Jornal Estado de Minas

SAÚDE

COVID-19: Constipação crônica pode ser agravada na pandemia


Para além dos riscos de contaminação pela COVID-19, a pandemia impulsionou uma série de mudanças na rotina das pessoas e, inclusive, aumentou a incidência de algumas doenças, bem como a gravidade de alguns quadros clínicos. No caso da constipação idiopática crônica não foi diferente.



E isso muito tem a ver com a necessidade de isolamento social e a consequente impossibilidade de frequentar academias e locais públicos, diminuindo, assim, a frequência e intensidade de práticas esportivas e/ou exercícios físicos. 

Mas o que é a constipação idiopática crônica e por que a falta de atividades físicas pode agravar os casos da doença? De acordo com a gastroenterologista e professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Maria do Carmo Friche Passos, primeiro se faz necessário entender do que se trata a patologia e como ela se manifesta no organismo para, então, entender a relação com o atual cenário brasileiro e mundial. 

“A constipação idiopática crônica é uma condição na qual a evacuação ocorre com menos frequência do que a usual, quando as fezes são duras, secas e sua expulsão é dolorosa ou difícil ou, ainda, se a evacuação é percebida como incompleta ou bloqueada. A constipação idiopática crônica não é o mesmo que prisão de ventre ocasional, já que não ocorre só de vez em quando. Ela está presente por, pelo menos, três meses seguidos na vida do paciente.” 

Nesse cenário, o diagnóstico da constipação idiopática crônica é, muitas vezes, clínico, sendo estimulado pela conversa entre o médico e o paciente.



É importante ressaltar, segundo a especialista, que essa anamnese seja o mais detalhada possível. Para isso, é essencial que o paciente conheça a sua rotina no banheiro e que consiga descrevê-la conforme os critérios de Roma para contribuir para o diagnóstico. 

Menos de três evacuações espontâneas por semana; mais de 25% das evacuações com esforço evacuatório; mais de 25% das evacuações de fezes irregulares ou endurecidas; mais de 25% das evacuações com sensação de obstrução ou bloqueio anorretais; mais de 25% das evacuações com necessidade de manobras manuais para defecar.

"Esses são os sintomas normalmente apresentados por pessoas com constipação idiopática crônica. Para que, de fato, a doença seja apresentada como laudo, o indivíduo precisa apresentar, no mínimo, dois dos sintomas listados por, pelo menos, três meses”, explica Maria do Carmo Friche. 





Porém, em alguns casos, somente essa “conversa” não é o suficiente para dar o "veredicto" sobre a doença. Assim, é necessário a realização de exames específicos a serem solicitados pelo gastroenterologista ou proctologista para maior certeza ou exclusão de outras patologias.

“Entre os exames capazes de identificar o quadro clínico estão: defecografia, colonoscopia, manometria anorretal e tempo de trânsito colônico. Além disso, se o paciente apresentar sintomas acrescido de dor abdominal mesmo após a ida ao banheiro, é preciso considerar a possibilidade de síndrome do intestino irritável com predominância de constipação.” 
 
 

E o que o a pandemia tem a ver com isso? Segundo Maria do Carmo Friche, isso se justifica pela falta de atividade física causada pela redução de exercícios durante o isolamento social, o que propicia o agravamento dos quadros da doença.

“Isso pode ocorrer pois os exercícios estimulam os movimentos peristálticos do intestino, contribuindo com a evacuação. Não à toa, uma das recomendações médicas para lidar com os efeitos da constipação idiopática crônica é o exercício aeróbico como caminhadas, bicicleta e natação, que ajudam no funcionamento do intestino.” 

Deste modo, conforme elucidado pela gastroenterologista, a ausência da prática frequente pode desestabilizar o funcionamento do intestino. 




 

IMPACTOS 


E quem sofre com tudo isso é o corpo, haja vista que o trânsito intestinal pode ser, e muito, comprometido pela constipação idiopática crônica. “O paciente com constipação idiopática crônica costuma apresentar fezes dos tipos 1 (em cíbalos ou bolinhas) e 2 (ressecadas e endurecidas), 75% dos pacientes acometidos pela constipação idiopática crônica dizem passar mais de uma hora no banheiro”, aponta a especialista. 

Maria do Carmo Friche destaca que isso vai muito além, já que os danos passam a ser percebidos na forma como o paciente lida com a situação. “Esse fato traz prejuízos na vida pessoal e profissional, pois o indivíduo pode deixar de viajar, socializar-se, fazer exercícios físicos e até mudar de emprego em razão da doença. Mas vale destacar que aproximadamente 70% dos casos apresentam trânsito intestinal absolutamente normal, é o que chamamos de constipação funcional”, explica. 

O QUE FAZER? 


Maria do Carmo Friche elucida que a constipação idiopática crônica não tem cura, portanto, o tratamento da doença consiste na redução de sintomas e melhora da qualidade de vida dos pacientes. Isso inclui o uso de medicamentos prescritos sob orientação médica.



E, nesses casos, não se deve tomar laxante por conta própria, porque o uso crônico pode acostumar o intestino, fazendo com que o organismo exija uma dose maior para obter o efeito. 

Segundo a especialista, o primeiro passo para ganhar em bem-estar mesmo com o diagnóstico incurável é deixar o tabu de lado e conversar com um médico sobre o problema.

Além disso, a gastroenterologista ressalta a importância da mudança de hábitos para a melhora da condição de saúde do paciente e, consequentemente, de sua qualidade de vida.  

“A reeducação é uma grande aliada nessa luta. Isso porque, para controlar a doença, a ingestão de líquidos e a alimentação rica em fibras são muito importantes, pois estimulam o peristaltismo intestinal, melhorando a constipação”, diz Maria do Carmo Friche, que pontua, ainda, a importância de hábitos mais saudáveis na prevenção da constipação idiopática crônica. 

“A causa da constipação idiopática crônica ainda é desconhecida, mas pode estar associada à redução da ingestão de fibras e de líquidos. Portanto, para prevenir o quadro, a orientação médica é manter uma boa saúde, com mudanças comportamentais e reeducação de hábitos, principalmente durante a pandemia, na qual uma grande parte da população está isolada em casa, com menos acesso a parques e espaços para a prática regular de atividades físicas que ajudam no fortalecimento da musculatura abdominal e no funcionamento intestinal.” 

*Estagiária sob a supervisão da editora Teresa Caram 




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