Jornal Estado de Minas

COMPORTAMENTO

Cartas escritas à mão: afeto único

(foto: Pixabay)


O livro das cartas, que chegou às livrarias em 2020, é um presente para acalentar o coração e dar vazão às emoções em tempos difíceis e estranhos em um cenário de pandemia. Se antes comum, hábito de gerações, é certo que nem todos sabem escrever uma carta. E quem tem o dom leva para o papel o incomensurável. A jornalista Silvia Prevideli, que atua exclusivamente no mercado editorial e é uma das organizadoras do livro ao lado Silvia Regina Angerami, diretora da editora Reality books, conta que a ideia surgiu de resgatar esta forma de escrita tão afetuosa, tão única e antiga na sociedade. As cartas possibilitam uma publicação que é um misto de literatura e coloquialismo, de privado e público, ao mesmo tempo em que convida o leitor ao suspense, de pensar se foi enviada, se teve resposta, qual desfecho a história teve.





Silvia Prevideli explica que a proposta era encontrar cartas rascunhadas, mas nunca finalizadas ou nunca enviadas. Mas o leque se abriu e vieram cartas apenas pensadas e não escritas, cartas escritas a mão e nunca enviadas, cartas datilografadas, cartas engavetadas, cartas já iniciadas no computador, mas nunca concluídas, e finalmente cartas já enviadas, mas nunca publicadas.
 
Com 19 autores, Silvia Prevideli conta que buscaram dar voz a autores anônimos que tivessem esta história dentro de si, um vínculo forte com as cartas. “Queríamos variedade de relatos e destinatários, e temas inusitados, mas ao fim tivemos uma mistura de 'velhos conhecidos', conteúdos como a despedida, o agradecimento, o reconhecimento, o segredo revelado e surpresas ficcionais e personagens pouco prosaicos.” Vale registrar que, no livro, cinco autoras são de Minas Gerais.

Para a jornalista, as cartas vão mexer com o leitor. “Com certeza, as cartas vão tocar a memória, os saberes e valores de muitos leitores. Eles irão se encontrar ali não só com sua vontade de escrever algo semelhante, ao mesmo 'alguém' ou pelo teor do que foi dito, ou ainda vão se surpreender com destinatários que nunca imaginaram, mas bem se encaixam em suas vidas, como no caso da autora que escreve para o 'Tempo', a que escreve para um 'Caminho', entre outras”, ressalta Silvia Prevideli.





BUSCA DO EU, DA REFLEXÃO 


Mesmo vivendo na era pós-moderna, tempo de internet das coisas, inteligência artificial, indústria 4.0, enfim, a sociedade digital e das redes sociais, a carta ainda consegue provocar muitos. “Não somente a carta escrita a mão, mas as cartas em si que ocupam um espaço de recontar experiências vividas e relatadas em sua essência ou por vezes representadas e romantizadas, dando ao remetente o direito a contar a sua versão real ou sonhada. Ao se identificar com os textos das cartas, o leitor deixará a emoção e a saudade virem à tona e se enxergará nos testemunhos de pessoas que não fizeram história, pois não são famosos ou ativistas de algum momento social ou causa, mas simplesmente retratam suas vidas”, diz Silvia Prevideli.

“As cartas trazem subjetividade, individualidade, traços do passado que se insinuam no presente, que mesmo parecendo tão exclusivos daquele autor são facilmente partilhados pelo leitor, pois carregam códigos e sensibilidades comuns a um grupo, a uma nação, a uma cultura. Elas convidam à busca do eu, à reflexão, à escrita em si, a criar laços, mesmo que a distância”, enfatiza.

Em particular, Silvia Prevideli revela que é de uma geração em que as cartas ainda tinham o cheiro do papel, não mais da caneta tinteiro, mas o escrever a mão, a caneta. “Além disso, o mundo globalizado não era realidade na minha infância e adolescência, então a carta diminuía a sensação de distância e aumentava a de cumplicidade. Sempre escrevi cartas, as mais diversas, para quem estava próximo, e uma certa timidez e um certo romantismo pediam essa forma de expressão, ou para quem estava longe e a carta era a única forma de alcançar o destinatário, ora porque as ligações telefônicas eram caras, ora porque não havia o e-mail, ora porque sempre gostei de escrever e as cartas eram mais uma forma de escrita.”





Silvia Prevideli conta que, ainda hoje, com outros caminhos e instrumentos, ela escreve cartas, só que agora não mais a mão ou datilografadas, mas no computador. “Sinto que a velocidade das ideias precisa do teclado para que não se percam. Ainda faço algumas anotações no papel, mas a letra se desfigurou, perdeu sua firmeza e muitas vezes quando vou reler é um garrancho ininteligí- vel. Por isso uso o computador, assim não perco a ideia, nem o papel.”


SERVIÇO

(foto: Mockup Murilo Orefice/Divulgação )

  • Obra: O livro das cartas
  • Autores: Ana Carolina Carvalho Visone, Ana Lúcia de Araújo Guerrero, Anna Maria de Araújo Bonilha, Ariely Carolina Plana, Cláudia Andrade Goulart, Darcy de Araújo Guerrero, Ester Silbiger, Grenalt da Silva Machado, Luciana Garcia-Waisberg, Magda Velloso F. de Tolentino, Maria Clara Rizek, Mellissa Toledo de Barros Favaron, Patrícia Scotolo, Renata Feldman, Rosa Maria Garcia Barros, Silvia Prevideli, Silvia Regina Angerami, Solange Calvo, Terezinha Buoso Tavollassi e Vitor Theodoro.
  • Organizadoras: Silvia Prevideli e Silvia Regina Angerami
  • Editora: Liberty Books
  • Número de páginas: 140
  • Ano: 2020
  • Preço sugerido: R$ 52
  • Site: 
    • https://www.realitybooks.com.br/shop

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