isso é muito positivo" - Tereza Tavares, atriz e integrante da trupe Doutores da Alegria (foto: Arquivo Pessoal)
Associação que transita pelos campos da saúde, da cultura e da assistência social, o Doutores da Alegria, criado em 1991, introduz a arte do palhaço no universo da saúde, com intervenções voltadas a crianças, adolescentes e outros públicos em situação de vulnerabilidade e risco social em hospitais públicos. Com o Programa de Palhaços em Hospitais, coração da organização, são mais de 1,7 milhões de intervenções junto a crianças hospitalizadas, seus acompanhantes e profissionais de saúde. Os palhaços subvertem a rotina hospitalar e propõem novos sentidos para a experiência de internação, com diversas iniciativas que incluem teatro, música, dança, circo e poesia. A ideia é promover a saúde através da arte.

A atriz Tereza Tavares integra a trupe dos Doutores da Alegria desde 2008, primeiro em Belo Horizonte e agora em São Paulo, e dá vida à palhaça Guadalupe. Com a já consolidada trajetória na organização, convive diariamente com histórias de fé, esperança e superação. Ela lida com crianças e jovens com vários tipos de problema, como vítimas de quedas e outros acidentes, pacientes com câncer, neuropatias, doenças respiratórias, entre outros. "Percorremos leito a leito, falando com os pacientes. Brincamos de ser médicos, os besteirologistas. A interação se baseia nisso", diz.

Por experiência própria, Tereza observa que as crianças que vivenciam uma doença ou algum outro tipo de sofrimento, não têm tanto assim o sentimento fatalista, de medo da morte, algo que fica mais evidente entre os adolescentes. "A criança, geralmente, não costuma ficar deprimida por causa da doença, sofre mais pelos sintomas que ela provoca. Não tem muito essa noção de tempo que a doença pode durar ou provocar sua morte. Diria que a criança não perde a esperança. Ela fica mais em seu universo, lúdico, e a esperança é inerente", pondera.  "Quando fazemos o trabalho com o palhaço nos hospitais, é como se acendesse o lado saudável da criança, o desejo de brincar, de imaginar, e isso é muito positivo. Uma forma dela viver outra realidade, diferente da doença", continua.

A atriz conta que esse sentimento otimista faz mais diferença no contexto da adolescência. Diante de problemas relacionados à saúde, os jovens podem enfrentar dificuldades como a perda do convívio social, além de uma questão sensível nessa idade, a mudança na aparência, como a queda dos cabelos em casos de câncer, por exemplo.

INTERAÇÃO

"Percebo nitidamente que o adolescente que é para cima, que não perde a fé no tratamento, a esperança, consegue enfrentar esses momentos com mais autoestima, menos depressão. A esperança traz alegria, positividade, o paciente fica bem disposto, bem humorado. Em termos práticos, faz sair da cama, andar um pouco, acordar, conversar, interagir com as pessoas. O contrário do que acontece quando perde a esperança. Fica acamado, deprimido, não quer conversar, não quer fazer atividades. A ausência da esperança e a depressão contribuem para que os fatores da doença cheguem mais fortes. Estar bem não é certeza de cura, mas ajuda muito no tratamento", ressalta Tereza.

Ela cita uma jovem que perdeu uma perna e está sempre com um sorriso no rosto. "É linda. Cuida da beleza, sempre maquiada, apesar das circunstâncias", diz. Tereza conta ainda que constata muito a questão da esperança em familiares dos pacientes, como pais, avós e outros acompanhantes. O fato de acreditar deixa as pessoas firmes e fortes nos momentos mais complicados.

"Conheço uma mãe de uma menina que está bem deprimida, mas continua com a energia positiva, mantendo a firmeza, acreditando, rindo, se divertindo, e isso dá um brilho para a filha. É como se essa mãe fosse um farol, uma luz que se mantém viva, pulsante, com esperança, o que com certeza ilumina a menina, traz alegria e lhe dá um norte", pontua. "Se essa mãe perde força, perde esperança, apaga sua luz, só agrava o quadro de depressão e os sintomas da doença ficam piores, mais difíceis de enfrentar. A esperança tem um papel fundamental pra ajudar tanto os pacientes como a família", acrescenta.

