Pesquisa brasileira aponta que cerca de 98,8% dos pacientes com doenças raras que participaram do estudo – ao todo, 1.477 – sofreram com interrupções dos serviços públicos de saúde durante a pandemia.
Destes, 55,5% tiveram interferências em relação aos exames de diagnóstico, 71,1% quanto as consultas com médico geneticista, 44% quanto a terapia farmacológica e 67,9% de reabilitação, 34,6% sofreram com a falta de acompanhamento psiquiátrico e 30,3% com a ausência de cirurgias ou transplantes.
Destes, 55,5% tiveram interferências em relação aos exames de diagnóstico, 71,1% quanto as consultas com médico geneticista, 44% quanto a terapia farmacológica e 67,9% de reabilitação, 34,6% sofreram com a falta de acompanhamento psiquiátrico e 30,3% com a ausência de cirurgias ou transplantes.
Além disso, 77,7% tiveram problemas quanto a indisponibilidade temporária de medicamentos para tratar doenças raras. Domingo, 28 de fevereiro, é o Dia Mundial das Doenças Raras.
“O sistema de saúde teve que se reorganizar, priorizando o combate ao vírus. Portanto, fatores a considerar em relação a estes índices incluem o próprio isolamento e o medo da comunidade de pacientes e cuidadores com doenças raras, entre outras medidas preventivas, como a restrição à circulação e ao acesso aos centros de saúde. Questões socioeconómicas também devem ser consideradas.”
É o que aponta a professora Ida Schwartz, associada do Departamento de Genética e dos cursos de Pós-Graduação em Genética e Biologia Molecular e de Ciências Médicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e responsável pela pesquisa. Segundo ela, mesmo priorizando o combate ao vírus, o não interrompimento desses tratamentos é muito importante, haja vista as possíveis complicações.
“É possível haver um agravo do quadro clínico do paciente, mas também há consequências emocionais nos indivíduos. É importante ressaltar que a grande maioria das doenças raras são crônicas e que o tratamento disponível é vitalício", afirma.
Portanto, segundo ela, a interrupção desse tratamento pode significar o aparecimento de sequelas graves e irreversíveis, invalidando assim anos de tratamento prévio, com todo o desgaste físico e mental que implica para o paciente e seus cuidadores.
“Com isso, torna-se evidente que o atendimento aos pacientes com doenças raras não pode ser interrompido. Trata-se de uma comunidade caraterizada como vulnerável desde antes da pandemia atual. O sistema de saúde começou a fazer uso de determinadas estratégias, como a telemedicina, que foi de fato bem recebida pela comunidade. O atendimento em domicílio e o atendimento escalonado de pacientes também foi implementado, e essas estratégias garantem o acesso não somente ao atendimento como ao tratamento”, aponta.
A pesquisa, realizada com o intuito de entender como o cenário atual de pandemia está afetando a comunidade de doenças raras do Brasil, apresentou, também, dados relacionados ao comportamento dos pacientes com doenças raras frente à pandemia, bem como sobre o uso da telemedicina durante o isolamento social para manter o atendimento em dia. “Foi possível observar que a grande maioria dos participantes aderiram às medidas preventivas de isolamento social recomendadas."
De acordo com a especialista, mais de 90% deles não deixaram a residência a não ser para atividades essenciais, usando máscara. Uma proporção similar relatou sentir-se ameaçado pela pandemia. Em torno de 40% indicou sentir-se frequentemente incapaz de superar dificuldades, bem como isolado e deprimido.
Por outro lado, 70% dos participantes experimentaram alguma forma de telemedicina, e 68,3% de todos os participantes tiveram uma opinião positiva a respeito, indicando que se trata de uma boa opção para dar continuidade ao atendimento”, comenta a pesquisadora.
Por outro lado, 70% dos participantes experimentaram alguma forma de telemedicina, e 68,3% de todos os participantes tiveram uma opinião positiva a respeito, indicando que se trata de uma boa opção para dar continuidade ao atendimento”, comenta a pesquisadora.
INFORMAÇÃO
Os participantes das diferentes regiões do país responderam, ainda, sobre o acesso à informação em relação à pandemia de COVID-19 e a doença rara. Segundo os dados da pesquisa, cerca de 40% relataram ter acesso a materiais informativos sempre ou quase sempre. “Aparentemente, isso não necessariamente teve um efeito tranquilizador para a comunidade, já que sabemos que nem toda a informação que circula é acurada.”
“Adicionalmente, a pandemia teve e continua tendo um impacto negativo profundo na economia em nível global e, no nosso trabalho, uma grande proporção dos participantes (42,2%) relatou que não tem renda formal e este fato pode apontar para a necessidade de mecanismos de apoio socioeconômico direcionados a essas famílias, já que representa outro fator de vulnerabilidade para a comunidade. Assim, estratégias que possam mitigar os efeitos da pandemia COVID-19, em uma abordagem sindêmica, são necessárias”, afirma Ida Schwartz.
