Jornal Estado de Minas

SAÚDE

Saiba por que a COVID-19 pode causar danos na fertilidade masculina

Estudo desenvolvido pela Faculdade de Medicina  da Universidade de São Paulo (FMUSP) mostrou que a infecção pelo novo coronavírus pode afetar o sistema reprodutor masculino. Segundo os dados apresentados pela pesquisa, dos 26 pacientes com casos leves e moderados de COVID-19 que participaram do estudo, 42,3% deles apresentaram epididimite inflamação que acomete o epidídimo, canal localizado na parte posterior dos testículos. 





O artigo, "Padrões radiológicos de epididimite incidental em pacientes com COVID-19 leve a moderado revelados por ultrassom Doppler colorido", foi publicado na revista científica Andrologia. 
 
Em posicionamento oficial da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) ao Estado de Minas, a diretora da entidade, Karin Anzolch, destacou a importância do estudo para o atual momento da pandemia, bem como para constatações futuras. 

“Sabemos que o SARS-CoV-2 tem um comportamento potencialmente mais agressivo em homens e ainda se especula as causas disso. O estudo conduzido pelos colegas da USP é realmente muito interessante e traz um pouco mais de compreensão sobre essa infecção, especialmente no sexo masculino. A continuidade dessa linha de pesquisa pode nos confirmar a real incidência desses achados ou, mesmo, se haverá alguma repercussão futura em termos de fertilidade ou transmissão.”  

Mas por que isso ocorre? José Diogo Fialho, urologista do Grupo Hermes Pardini, explica que o vírus tem um mecanismo capaz de causar a inflamação do órgão.



“É algo que se assemelha ao que houve na epidemia de Sars na Ásia, em 2002. Após autopsia de pacientes que morreram de casos graves da doença, foi observada a presença do vírus nas células do sistema reprodutor masculino. Estudando mais a fundo, os cientistas descobriram que esse vírus entrava nas células ao se ligar a proteínas presentes em grande quantidade no sistema reprodutor masculino (as proteínas ACE2 e TMPRSS2).” 

“O Sars-Cov-2, vírus causador da COVID-19, tem esse mesmo mecanismo. Ele entra nas células do corpo humano ao se ligar a essas mesmas proteínas e chega aos testículos e epidídimo causando uma inflamação. Ou seja, a inflamação no epidídimo e testículos, ou orquiepididimite, causada pelo coronavírus, se dá pela reação do corpo humano ao tentar combater o vírus dentro das células do sistema reprodutor, já que o organismo direciona mais sangue e células de defesa para o local”, explica. 

José Diogo Fialho, urologista do Grupo Hermes Pardini (foto: Arquivo pessoal)
Essa inflamação do epidídimo também pode ser causada por bactérias, traumas, infecções sexualmente transmissíveis, infecção do trato urinário e demais vírus. Porém, a causa não influencia nos possíveis sintomas causados aos pacientes, como inchaço, febre, vermelhidão e dor, todos eles característicos de um processo inflamatório. No entanto, segundo José Diogo Fialho, é importante salientar que muitos indivíduos não apresentarão sintomas mesmo tendo o quadro clínico de inflamação do epidídimo.  

Por isso, é preciso haver atenção a qualquer mínimo sinal, a fim de realizar o diagnóstico precoce e tratar a doença. Isso porque danos sérios podem ser percebidos na saúde. É o que alerta o urologista Rogério Saint-Clair. “Os principais riscos são: possibilidade de atrofia e redução do volume do testículo, formação de abscessos e possibilidade da infecção se generalizar e sair do testículo, atingindo a corrente sanguínea”, destaca. 

Além disso, o quadro de inflamação do epidídimo pode causar infertilidade masculina em razão do alto teor de receptores ACE2 presentes nesse órgão. 
 

Diagnótico e tratamento

 
Caracterizada como uma doença comum, a epididimite pode ser diagnosticada por meio de exames físico e de imagem, como ultrassom. E, a partir de então, ser tratada com analgésicos e anti-inflamatórios, aplicação de gelo no escroto e repouso. No caso das inflamações causadas por bactérias, a melhor terapia é com antibióticos específicos para cada infecção. 





Quando há a presença de abscessos – bolsa de pus –, pode se fazer necessária a realização de cirurgias e drenagem da bolsa escrotal para eliminar o pus. Em casos mais raros, a retirada do testículo pode ser a opção mais viável de cura. Quando a causa é a infecção por COVID-19, haja vista a complexidade e novidade do quadro associado, o tratamento adequado ainda é “incerto”, já que não existem medicamentos que combatam a infecção causada por esse tipo de vírus. 

 
Medidas de prevenção

 
Em alguns casos, esse tipo de inflamação, que acomete o sistema reprodutor masculino, pode ser evitada. “É possível prevenir em casos de infecções que são transmitidas por via sexual, com o uso de preservativos. Além disso, a incidência diminui quando o homem reduz o risco de contaminação com bactérias. Já os vírus são mais difíceis de se prevenir. Para a COVID-19, vale manter as medidas de distanciamento social, higiene e uso de máscaras, que são fundamentais para evitar a disseminação do vírus”, recomenda Rogério Saint-Clair. 

José Diogo Fialho destaca que, assim como todas as áreas da saúde, a urologia ainda tem muito o que se estudar sobre os impactos que a COVID19 terá sobre o corpo humano a longo prazo. Por isso, ele aponta uma dica de ouro: “em caso de dúvidas ou surgimento de sintomas, procure um especialista. Isso é muito importante”, diz. 

*Estagiária sob a supervisão da editora-assistente Vera Schmitz

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