Seja por problemas de saúde, consequências de acidentes, ou qualquer problema grave, para Tereza a fé faz olhar para aquela circunstância e entender que aquilo é passageiro. "Mas não é fácil ter esperança, é algo difícil de conquistar. É mais fácil ser tragado pela dor.  Diante do sofrimento, da tristeza, essas pessoas são verdadeiras guerreiras, exemplos a serem seguidos".

Em Belo Horizonte, o antigo Doutores da Alegria se transformou, em 2012, no Instituto HAHAHA, referência mineira de trabalho de palhaçaria profissional em hospitais. Foram os palhaços Dr. Mulambo e Dr. Rabisco que acompanharam a situação da ex-gari Marisete Barbosa Pereira, de 55 anos, que em 2016 teve diagnóstico de câncer de mama, com diversos linfomas, um deles maligno. Ela recebeu tratamento no Hospital da Baleia, passou por quimioterapia e radioterapia, entre outros procedimentos, teve momentos de recaída e diz que nunca perdeu a fé. "Pedia a Deus para me dar força e sabedoria para lidar com a doença. Sou uma mulher guerreira e, quando entro em uma guerra, é para ganhar. A fé remove montanhas. Sempre mantive a esperança da cura", conta. Marisete diz que o carinho da equipe médica do hospital foi outro incentivo para não desistir. "Primeiro é segurar nas mãos de Deus. Essa fé e a esperança são muito importantes para quem está atravessando o câncer. Nunca se deixe abater", aconselha.

CONFIANÇA

Sobre a etimologia do termo, encontra-se a origem latina da palavra esperança: spes. Significa um tipo de “sentimento de quem espera ou confia que algo positivo sucederá”. É o que explica a doutora em psicologia Maria Clara Jost. "Iniciando por este ponto já podemos vislumbrar a importância, para nós seres humanos, deste sentimento. Refere-se ao futuro, ou seja, a algo que, ainda que sem o selo da certeza, podemos intuir como alguma coisa que será bom. E o fato de percebermos o futuro como positivo, nos ajuda tanto a encontrar um sentido para o presente quanto a iluminar o passado com a marca do significado", elucida.

O indivíduo se pergunta a cada momento sobre o sentido das coisas que o circundam e que pertencem ao seu mundo, entretanto, continua Maria Clara, questiona também sobre o sentido das relações e de si mesmo e sobre o sentido da própria vida e dos acontecimentos que a compõem. "Mas não existem garantias, não podemos ter certeza que encontraremos a resposta tão buscada. A despeito da dúvida inerente a pergunta, todavia, nós precisamos continuar a acreditar na possibilidade de encontrar uma resposta positiva: esse é o sentimento da esperança", afirma.

Maria Clara Jost esclarece que a esperança é um sentimento distinto de outros fenômenos humanos, como a ilusão, a fantasia, ou a imaginação. Essas últimas, de maneira geral, são elaborações mentais ou construções cognitivas. "A esperança, por outro lado, é um sentimento que se vincula à intuição e refere-se a um estado de espera positiva que engloba todo o ser: corpo, psiquismo e espírito. É um sentimento que, muitas vezes, pode ser entendido como louco ou insano, pois pode se relacionar a um acreditar que se contrapõe a todas as estatísticas", ressalta.

A profissional lembra a experiência da atuação, como psicóloga clínica e depois como pesquisadora, com adolescentes e jovens que haviam cometido atos infracionais. Teve a oportunidade de entrevistar adolescentes que estavam institucionalizados, cumprindo medidas socioeducativas, e também trabalhou clinicamente com jovens que conseguiram reconfigurar suas vidas após terem vivenciado o contexto do crime. "Nos primeiros entrevistados encontrei muita raiva, ressentimento e desesperança. Pareciam ter perdido toda a possibilidade de acreditar em alguma coisa, principalmente em si mesmos. Os segundos entrevistados, aqueles jovens que viveram o crime, que sobreviveram a ele, contaram-me que essa possibilidade surgiu porque, apesar de tudo, não perderam a esperança de fazer de si mesmo alguém melhor. E por que não desacreditaram? Porque encontraram pessoas no seu caminho que eram movidas pela esperança sobre a possibilidade de transformação e de reconstrução desses jovens e de suas vidas", cita.

