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Estado de Minas COVID-19

Comorbidade: conceito errado põe no fim da fila quem mais precisa da vacina

Epidemiologista da USP, Paulo Lotufo critica os critérios que vêm sendo adotados para definir os grupos de risco no processo de imunização contra a COVID-19


20/05/2021 17:04 - atualizado 20/05/2021 19:22

(foto: Narinder Nanu/AFP)
(foto: Narinder Nanu/AFP)

Uma definição incorreta sobre o que realmente significa comorbidade pode estar fazendo com que muitas pessoas sejam imunizadas contra o coronavírus sem que haja realmente um quadro de saúde que justifique a prioridade. O alerta é do epidemiologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) Paulo Lotufo.

Comorbidades, segundo ele, são relacionadas a doenças crônicas, situações que persistem ao longo da vida, diferentemente das doenças agudas, que duram apenas um intervalo de tempo.

Comorbidade é quando duas ou mais doenças estão relacionadas. A classificação "diagnóstica" ocorre quando as manifestações da doença associada forem similares às da doença primária; e comorbidade prognóstica ocorre quando existem doenças que predispõem o paciente a desenvolver outras doenças.

"Por exemplo, um fumante pesado que tem bronquite crônica e adquiriu problemas cardíacos. Ou como acontece com diabetes e depressão: pessoas deprimidas têm mais chance de ter diabetes, e diabéticos muitas vezes apresentam a depressão. São doenças que podem ter as causas diretamente relacionadas ou não", explica Paulo Lotufo.

O que vem sendo feito no enfrentamento da pandemia no Brasil, nas palavras do especialista, é "um erro crasso que terá consequências". "O correto é vacinar os setores com exposição constante e elevada e, não quem é hipertenso", postou o médico no Twitter.

Conforme Lotufo, se faz necessário que o critério de comorbidade, que ele considera esdrúxulo, seja redifinido para "doenças prévias graves".

São questões que vão além de uma simples confusão em relação a terminologias. Isso tem feito com que pessoas que não são dos grupos de risco passem na frente de outras, que precisam mais, na fila da vacinas.

"Uma coisa é apresentar um documento que comprova um tratamento de câncer, outra é utilizar uma receita de um hipertensivo, o que vem sendo aceito. Vêm sendo aceitas, inclusive, receitas médicas datadas de até dois anos atrás", constata.

"Será a insolvência do programa vacinal com uma demanda inflacionada por atestados e receituários verdadeiros, ou não, de hipertensão e doença cardíaca. Hipertensão nem é doença, é um fator de risco para outras", critica Paulo Lotufo.

Em sua opinião, um indivíduo que trabalha em um supermercado ou em uma padaria, mais exposto, e com um serviço considerado essencial, por exemplo, deveria estar entre as prioridades. "São fundamentais para a sociedade", acrescenta.

No caso de uma doença infecciosa aguda como a COVID-19, o epidemiologista diz que o termo não se aplica.

"Não se fala em comorbidade para uma doença aguda, é uma doença que acaba. A prioridade deve ser para indivíduos em situações de saúde que podem se agravar caso aconteça o contágio pelo coronavírus, como pacientes em tratamento oncológico ou transplantados, por exemplo. O raciocínio que está guiando a vacinação agora, quanto a isso, é um absurdo", pontua o professor.

A vacina, quando se pensa em comorbidade, deve ser orientada para quem pode ter uma sobrevida melhor com ela, priorizando casos em que a COVID altera menos a história natural da doença. "Não é porque a pessoa é cardíaca que tem mais chance de ter a COVID-19. Se tiver tido um infarto, com a COVID a chance de sobrevida é menor. Está invertido", conclui Paulo Lotufo.


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