De acordo com um estudo realizado pela Avaaz, cerca de 110 milhões de pessoas acreditam em pelo menos uma notícia falsa sobre a pandemia, no Brasil. Esse número corresponde a sete em cada 10 brasileiros.
A pesquisa aponta, ainda, que são as redes sociais as maiores responsáveis pela propagação de fake news. Isso porque os dados indicam que WhatsApp e Facebook foram amplamente citados, pelos entrevistados, como fonte de informação.
A pesquisa aponta, ainda, que são as redes sociais as maiores responsáveis pela propagação de fake news. Isso porque os dados indicam que WhatsApp e Facebook foram amplamente citados, pelos entrevistados, como fonte de informação.
Quanto aos índices, a plataforma de conversa on-line, WhatsApp, aparece como líder em distribuição de fake news no país. Seis em cada 10 pessoas tiveram o aplicativo de mensagem como propagador de notícias falsas sobre o novo coronavírus. Já o Facebook, segundo colocado no ranking, é responsabilizado por cinco em cada 10 internautas.
Laura Moraes, coordenadora de campanhas da Avaaz, ressalta que diversos fatores, em combinação, podem propiciar uma maior circulação de fake news.
Para ela, um deles diz respeito ao aspecto emocional, visto que notícias impactantes tendem a gerar um anseio por compartilhá-las, seja para destacar algo que parece, como dito pela coordenadora, “absurdo” ou mesmo para tentar alertar demais pessoas sobre informações que podem vir a ser úteis. “Desse modo, amplificamos o alcance dessas informações maliciosas, perigosas e falsas.”
"Pessoas podem morrer, e não existe consequência mais negativa do que essa: pessoas morrendo por causa da desinformação. Ao acreditar em fake news em ciência, as pessoas tendem a optar por tratamentos de risco, curas milagrosas, formas de prevenção não eficazes e, também, a quebrar o isolamento social, colocando a vida delas e a de outros em perigo."
Natália Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência (IQC)
Além disso, segundo a coordenadora de campanhas da Avaaz, sendo este um momento de incerteza e medo, as pessoas tendem a procurar e acreditar em informações que as ofereçam certa segurança. E, mesmo que tenham noção da realidade atual, a busca pelo conforto e sentimento de alívio as torna mais suscetíveis à propagação de fake news.
“Em momentos como esse, de pandemia, as pessoas querem acreditar que os problemas são menores do que de fato são ou que existem curas e soluções mais fáceis. Dessa forma, essas pessoas tendem a se apegar em notícias falsas sobre curas milagrosas do novo coronavírus, por exemplo, pois essa possibilidade é mais tranquilizante do que a realidade, que este é um vírus mortal e que, para combatê-lo, hábitos serão drasticamente modificados.”
Outro fator que contribui para a propagação de fake news, conforme alerta Laura, está na operação das redes sociais por algoritmos, inteligências artificiais que definem o que é visto pelo internauta.
“Esses algoritmos são desenhados para manter seus usuários com os olhos fixos nas telas, seja de computador ou celular, pelo máximo de tempo possível. Então, é uma espiral viciada de conteúdo falso e perigoso que mantém as pessoas cada vez mais engajadas com as fake news e cada vez mais suscetíveis aos impactos causados por elas.”
Neste contexto, Laura destaca que a criação desses conteúdos pode muitas vezes conter razões distintas, mas que, sendo esta uma questão de saúde pública nacional e mundial, alguns aspectos capazes de estimular a produção de notícias falsas podem se correlacionar a debates políticos, institucionais e ideológicos.
“Há motivações, muitas vezes, em destruir os esforços destinados à vacinação, principalmente pelos movimentos antivacina, em criar desconfiança quanto às instituições de saúde e informações cientificamente comprovadas ou em realizar manipulação política, mesmo sendo este um momento delicado para a saúde.”
Consequências
Natália Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência (IQC), que endossa a preocupação com o impacto das fake news sobre o comportamento das pessoas, aponta que, em meio à pandemia, o impacto da disseminação de informações falsas pode ser fatal, afetando diretamente a vida de muitas pessoas.
“Pessoas podem morrer, e não existe consequência mais negativa do que esta: pessoas morrendo por causa da desinformação. Ao acreditar em fake news em vez da ciência, as pessoas tendem a optar por tratamentos de risco, curas milagrosas, formas de prevenção não eficazes e, também, a quebrar o isolamento social, colocando a vida delas e a de outros em perigo.”
Por isso, Natália acredita ser importante que medidas de combate à disseminação de informações falsas sejam tomadas, como é o caso da própria entidade que preside.
O Instituto Questão de Ciência (IQC) tem atuado durante a pandemia de COVID-19 a fim de conter a propagação de fake news ou notícias sem comprovação científica, que podem colocar em risco a saúde e a vida de milhões de pessoas.
O Instituto Questão de Ciência (IQC) tem atuado durante a pandemia de COVID-19 a fim de conter a propagação de fake news ou notícias sem comprovação científica, que podem colocar em risco a saúde e a vida de milhões de pessoas.
“É muito difícil controlar a propagação de fake news, pois elas se espalham muito rápido. E isso já é uma tendência comum, no entanto, em um momento como este, no qual as pessoas estão emocionalmente abaladas e com medo, essa disseminação de informações falsas aumenta consideravelmente. É preciso tomar atitudes.”