A psicóloga reforça que a esperança se aproxima do sentimento de confiança, o primeiro sentimento estabelecido pela criança, derivado das primeiras experiências afetivas importantes que, de acordo com a psicóloga R. Jost de Moraes, vão se configurando desde o início da vida, constituindo-se em pedra angular para a formação de uma personalidade equilibrada e sadia. "Esse sentimento de confiança, segundo também coloca o psicólogo americano E.Erikson, converte-se no sentimento e na capacidade de ter esperança em si próprio e nos outros, próximos e não tão próximos. Transforma-se também na esperança da construção de relações humanas mais saudáveis que possam promover a emergência de um mundo interno e externo mais equilibrado e humanizado", diz.

Personagem da notícia - Esperança de Lacerda Peixoto, de 36 anos

Nome lindo e atual


(foto: Arquivo Pessoal)
(foto: Arquivo Pessoal)
Esperança nasceu no Rio de Janeiro e veio morar em Belo Horizonte aos 12 anos. Formou-se em ciências biológicas, tem mestrado na área ambiental, e foi para Portugal há quatro anos e meio, para fazer doutorado no ramo de formação de professores, para trabalhar com cidadania global e educação para a paz. Sobre a razão do seu nome, ela explica: “Nasci em 1983, já no finalzinho da ditadura militar. Meus pais se casaram em 1976 e tentaram ter filhos por muito tempo, até a minha chegada. Quando nasci, significava não só aquela esperança que eles tinham de construir uma família juntos. Por ser o fim do regime militar, e os dois eram militantes, também era uma maneira de expressar o desejo por um Brasil melhor e mais justo. Vem daí meu nome”. Nada mais atual diante desse período tão conturbado também na política brasileira. Ela conta que, na infância, sofria com algumas brincadeiras de mau gosto por causa do nome, e não sabia lidar bem com isso. “Mas, hoje, me identifico muito com meu nome, amo meu nome, acho lindo, e sou eu mesma quem faz graça com isso, quebro logo o gelo com as pessoas. Considero esse um sentimento maravilhoso, de superação, aquela luz no fim do túnel. É você acreditar, ter fé, independentemente da religião, de que algo de bom vai acontecer e o jogo vai virar."

DEPOIMENTO - Maria Clara Jost, doutora em psicologia

Maria Clara Jost, doutora em psicologia(foto: Rafaela Vitorio/Divulgação )
Maria Clara Jost, doutora em psicologia (foto: Rafaela Vitorio/Divulgação )
"No trabalho com adolescentes e jovens que haviam cometido infrações, alguns deles me fizeram saber da existência de uma árvore típica de terrenos pantanosos da faixa litorânea do Brasil: a tabebuia. É uma árvore que, apesar de nascer em brejos e mangues, locais cheios de lama, chega a alcançar 12 metros de altura e produz belas flores brancas durante boa parte do ano. Essa árvore era muitas vezes usada pelos jovens como símbolo da esperança e ilustra seu processo de transformação em pessoas melhores, mesmo nas situações mais improváveis. Comparavam-se às flores brancas dessa árvore que nasce no meio da lama e afirmavam que essa mudança somente foi possível porque eles não deixaram de ter esperança, contra todas as probabilidades. Quem cultiva, portanto, a “árvore da esperança”, desenvolve a capacidade de buscar soluções ou de criar possibilidades ainda nem imaginadas, porque olha longe e olha do alto. Porque visualiza o todo e percebe o conjunto, buscando recursos inovadores, não se deixando vitimizar pelas circunstâncias. Quem se posiciona com esperança diante dos eventos, mesmo aqueles mais traumáticos, descobre outros sentidos ao vivido e ao futuro, sente-se cheio de motivação e de energia, inclusive físicas. Quem se posiciona com esperança amplia a percepção de si mesmo e das próprias capacidades, mas também dilata a maneira de perceber os outros e as suas possibilidades, transmitindo confiança e promovendo a esperança por onde passa. É um movimento, por si só, retroalimentador: quanto mais se transmite esperança, mais esperança se sente e, ao mesmo tempo, sente-se mais autoestima, mais motivação e mais alegria de viver."

