“Nós podemos descobrir o significado da vida de três diferentes maneiras: fazendo alguma coisa, experimentando um valor ou o amor, e sofrendo. Quando a situação for boa, desfrute-a. Quando a situação for ruim, transforme-a. Quando a situação não puder ser transformada, transforme-se.” O ensinamento é de Viktor Frankl, judeu, médico neuropsiquiatra, sobrevivente dos campos de concentração da Alemanha nazista, fundador da logoterapia e da análise existencial, abordagens psicoterápicas desenvolvidas em Viena, posteriores à psicanálise de Sigmund Freud.
É a partir de seus ensinamentos que a psicóloga clínica Maria Clara Jost, pós-doutora e doutora em psicologia, especialista em filosofia e psicoterapia fenomenológico-existencial, professora da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (FCMMG) e sócia da Tip Clínica, analisa o que é enxergar os aspectos bons de situações difíceis. “O ser humano é o único capaz de descobrir as possibilidades que a vida apresenta. É quem pode se posicionar e sempre de maneira diferente e surpreendentemente diante das circunstâncias”, diz.
Maria Clara Jost enfatiza que o as pessoas tendem a tomar atitudes radicais e extremistas. Ou é tudo bom ou tudo ruim, excluindo a outra possibilidade. “Na vida, o bom e o ruim vêm juntos, como na natureza. Não é só dia de sol ou só de chuva. Há momentos de cor, de vitalidade, de brilho, assim como de tonalidades cinzas e fechadas. Em termos de sentimentos e emoções, tudo isso aparece a partir dos acontecimentos e situações do cotidiano, nem sempre tem de ser um grande evento.”
Por isso, alerta Maria Clara Jost, como o bom e ruim andam juntos, é necessário procurar viver o equilíbrio, que é o ponto-chave. Para a psicóloga, conquistar esta balança está ligado a como cada um se posiciona. E não é sobre o que acontece, mas como a pessoa se impacta e se posiciona diante dos acontecimentos. “É o que chamamos de se conhecer. Como reagir diante das circunstâncias. Não para se acomodar, mas para se tornar mais inteiro e íntegro.”Na vida, o bom e o ruim vêm juntos, como na natureza. Não é só dia de sol ou só de chuva. Há momentos de cor, de vitalidade, de brilho, assim como de tonalidades cinzas e fechadas. Em termos de sentimentos e emoções, tudo isso aparece a partir dos acontecimentos e situações do cotidiano
Maria Clara Jost, psicóloga clínica e professora da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais
A psicóloga reforça que toda situação tem possibilidades e desafios. “O crescimento envolve um treino de posicionamento ou reposicionamento diante da vida o tempo todo. Qual pergunta a vida está fazendo? Qual resposta pode dar? E digo que não é fácil”, afirma.
Sobre outro aspecto, Maria Clara Jost alerta sobre o risco e a armadilha, não só das pessoas, mas inclusive de especialistas, com a tendência de problematizar tudo, de apontar o adoecimento, falar que é negacionismo. Até porque, não é uma postura equilibrada. Há pessoas que se posicionam e isso não é negar.
“E, de fato, as pessoas que se posicionam têm mais energia mesmo. Quem enfrenta uma doença toma providências, puxa energia para o sentido da melhora. Quem se entrega, adoece mais. Não que estejam ligados, não é nivelar por baixo. Mas a postura de enfrentamento diante da vida: sucumbir ou enfrentar. Quem encara tem mais energia física e emocional.”
“E, de fato, as pessoas que se posicionam têm mais energia mesmo. Quem enfrenta uma doença toma providências, puxa energia para o sentido da melhora. Quem se entrega, adoece mais. Não que estejam ligados, não é nivelar por baixo. Mas a postura de enfrentamento diante da vida: sucumbir ou enfrentar. Quem encara tem mais energia física e emocional.”
UM PESO PARA CADA SITUAÇÃO
A psicóloga avisa que é necessário aprender a colocar o devido peso para cada situação. Há momentos bons com dificuldades, os difíceis e a chance de crescer sempre. Maria Clara Jost enfatiza que emoção é energia e força. Agora, se ela é destrutiva, pode destruir a pessoa. Uma situação é a raiva que gera substâncias químicas que são negativas para o corpo.
A outra é a raiva que faz enfrentar, arregaçar a manga e ter o empuxo, a raiva que ajuda. E o ser humano se sente mais capacitado ao enfrentar e vencer as dificuldades, os momentos ruins do que quando não encara nenhuma dificuldade. Isso, em qualquer idade, é do ser humano. É da liberdade, explica.
A outra é a raiva que faz enfrentar, arregaçar a manga e ter o empuxo, a raiva que ajuda. E o ser humano se sente mais capacitado ao enfrentar e vencer as dificuldades, os momentos ruins do que quando não encara nenhuma dificuldade. Isso, em qualquer idade, é do ser humano. É da liberdade, explica.
