Características genéticas podem fazer com que indivíduos sejam mais expostos à possibilidade de desenvolver a infecção pelo novo coronavírus. É o que demonstra pesquisa que teve participação de professores da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), a partir de amostras de 20 pacientes que faleceram devido à COVID-19 no Hospital Marcelino Champagnat, em Curitiba, entre abril e setembro de 2020.
Os casos foram comparados com pessoas contaminadas pelo H1N1 - foram 10 amostras de pessoas que morreram depois de contrair o vírus da gripe, colocadas em paralelo. Familiares e o Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) autorizaram a coleta.
Entraram também na compração dez pacientes controle, que não faleceram por questões respiratórias, e tiveram amostras analisadas.
"A gente estudou, especificamente, uma proteína chamada interleucina 17 (IL-17). Ela tem uma ação antiviral bem conhecida", declarou à Agência Brasil Lúcia de Noronha, professora da escola de medicina, integrante da equipe que coordenou o projeto. A médica informou sobre a existência de diversas publicações no mundo sobre a interleucina 17 (IL 17) no H1N1 e na Influenza.
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Hermes Pardini lança teste RT-PCR para detectar variantes do coronavírusCOVID-19: Pesquisadores da USP encontram novo coronavírus na gengivaCoronavírus: tudo o que você precisa saber sobre a vacinaPor exemplo, pacientes que apresentam as formas leves, ao lado de outros com mais gravidade, pessoas na mesma família que são contaminadas e outras não, outras assintomáticas e outras com sintomas severos.
"A gente já desconfiava de situações como essa, de pessoas que ficam junto a pessoas com COVID e não pegam, fazem a forma assintomática, e outras fazem a forma grave", diz Lúcia.
Mais um ponto de atenção é que, algumas vezes, uma família inteira pega a doença. "Isso aponta para um padrão genético que possa ter uma suscetibilidade. Fizemos, então, uma genotipagem por pontos específicos dentro do gene, que são chamados polimorfismos, e que podem estar presentes em algumas pessoas e em outras não. A surpresa foi que todos os 20 pacientes da COVID-19 tinham um tipo de polimorfismo que não aparecia nem no H1N1, nem no grupo controle. Isso pode estar mostrando que o polimorfismo pode estar deixando a pessoa mais suscetível à forma mais grave da doença", acrescenta Lúcia de Noronha, como consta no texto veiculado pela Agência Brasil.
De maneira geral, continua a professora, o polimorfismo induz a produção de uma proteína diferente. "Então, pode ser que ele produza uma proteína mais frágil, pouco funcional ou em menor ou maior quantidade. O polimorfismo muda a proteína. Nesse caso, parece que ele produz menos interleucina 17 e ela tem uma ação antiviral. Então, o paciente passa a perder essa ação", reforça a especialista.
Agora, a pesquisa foca a genotipagem de diversos outros tipos de interleucina, como a 4 e a 6. Lúcia de Noronha lembra que, na ausênsia de tratamento para prevenir ou para curar os pacientes da COVID-19, "a coisa mais efetiva do ponto de vista de saúde pública seria proteger os suscetíveis. É o que estamos fazendo. O idoso fica em casa, é vacinado antes, o que tem diabetes também é vacinado antes. Já sabemos quais são os suscetíveis pela idade ou pela comorbidade. O estudo genético acrescentaria mais um fator para a gente encontrar o suscetível", declarou.
Ainda que idosos e pessoas com comorbidades representem boa parte das mortes pelo coronavírus, isso não quer dizer que não há outros perfis mais vulneráveis quanto à doença - existem outras pessoas também suscetíveis.
"É o fator genético. Isso ajudaria na proteção aos suscetíveis". Ao mesmo tempo, isso ajudaria a identificar quem teria mais chance de ter uma COVID-19 grave. Um objetivo do estudo é entender que, além da comorbidade, mais um grupo da população poderia ter mais chance de desenvolver a infecção em sua forma mais grave.
E o teste genético é o meio pelo qual é possível aferir se o sujeito é mais suscetível ou não à COVID-19. É um teste simples, no qual a coleta de saliva é suficiente para fazer um exame genético no paciente, mas o único problema é seu valor elevado. Lúcia lembra que, no momento, isso impede a testagem em massa de pessoas, muito menos no Sistema Único de Saúde (SUS), "mas daria para entender que tem uma população suscetível".
O valor do teste genético pode chegar perto de R$ 1 mil. Lúcia pondera que, provavelmente, não é um gene só (da interleucina 17). Os pesquisadores vão testar outros genes. Eles esperam encontrar um perfil genético. "Um perfil que suscetibilize o paciente", a exemplo do que ocorre em testes para câncer de mama, para os quais os preços variam entre R$ 1,5 mil e R$ 14 mil para cada exame.
Intitulado "Lung Neutrophilic Recruitment and IL-8/IL-17A Tissue Expression in COVID-19", a pesquisa da PUCPR foi publicada na revista científica "Frontiers in Immunology", referência na área de imunologia. Além de pesquisadores da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, participaram do estudo profissionais da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e das Faculdades Pequeno Príncipe.