Para a presidente do IQC, existe um contraponto a essa difusão de notícias falsas, e este é a confiança em veículos informativos sérios e credíveis, bem como em órgãos oficiais de saúde. Portanto, Natália alerta que, em meio à pandemia, esses precisam ser os canais de informação escolhidos pelas pessoas.
“A população precisa entender e condicionar o acesso à informação a meios que as transmitem de forma correta, verificada e cientificamente comprovada. Mas esse material deve também ser veiculado em uma linguagem acessível para todos. Ao contrário disso, o conteúdo, até então, verídico pode culminar em mais desinformação.”
Além disso, Natália pontua ser necessário a responsabilização das mídias sociais pela propagação de notícias falsas. Isso porque, conforme apresentado pelo estudo, são elas as maiores responsáveis por essa difusão. No entanto, a presidente do instituto ressalta que não será essa uma medida de censura e sim de contenção e avaliação dos conteúdos publicados, a fim de verificá-los como autênticos ou não e apresentar informações corretas.
“É necessário que todas as redes sociais realizem uma checagem dos fatos disponibilizados em suas plataformas e corrijam, quando preciso, as informações. Então, não se trata de censurar a liberdade de expressão ou as postagens, mas sim de se fazer um exercício de correção, junto com agências de checagem, que possam atestar a veracidade dos fatos. Isso é muito importante.”
A presidente do IQC ressalta, ainda, que mesmo que esse método não seja adotado pelas mídias sociais, os internautas podem, por si só, buscar e atestar as informações como verídicas ou não, em vez de apenas compartilhá-las, visto que inúmeras agências de checagem de notícias já estão em atividade no Brasil.
No entanto, Natália comenta sentir falta de uma ação governamental com o intuito de conter a propagação de informações falsas. “O poder público deveria tomar medidas para ajudar na contenção das fake news. Faz falta uma agência oficial do governo, na qual poderia se ter acesso à informação correta e à consequente refutagem da notícia falsa.”
Projeto de lei
Laura, coordenadora de campanhas da Avaaz, conta que além dos esforços destinados ao combate de fake news da agência, em parceria com o Instituto Questão de Ciência (IQC), um projeto de lei, denominado Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, sob os números PL 1429/2020, na Câmara dos Deputados, e PL 1358/2020, no Senado, é visto com “bons olhos”.
“O esforço feito pelos deputados Felipe Rigoni e Tabata Amaral e, também, pelo senador Alessandro Vieira, em conjunto com outros 12 deputados ao construírem uma consulta pública a esse projeto de lei é bem-vindo e recebido pela Avaaz como um forte precedente para a criação de leis de combate à desinformação em todo o mundo, que equilibrem tanto a proteção da liberdade de expressão quanto da saúde pública, da segurança e da democracia.”
Ainda, para Laura, a proposta, da maneira como está delineada, traz eficiência, transparência e rapidez no combate à circulação de notícias falsas na internet, baseada na colaboração entre as plataformas de redes sociais, dos poderes Executivo e Judiciário e de atores independentes.
“Caso mantenham a obrigatoriedade de as plataformas aplicarem as medidas eficazes contra a desinformação que acreditamos ser eficaz, que é mostrar os fatos, corrigir os erros e desintoxicar o algoritmo, essa lei deve ser aprovada com urgência no Congresso, pois poderá efetivamente salvar vidas durante a pandemia do novo coronavírus”, afirma.
Estudo
A pesquisa foi realizada por meio de um monitoramento feito, por pesquisadores da Avaaz, em conteúdos com desinformação sobre a COVID-19, desde o início de março deste ano. Após algumas rodadas de pesquisa entre os membros da comunidade da Avaaz, via Survey Monkey, os pesquisadores selecionaram as afirmações que foram mais popularmente vistas e tidas como verdadeiras.
O estudo foi feito com internautas da Itália, do Brasil e dos Estados Unidos. Sendo assim, seis alternativas falsas idênticas foram apresentadas e, para cada país, incluiu-se uma afirmação falsa, que estava circulando especificamente nas línguas locais.
Laura explica, ainda, que todas as afirmações falsas selecionadas para fazer parte da pesquisa foram previamente desmentidas por, pelo menos, um verificador de fatos independente e renomado em um dos países em questão.
“A pesquisa foi conduzida virtualmente com pessoas entre 18 e 65 anos e foram entrevistadas 2.001 pessoas no Brasil, 2.002 na Itália e 2.000 nos Estados Unidos, entre os dias nove e 15 de abril deste ano. A margem de erro é de 2,2% para cada país”, destaca Laura.
Os resultados obtidos caracterizaram as redes sociais como o epicentro da propagação de fake news, sendo WhatsApp e Facebook as fontes mais citadas em todas as declarações falsas estudadas na pesquisa realizada no Brasil.
“59% dos entrevistados brasileiros visualizaram pelo menos uma das notícias falsas no WhatsApp, e 55%, no Facebook. Além disso, 46% acreditam que familiares ou amigos foram vítimas de fake news.”
A pesquisa pode ser acessada, na íntegra, no site da Avaaz.
* Estagiária sob a supervisão da editora Teresa Caram