Ombros encolhidos, cabeça afundada, pernas pesadas, pele seca, vista cansada, compulsão alimentar. Angústia, irritação, impaciência. Corpos ansiosos, corpos que se arrastam pela pandemia. Subprodutos de meses de confinamento e teletrabalho que começam a chegar aos consultórios de fisioterapeutas, psiquiatras, traumatologistas, oftalmologistas.
Incertezas que tensionam cada músculo, gorduras aumentadas em locais pouco habituais, acúmulos que se refletem em noites em claro. Para os que tentaram se exercitar dentro de casa, espaços não muito propícios e falta de orientação. Com câmeras à frente em reuniões on-line, o rosto em evidência revela uma nova flacidez, olheiras e rugas, um processo de envelhecimento prematuro.
Toda mudança física tem consequências mentais, e parece que tudo está de cabeça para baixo. Estudo do grupo Open Evidence, da Universidade Aberta da Catalunha, lembra que, para quem sentiu que envelheceu uma década repentinamente, um alívio pode ser saber que não é o único. Cerca de 2,9 bilhões de pessoas, mais de um terço da população mundial, estão nesse barco. A boa notícia é que o corpo tem memória e, com perseverança e esforço, é possível voltar ao ponto antes da pandemia.
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COVID-19: confinamento deixa marcas no corpo e na almaConsequências da pandemia são percebidas no aumento de outras doenças Liberdade perdida, um grande problema do mundo pós-pandemiaBrasileiros criam algoritmo capaz de detectar a COVID-19 pela voz ou tosse Saudáveis? Alguns alimentos podem detonar um dia de dieta e exercíciosPara Alessandra, são questões que impactaram sua rotina de trabalho e a vida em geral. "Sou uma pessoa que mantém um bom convívio social, tanto na esfera pessoal como profissional, e foi muito difícil para mim lidar com o isolamento. Sou muito dinâmica, a mil por hora. Precisei começar a monitorar minha saúde e meus sentimentos", diz.
Entre as soluções que encontrou para enfrentar esse momento em particular, começou a prática de meditação e ioga, atividades que nunca estiveram entre as suas prediletas. "Pude fazer coisas que antes da pandemia não tinha tempo para fazer, e nesse ponto foi algo positivo. Aprendi a exercitar a paciência, e a não fazer tudo tão corrido. Muita gente pode achar que a doença é uma coisa tranquila, mas no meu caso me afetou muito", continua Alessandra, que está em tratamento médico para ganho de massa muscular.
NA PELE
"A pandemia também refletiu na saúde de nossa pele", alerta o dermatologista Lucas Miranda, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia. Ele explica que o isolamento é responsável pelo aumento de algumas doenças dermatológicas relacionadas ao estado psicológico, como dermatite seborreica, dermatite atópica e psoríase e outros tipos de problema, como envelhecimento precoce, herpes, aumento da acne e a queda de cabelo.
"Como tudo ainda é muito recente, não há estudos que comprovem o aumento dessas patologias em relação direta ao coronavírus. Mas é de conhecimento que essas doenças se agravam quando o organismo está em situações de estresse emocional. Uma das explicações para isso é que a pele e o cérebro têm sua origem embriológica em comum", esclarece.
Tanto a dermatite seborreica quanto a rosácea não têm cura, mas têm tratamento, continua o médico. Uma das formas de prevenção, pontua, é saber lidar com o estresse, como, por exemplo, mantendo uma alimentação equilibrada, a prática de atividades físicas, meditação, ioga, momentos dedicados ao lazer e às atividades que promovam o bem-estar.
“No caso da acne, quando estamos em situações de estresse nosso corpo produz corticotropina, responsável por alterar os índices de cortisol no organismo. Essa alteração age diretamente nas glândulas sebáceas, fazendo com que produzam mais sebo, obstruindo os poros e gerando inflamação. Além disso, o estresse diminui nossa imunidade e desequilibra as células de defesa do nosso corpo", cita.
Lucas ressalta que a queda de cabelo é outra queixa importante nos consultórios dermatológicos. "O estresse causado pela pandemia atingiu em cheio nossos fios. Com relação ao envelhecimento da pele, a privação do sono, a alimentação inadequada, a falta de exercícios físicos e da ingestão mínima diária de água, hábitos relatados por grande parcela da população, afetam negativamente nossa aparência", pondera.
O médico lembra estudos que, inclusive, demonstram como o estresse aumenta os níveis de cortisol e inibem a produção de colágeno e ácido hialurônico da pele, além de causar interrupções no funcionamento adequado da barreira cutânea, fazendo com que perca mais água. O resultado é uma pele sem brilho, ressacada e mais velha. "A vantagem é que, apesar de todos os males que a pandemia e o isolamento trouxeram para a saúde de nossa pele e para o organismo como um todo, baixar os níveis de exaustão e a mudança de alguns hábitos diários podem, sim, restaurá-los", ensina.
A primeira dica é ir a um médico dermatologista para saber como o corpo reagiu a esse período e o que é indicado. "Há tratamentos eficazes que conseguem estimular a produção de colágeno e melhorar o aspecto envelhecido da derme e dos cabelos. Esse cuidado tem de ser completo: mental e físico", continua o dermatologista.