“To touch can be to give life”, em tradução livre, “tocar pode ser dar vida”. A frase é de Michelangelo, pintor, escultor, poeta, anatomista e arquiteto italiano, considerado um dos maiores criadores da história da arte do Ocidente. Não se sabe o que ele estava imaginando ao dizer a frase, mas certamente o toque é um sentido poderoso, tão poderoso que pode curar.
Mas muitas pessoas não gostam, não se dão o direito, não se sentem confortáveis com o toque. Você é do tipo que faz de tudo para evitar um abraço? Não gosta muito do contato físico? Prefere mantar distância do carinho mais íntimo com outra pessoa? Se sente desconcertado com a proximidade entre os corpos?
A pessoa evita carícias, beijos, preliminares, tudo relacionado ao jogo da sedução, do contato íntimo com o outro (e não só amoroso, sexual). Para quem sofre desta fobia é impensável se envolver com alguém.
A origem pode estar em várias fases da vida, mas profissionais da saúde constatam que crianças cercadas pela falta de toques físicos podem crescer com a necessidade de suprir essa carência e, portanto, são mais propensas a querer abraçar. Ou a atitude dos pais pode ser reproduzida durante toda a vida e repassada às gerações criando um distanciamento.
Sabe-se também que a falta de contato nas primeiras fases da vida atrapalha o desenvolvimento do nervo vago – feixe de nervos que vai da medula espinhal até o abdômen –, diminuindo a capacidade de os indivíduos criarem laços de intimidade e de compaixão em relação aos outros.
Sabe-se também que a falta de contato nas primeiras fases da vida atrapalha o desenvolvimento do nervo vago – feixe de nervos que vai da medula espinhal até o abdômen –, diminuindo a capacidade de os indivíduos criarem laços de intimidade e de compaixão em relação aos outros.
COMPONENTE CULTURAL
Ninguém deve se sentir obrigado a aceitar o contato físico apenas para atender convenções sociais. Há, inclusive, um componente cultural. Em países como Coreia do Sul, EUA e Inglaterra as pessoas tocam e abraçam menos umas às outras do que em lugares como Brasil ou Itália. Os latinos são mais calorosos que os nórdicos, por exemplo.
A aceitação do toque com o outro também é questão de personalidade. Há pessoas mais expansivas e abertas ao contato, outras mais retraídas, não gostam de tanta proximidade. O que não é uma questão de saúde, mas do jeito de ser.
A aceitação do toque com o outro também é questão de personalidade. Há pessoas mais expansivas e abertas ao contato, outras mais retraídas, não gostam de tanta proximidade. O que não é uma questão de saúde, mas do jeito de ser.
Hoje me sinto um pouco mais confortável, mas antes era muito difícil. Eu me sentia inadequada e tinha medo de me envolver e perder isso depois
M. T. F., de 35 anos, analista de sistemas
A psicóloga especialista em terapia cognitivo-comportamental Renata Borja explica que a malaxofobia refere-se a um medo excessivo de se envolver e manter-se num relacionamento afetivo. É uma fobia que causa grande sofrimento, já que existe um desejo de criar intimidade emocional com o outro, mas o medo excessivo faz com que a pessoa se esquive, como estratégia de se manter “seguro”.
É um medo irracional de trocar carinho, afeto, de ir a um encontro amoroso ou até mesmo de marcar esse encontro. “Os sintomas são os mesmos de uma crise de ansiedade: aceleração cardíaca, respiração curta, tensão muscular, sudorese, dores no corpo, diarreia, vontade de urinar e tonturas.”
É um medo irracional de trocar carinho, afeto, de ir a um encontro amoroso ou até mesmo de marcar esse encontro. “Os sintomas são os mesmos de uma crise de ansiedade: aceleração cardíaca, respiração curta, tensão muscular, sudorese, dores no corpo, diarreia, vontade de urinar e tonturas.”
