A espera por um órgão, qualquer que seja, pode demorar, e as horas e dias tendem a parecer intermináveis para quem precisa do transplante. É a sensação que acompanha 4.572 pessoas em Minas Gerais, segundo dados divulgados pela Central Estadual MG Transplantes. A corretora de seguros Tatiana Del Rio, de 46 anos, está nessa expectativa. Diagnosticada há aproximadamente um ano com problema renal, em decorrência de pressão arterial alta – e de duas eclampsias agudas, devido a complicação grave durante a gravidez, também conhecida como síndrome de Hellp –, ela precisa de um rim e segue em tratamento de hemodiálise.
“Eu tenho meus dois rins em bom funcionamento, apesar de não operarem 100%. Mas meu diagnóstico médico é de que eles estão agonizados, ou seja, estão machucados”, conta Tatiana. A corretora começou a fazer hemodiálise em maio do ano passado, e, agora, cumpre também o tratamento com a filtração do sangue em casa (diálise peritoneal).
Ela assumiu os cuidados, com todos os equipamentos cedidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), e não se assustou com a opção de se tratar em casa, aprendendo como fazer o procedimento. Ainda que a doença não seja genética e/ou hereditária, o pai dela também teve complicações graves nos rins e precisou fazer a mesma hemodiálise. Na época, era ela quem tratava do pai, que morreu à espera de um rim.
“Por ironia do destino, precisei fazer o mesmo tratamento, mas não me incomodo. Para mim, é bem melhor, pois, por fazê-lo em casa, todos os dias na parte da noite, posso trabalhar, ter contato com minha família no decorrer do dia e, quando chega a hora de dormir, faço a diálise peritoneal”, diz Tatiana.
Saída
O transplante é a única saída para um paciente renal e, por isso, Tatiana mantém a esperança de que seus próprios familiares sejam aprovados como futuros doadores. Quando se trata do rim, pessoas ainda em vida podem doar um de seus órgãos. No entanto, o otimismo ainda fala mais alto e Tatiana sonha em não necessitar da cirurgia.
“Conversei com psicólogos do Hospital da Baleia no tempo em que fiz o tratamento presencial e eles me disseram que todo paciente renal, para ter uma sobrevida e voltar a ter uma vida normal, precisa ser transplantado e receber um rim novo. Ainda aguardo o resultado de compatibilidade de meus familiares, mas não sinto que essa será a minha última saída. Sinto que vou melhorar”, afirma.
Outro objetivo que também alimenta o sonho de Tatiana é poder, novamente, viajar e nadar sem limitações. “O transplante é a luz no fim do túnel para que eu possa ter uma nova chance na vida, de vivê-la melhor, porque, com a hemodiálise, me sinto bem, mas ela me priva de viajar ou tomar um banho de piscina, devido ao cateter inserido na região do abdômen”, explica. Ela tem vontade de passear por longos dias, e ter que levar a máquina também atrapalha.
Felicidade
Transplantado em 2019, após espera de três anos por um rim, o porteiro Ronaldo Rodrigues, de 37 anos, não se esquece do dia em que recebeu a notícia sobre a cirurgia. “Fiquei muito feliz. Sempre acreditei que conseguiria e esse transplante mudou a minha vida. Depois da cirurgia, passei a acreditar mais na vida, a dar mais valor às pequenas coisas e à minha família”, afirma. Ele tem três filhas.
Ronaldo conta que, durante o período de espera, se manteve calmo e confiante, principalmente por causa da motivação que sentia ao acompanhar suas filhas. Foi a maior alegria de sua vida receber a notícia de que o transplante seria agendado. Surgiram medo e angústia antes da cirurgia, mas, agora, restam os cuidados necessários após o procedimento.
Desejo deve ficar claro em vida
A espera por um órgão, segundo Cecília Bicalho, coordenadora de enfermagem do Serviço de Hemodiálise, Transplante e Diálise Peritoneal do Hospital da Baleia, não tem relação com o tempo em que o paciente aguarda na fila do transplante, mas, sim, com a compatibilidade frente ao doador.
“Uma pessoa pode estar na fila por 20 anos e um paciente que está há apenas um ano receber o órgão primeiro. Isso ocorre porque existem critérios rígidos de compatibilidade e, por isso, infelizmente, muitas pessoas acabam falecendo antes de receber a doação em razão de complicações da doença”, explica. Para cada órgão disponibilizado à doação, o transplante dependerá de características imunológicas, clínicas e sorológicas, entre outras, do doador e do receptor.
Cecília destaca, ainda, ser muito importante que o paciente em espera siga com as orientações médicas e tratamentos, pois para que o transplante ocorra, o receptor precisa estar em bom estado geral de saúde. “O dia da ligação telefônica com a notícia do transplante vai chegar e, com isso, o dia de receber o novo órgão também. É preciso que os cuidados necessários sejam mantidos.”
Para que esse momento chegue, a coordenadora de enfermagem do Hospital da Baleia observa que a doação de órgãos (coração, pulmão, rim, fígado e pâncreas) ou tecidos (medula óssea, ossos e córneas) precisa ser feita.
As pessoas que desejam doar seus órgãos após a morte precisam comunicar à família esse desejo, pois, caso isso não ocorra, os familiares é quem tomarão essa decisão.
“A doação de órgãos é um ato de amor, principalmente porque no momento mais difícil de uma família, quando um ente querido se vai, ela opta por doar e salvar outra vida. É preciso se colocar no lugar do outro.” Com o desejo manifestado à família, o doador poderá ser atendido pela equipe médica após ser constatada a morte encefálica irreversível.
Em vida, as pessoas podem doar um rim, parte do pulmão, parte do fígado ou parte da medula. Para isso, o médico deverá avaliar a história clínica do doador, bem como se há doenças prévias em seu organismo. Além disso, é preciso haver compatibilidade sanguínea, o que é necessário em qualquer ocasião.
Pós-transplante
Pós-transplante
Na nova vida pós-transplante, alguns cuidados precisam ser tomados pelo receptor, a fim de garantir o sucesso da cirurgia, bem como de evitar riscos. De acordo com o Manual de Orientação ao Paciente Transplante, divulgado pelo Grupo de Apoio aos Transplantados (GAT), esses cuidados se dividem em dois períodos diferentes: os que devem ser tomados durante a internação e aqueles a serem aplicados permanentemente ao longo da vida.
*Estagiária sob supervisão da subeditora Marta Vieira