INFECÇÃO POR COVID-19
O estudo coletou dados, também, a respeito da contaminação de pacientes raros pela COVID-19. Os resultados finais apresentaram que 159 participantes foram testados para saber se havia uma infecção pelo novo coronavírus (12%), o dobro do índice da população brasileira no período do estudo – entre 1 de junho e 5 de julho de 2020. “Dezessete (1,2%) pacientes foram hospitalizados em decorrência da doença, o que reflete um valor similar à incidência desta doença para a população em geral. E apenas um precisou ser intubado.”
Não há dados referentes ao número de exames positivos neste grupo.
ASSISTÊNCIA
Em razão da maioria dos pacientes com doenças raras enquadrar-se no grupo de risco e temerem uma contaminação, muitos deixaram de ir aos centros para tratamento, conforme ilustrado pela pesquisa. Justamente por isso, algumas medidas alternativas podem ser boas opções neste período. É o caso da assistência prestada pela Casa Hunter.
“Logo após a Organização Mundial de Saúde (OMS) decretar o estado de pandemia do COVID-19, no dia 13 de março, iniciamos a articulação de medidas de emergência para apoiar os pacientes com doenças raras e seus familiares. A primeira medida criada foi o Plano de Contingência para os pacientes que realizam infusão em centros de tratamento. Essa ideia surgiu por conta das orientações das autoridades governamentais para evitar aglomerações e reduzir a disponibilidade dos transportes públicos.”
É o que conta Toni Daher, representante da Casa Hunter e da Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras (Febrararas).
“Já tínhamos um projeto chamado Day Hunter, que oferece atendimento multidisciplinar às pessoas com doenças raras. A ideia é oferecer em uma só consulta a presença do maior número de serviços possível aos pacientes, evitando deslocamentos desnecessários. E, com a suspensão de inúmeras atividades por conta da pandemia, optamos pelo oferecimento do serviço virtualmente. Os pacientes continuam com suas consultas pelo computador, adaptando sempre que possível as atividades oferecidas.”
Além disso, Toni Daher destaca que outros projetos seguem em ação para contribuir neste período, como o documento criado para gerar mais informações a respeito da COVID-19 e doenças raras, que segue disponível para acesso da população.
“Ainda, temos uma parceria entre a Casa Hunter e a Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras (Febrararas), o projeto ‘Perto de Você’. Uma vez por semana, especialistas e convidados respondem dúvidas sobre patologias raras e a COVID-19", diz.
“Ainda, temos uma parceria entre a Casa Hunter e a Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras (Febrararas), o projeto ‘Perto de Você’. Uma vez por semana, especialistas e convidados respondem dúvidas sobre patologias raras e a COVID-19", diz.
O QUE SÃO DOENÇAS RARAS?
“Doenças raras são, por definição, aquelas que afetam no mínimo 65 entre 100.000 indivíduos. No entanto, devemos considerar que no país existem mais de 12,5 milhões de pessoas que padecem alguma dessas condições. Elas podem ter origem genética, como as malformações congênitas e os erros inatos do metabolismo, e não genética, como as doenças inflamatórias, infecciosas e autoimunes”, explica a pesquisadora Ida Schwartz.
Quanto ao diagnóstico, a professora elucida que esse configura uma das maiores dificuldades para os portadores de doenças raras, haja vista a necessidade de um processo multidisciplinar que pode levar anos para ser concretizado. “É uma verdadeira ‘odisseia’. Isso em decorrência principalmente da raridade destas condições, mas existem outros fatores, como os sintomas, que podem variar de paciente a paciente e ser muito similar entre pacientes com a mesma condição.”
Ainda segundo Ida Schwartz, a sintomatologia é tão variada quanto o número de doenças raras existentes, podendo incluir manifestações cardíacas, respiratórias, hepáticas e neurológicas, dependendo da rota metabólica, o órgão ou o sistema que está sendo afetado.
Já o tratamento das doenças raras pode ser dividido em terapia farmacológica, nutricional e de reabilitação. No entanto, para a maioria dessas condições não existe tratamento definitivo, necessitando a sua realização de forma periódica e durante toda a vida do paciente.
Já o tratamento das doenças raras pode ser dividido em terapia farmacológica, nutricional e de reabilitação. No entanto, para a maioria dessas condições não existe tratamento definitivo, necessitando a sua realização de forma periódica e durante toda a vida do paciente.
CONSCIENTIZAÇÃO
Com o objetivo de dar visibilidade à condição vivenciada por pessoas com doenças raras, o Palácio da Inconfidência da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) estará iluminado de lilás, azul, verde e rosa, cores referentes à bandeira das doenças raras, a partir desta sexta-feira (26) até o dia 4 de março. A iluminação do Palácio da Inconfidência integra o projeto Laços da Consciência, da Assembleia, que reúne ações de sensibilização para temas relacionados ao bem-estar, em especial à saúde.
A iniciativa decorre da proximidade do Dia Mundial das Doenças Raras, celebrado em 70 países. A data oficial é 29 de fevereiro, por ser um dia raro, presente apenas nos anos bissextos. Nos demais anos, é antecipada para o dia 28.
*Estagiária sob a supervisão da editora Teresa Caram