M. T. F., de 35 anos, analista de sistemas, assegura que não tem malaxofobia. No entanto, revela que tem muito receio em abrir sua vida para as pessoas, por medo de se sentir ridícula e não ser aceita. “Tenho poucos amigos e não consigo fazer novas amizades. É muito difícil eu falar de relações amorosas, geralmente guardo só para mim e não divido com as pessoas.” Para M.T.F., lidar com carícias, beijos, abraços já foi um problema. “Hoje me sinto um pouco mais confortável, mas antes era muito difícil. Eu me sentia inadequada e tinha medo de me envolver e perder isso depois.”
ABANDONO
E quanto a gostar de criar laços de intimidade? Seja amorosos, com amigos, irmãos, pais, familiares? “Gostar não acho que seja a palavra. Hoje me acostumei com isso e percebi que é necessário para me sentir um pouco mais confortável nas relações e lidar com as pessoas. Mas desde pequena sempre fui mais fechada. E me incomoda a cobrança externa de querer que eu seja expansiva a todo custo. Nem todo mundo é assim. Para mim é muito difícil. E quando encontro pessoas que respeitam essa distância, me sinto minimamente segura”, diz M.T. F..
Com a pandemia e o distanciamento social, o momento, ao menos, é de menos cobrança e pressão para ser o que não é. M.T.F destaca que nunca foi de abraçar muito, e “com a pandemia, só de pensar em tocar as pessoas fico com medo por causa do perigo de contágio. Sei que eu me fechei mais. Mantive um contato maior por telefone só com duas amigas. Mas não sei se vou sair de casa tão cedo. Tenho medo de encontrar as pessoas.”
A troca de beijos, carícias e fricções pode originar um grande sentimento de angústia e mal-estar nas pessoas que sofrem dessa fobia. O que é um impedimento para fortalecer a intimidade dos relacionamentos e a construção de laços afetivos. Estas pessoas experimentam sentimentos elevados de ansiedade quando expostas a situações relacionadas ao jogo do amor
Patrícia Campos Christo, psicóloga clínica
Com seu modo de levar a vida, M.T.F diz que se cobra muito de ter que dar certo em uma relação e de ser mais aberta, mas, ao mesmo tempo, tem medo de criar um vínculo por receio do abandono.
“Isso me prejudica, pois sempre acabo sendo o problema das relações. Minhas poucas tentativas de namoro não deram certo por minha causa. Nunca acho que sou o suficiente e sempre estou na defensiva. Pensar em paquerar ou construir algo com alguém me gera muita ansiedade e um medo que não sei muito bem de onde vem.”
“Isso me prejudica, pois sempre acabo sendo o problema das relações. Minhas poucas tentativas de namoro não deram certo por minha causa. Nunca acho que sou o suficiente e sempre estou na defensiva. Pensar em paquerar ou construir algo com alguém me gera muita ansiedade e um medo que não sei muito bem de onde vem.”
“A troca de beijos, carícias e fricções pode originar um grande sentimento de angústia e mal-estar nas pessoas que sofrem dessa fobia. O que é um impedimento para fortalecer a intimidade dos relacionamentos e a construção de laços afetivos. Estas pessoas experimentam sentimentos elevados de ansiedade quando expostas a situações relacionadas ao jogo do amor. Mas é uma desordem rara na população”, diz.
PROCURAR POR AJUDA
Para Patrícia Campos Christo, é possível observar o surgimento de crenças irracionais muito fortes, com pensamentos caracterizados por um medo intenso, quase delirante do jogo do amor, incapacidade de agir coerentemente em situações que a pessoa se encontra envolvida, medo do ridículo, falta de confiança e de autoestima.
As pessoas que sofrem de malaxofobia desenvolvem aversão à sedução e aumento da insegurança. Ao sentir a ansiedade aumentada nas situações de sedução, ela passará a evitá-las e buscará escapar das relações que envolvem pessoas sexualmente atraentes.
As pessoas que sofrem de malaxofobia desenvolvem aversão à sedução e aumento da insegurança. Ao sentir a ansiedade aumentada nas situações de sedução, ela passará a evitá-las e buscará escapar das relações que envolvem pessoas sexualmente atraentes.
A verdade é que quem sofre precisa dar o primeiro passo e buscar ajuda porque dar e receber amor é dádiva da vida e todos deveriam desfrutar deste encontro repleto de sentimentos, emoções, carinho, felicidade, prazeres e catarse.