Geraldo Granja, terapeuta holístico(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press )
Geraldo Granja, terapeuta holístico (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press )
Entrevista: Geraldo Granja, terapeuta holístico

1) Por que é importante ter esperança?


Na sociedade contemporânea, o ceticismo e o relativismo têm roubado da alma humana uma perspectiva transcendente que aponta para o homem um sentido maior para a sua existência. As relações familiares e sociais estão afetadas pelo individualismo. Fomos levados a crer que seríamos libertados pela ciência e a tecnologia. Mas nada disso aliviou a angústia humana. Vivemos um contexto em que recebemos as notícias do mundo todo em tempo real. Esse bombardeio pode levar-nos ao desespero, se não mantermos uma conexão existencial com a vida cotidiana e as relações imediatas. Manter a esperança, mais que uma disposição de humor, torna-se um exercício diário, um cultivo na alma.

2) O que esse sentimento nos ensina?


Se você já tiver passado por alguma dificuldade dramática e, olhando para trás, pode contar a sua história, mesmo com dor, é sinal que a esperança prevaleceu e se fortaleceu. A importância de ter esperança está no fato de que ela nos faz dar mais um passo, correr o risco necessário, enfrentar a sensação de angústia e superar.

3) Em que medida a esperança é um sentimento encorajador?


A coragem é uma virtude que surge do coração, de nossas convicções, de nossa fé. Sem uma perspectiva esperançosa, o coração  torna-se abafado pelas trevas do pessimismo, do desalento, da resignação. O coração precisa ser nutrido pela esperança.

4) Em que ponto a esperança nos dá inspiração e novas ideias para enfrentar os problemas da vida? Se é que podemos chamar assim, que portas elas nos abre?

Como a esperança brota de um nível superior de consciência (superior no sentido de acima das condições naturais e históricas), nessa consciência estão outras virtudes. A inteligência e a criatividade representam a capacidade de achar uma solução nunca antes tentada. Elas me parecem ser duas filhas da esperança.

5) Como a esperança faz bem para a mente, o corpo e o espírito? E até para a promoção da saúde e qualidade de vida?

A  esperança é uma virtude que brota da alma humana.  Quanto mais nossa mente estiver límpida, livre de crenças limitantes e, ao mesmo tempo, presente na realidade da vida, abraçando as circunstâncias imediatas da existência como possibilidades a serem transformadas para nosso amadurecimento, mais saudáveis serão a mente, o corpo, e o espírito livre.

6) Em sua experiência profissional, que tipo de história você mais encontra entre as pessoas esperançosas?


Quem conta suas histórias de lutas, derrotas e vitórias são aqueles que nunca perderam a esperança. São muitas as situações de perdas afetivas e emocionais, separações, violências. Eu sinto que a pessoa necessita de apoio urgente quando não mais tem esperança, quando o horizonte já não traz nenhuma perspectiva.

7) Por fim, como o tratamento com os florais ajuda nesse sentido?


Os florais atuam despertando nas pessoas virtudes necessárias para a transformação dos estados mentais negativos. O dr. Bach, ao criar os florais, estabeleceu um conjunto de essências que ele chamou para o desalento e a desesperança. Ele identificou emoções como a culpa, o ressentimento e a amargura, o medo do fracasso, e como elas destroem na alma a esperança, roubando a vontade de transformação pessoal. A terapia floral busca limpar esses sentimentos acumulados para dar lugar a uma força que vem de uma personalidade em sintonia com os propósitos da alma.


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