O que faz a psicóloga traduzir essa capacidade em uma de suas músicas preferidas: O que é, o que é?, de Gonzaguinha: “Viver/E não ter a vergonha de ser feliz/Cantar e cantar e cantar/A beleza de ser um eterno aprendiz/ Ah meu Deus/Eu sei, eu sei/Que a vida devia ser bem melhor e será/Mas isso não impede que eu repita/É bonita, é bonita e é bonita”.
PAZ E LEVEZA
Quem certamente concorda com a letra da canção de Gonzaguinha é a empresária Juliana Junqueira, de 47 anos, sócia-diretora da Acttio Engenharia e Gestão, que acredita que ver o lado bom da vida mesmo nos momentos ruins faz parte da sua personalidade: “Procuro sempre aprender com as situações e seguir o exemplo de pessoas mais experientes. Acho que a situação que mais me marcou foi uma vez em que ajudei na logística de um tio-avô a voltar para casa, porque a casa dele tinha sido invadida. Os ladrões levaram tudo e violentaram a nora dele”.
Ela conta que quando ele entrou no carro, estava mudo, sem saber o que dizer. “Para minha surpresa, foi ele quem disse: 'Oi, minha querida, não precisava ter este trabalho de me buscar. Eu poderia ter resolvido isto. Na realidade, estou voltando nesta pressa toda para acalmar minha família. Fomos os escolhidos para mostrar à comunidade que nossa cidade não é mais tranquila como antigamente, e que as autoridades precisam, urgentemente, agir para voltarmos a morar no paraíso'. E com essa calma toda ele voltou para casa olhando o lado positivo da situação. Na ocasião, ele tinha 75 anos; este ano, vamos comemorar os 92 anos dele.”
Juliana revela que já vivenciou situações em que aprendeu que nada é por acaso. “Existem momentos que parecem sem sentido, ruins, que não merecemos. Mas lá na frente conseguimos perceber o porquê daquela vivência e o que ela trouxe de positivo. Em 1º de janeiro de 2015, quebrei os dois pés. Foram 45 dias praticamente de cama, dependendo das pessoas para pegar um copo de água, pois minha casa não era adaptada para cadeirante. Hoje, posso escrever um livro descrevendo o aprendizado de cada dia daquele momento e o quanto foi importante para a minha vida pessoal e profissional.”
Para Juliana, ao ver o lado bom do ruim, ela ganha “paz”. E conta que quem entende que mesmo em momentos ruins podem existir coisas boas, vive mais em paz e, consequentemente, mais leve.
“A mente comanda o corpo. Não significa que não tenho problemas, que não fico triste, que não sofro, mas não deixo situações ruins tomarem conta dos meus pensamentos. Sempre acordo acreditando que o dia de hoje vai ser melhor que o de ontem e pior que o de amanhã. Por exemplo, para a minha saúde mental, com todo meu respeito às famílias das vítimas da COVID-19, e tomando todos os cuidados recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), durante este período de pandemia procurei focar mais nos números dos infectados que se curaram do que no número de óbitos.”
“A mente comanda o corpo. Não significa que não tenho problemas, que não fico triste, que não sofro, mas não deixo situações ruins tomarem conta dos meus pensamentos. Sempre acordo acreditando que o dia de hoje vai ser melhor que o de ontem e pior que o de amanhã. Por exemplo, para a minha saúde mental, com todo meu respeito às famílias das vítimas da COVID-19, e tomando todos os cuidados recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), durante este período de pandemia procurei focar mais nos números dos infectados que se curaram do que no número de óbitos.”
E quem carrega peso o tempo todo? Não consegue equilibrar as cargas da vida? Para Juliana, não é fácil mudar uma pessoa negativa. “Até porque, na maioria das vezes, elas atraem coisas ruins o tempo todo. Sempre tento provocá-las para instigá-las a perceber e focar no que existe de positivo nas situações, pois concentrando no que há de bom parece que o que há de ruim minimiza. É um exercício que precisa ser praticado.”
Juliana conta que no dia a dia da empresa, que atua nas áreas de engenharia e gestão, lida com situações difíceis ligadas à sobrevivência da Acttio, num mercado ultracompetitivo, com imprevistos indesejáveis e uma pressão enorme de prazos e eficácia impostos pelo mundo corporativo. “Para enfrentar todas as situações e garantir a saúde emocional, é preciso dar uma pausa, respirar fundo e buscar motivação positiva para inspirar a equipe envolvida, sempre insistindo na manutenção do bom humor”, diz.
Essa prática desanuvia a pressão, neutraliza bloqueios, restaura a energia e até desperta a criatividade para encontrar soluções para os problemas. Segundo ela, é como se diz na sabedoria popular: “Fazer do limão uma limonada” e, às vezes, até uma caipirinha. “Outra prática que Juliana procura fazer é, no momento ruim, parar para agradecer as coisas boas, que podem ser da situação ou não. Ajuda muito.