Os brasileiros ainda convivem com medo e angústia diante da pandemia de COVID-19 e seus efeitos, a despeito do avanço da vacinação. Assim como a mente o corpo sofre. A pele pode apresentar manifestações que tendem a afetar a qualidade de vida das pessoas. Pouco se sabe é que o emocional tem relação com aquilo que a pele manifesta.
A dermatologista Ana Vitória Perecini explica que cérebro e pele têm a mesma origem na formação dos indivíduos como embriões, o que implica complexa interação e conexão entre os sistemas neuroendócrino e imunológico. “Isso significa que a pele reage a hormônios, como a adrenalina e o cortisol, produzidos em maior escala durante situações de estresse. O excesso desses hormônios afeta também o sistema imunológico e deixa o organismo mais exposto a problemas dermatológicos diversos”, afirma.
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Saiba como combater os indesejados 'furinhos' da pele Pele saudável em qualquer estaçãoCOVID-19: pesquisa analisará potencial do ômega 3 para reduzir inflamação Acordou com a pele 'exausta'? Veja o que fazerComo recuperar olfato e paladar após a COVID-19COVID-19 causa lesões graves e até irreversíveis nas cordas vocaisCarla Purcino teve sintomas semelhantes aos de disidrose, doença caracterizada pela formação de pequenas bolhas de líquido nas palmas das mãos, nos dedos e na sola dos pés. Porém, não confirmou o diagnóstico. “As bolhas vieram e foram embora pelo próprio sistema imunológico agindo. Além disso, meu pai foi internado com uma pancreatite no fim de maio e teve complicações. Muitas. E eu acabei desenvolvendo uma coceira na perna direita, que evoluiu para sangramentos. Contou também o fato de que usei, para tentar evitar uma ida ao consultório, uma pomada que piorou o quadro.”
Além do aparecimento de doenças na pele, o desequilíbrio emocional pode piorar quadros dermatológicos já existentes, como vitiligo, psoríase, acne, dermatites, alopécia areata, neurodermatite, tricotilomania e dermatite artefacta, menciona a dermatologista Marcela Loschi. Essas manifestações, seja pela primeira vez ou como agravamento, têm características bem definidas, como acrescenta Aline Okita, dermatologista da Academia da Pele.
“A urticária crônica espontânea, por exemplo, está associada a lesões avermelhadas com aspecto inchado que aparecem na pele em diversos locais e causam coceira. O estresse pode exacerbar os sintomas, mas não é a única causa da patologia. Seu tratamento deve ser orientado por dermatologista ou imunologista e pode envolver o uso de anti-histamínicos e até imunobiológicos. Enquanto isso, a dermatite atópica é uma doença inflamatória crônica que causa coceira, manchas vermelhas e descamação em pele seca. Pode estar relacionada a outras doenças como bronquite e rinite, e o estresse emocional pode ser um gatilho.”
De acordo com Aline Okita, a dermatite seborreica, popularmente conhecida como caspa, também pode acometer outros locais do corpo além do couro cabeludo, como as laterais do nariz e as sobrancelhas. Ela provoca coceiras e vermelhidão no local, formando casquinhas, e também pode piorar no inverno. A psoríase é uma doença inflamatória crônica causada por uma combinação de fatores genéticos e ambientais, e se agrava com o estresse.
A principal característica da psoríase são placas vermelhas e descamativas que ocorrem, em geral, na região do couro cabeludo, joelhos e cotovelos, podendo acometer unhas, palmas e plantas, genitais e axilas. O vitiligo, por sua vez, provoca manchas brancas e piora quando o paciente está estressado. As áreas mais acometidas são mãos, face e região genital.
Danos
As consequências das doenças da pele, agravadas pelo estresse, podem perdurar. “Algumas doenças de pele podem causar danos sistêmicos permanentes. Um bom exemplo é a psoríase, que pode estar associada a doença inflamatória intestinal e artrite deformante de diversas articulações. O uso de medicamentos fortes para o tratamento de doenças inflamatórias e autoimunes traz consequências sérias ao organismo, como diabetes, glaucoma, colesterol alto e obesidade”, afirma Nádia Bavoso, dermatologista, participante da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) e sócia da Clínica Eveline Bartels.
Além dos danos físicos e alterações visíveis em pele e cabelos, as psicodermatoses desencadeiam outros problemas emocionais, que incluem vergonha, distorção da imagem corporal e baixa autoestima. “Os pacientes também enfrentam preconceito devido à desinformação da sociedade quanto às lesões aparentes de pele”, pontua a dermatologista Ana Vitória Perecini.
Ela observa que o impacto psicossocial depende de uma série de fatores, entre eles a história natural da doença, características demográficas do paciente e traços de personalidade. Junto a eles, contribuem os desafios que surgem durante a vida, o significado da doença na família e para o paciente. As manifestações e danos, segundo a especialista, ocorrem em graus diferentes, caso a caso. Por isso, Vitória Perecini defende a necessidade de abordagem biopsicossocial do problema em pacientes, para que o tratamento seja eficaz.
Como se tratar
Vitória Perecini alerta que não se deve tentar tratar as manifestações das doenças de pele por conta própria, mas, sim, procurar um dermatologista para avaliar as alterações e o apoio psicológico ou psiquiátrico. “Também é muito importante tentar manter as emoções mais equilibradas e investir em hábitos saudáveis de vida que possam reduzir o estresse e a ansiedade, tais como prática de atividades físicas e meditação, ter um bom sono, se alimentar bem e ocupar a cabeça com atividades que causem prazer.”
Além disso, Nádia Bavoso destaca que, se houver diagnóstico precoce é possível tratar apenas com o uso de pomadas. “Entretanto, quando essas doenças se agravam é comum o uso de medicamentos imunomoduladores ou imunossupressores fortes, como corticoide sistêmico. Nenhum desses medicamentos é inofensivo, e eles trazem problemas e efeitos colaterais. É interessante, portanto, que o paciente já busque tratamento logo no início dos sintomas”, afirma.
Quando o paciente desenvolve depressão ou estresse pós-traumático, o dermatologista pode recomendar a ajuda de um psiquiatra. A jornalista Yara Simões, de 38, teve crises de ansiedade e manifestações cutâneas em decorrência dos efeitos da pandemia de COVID-19. “Fiz isolamento desde o começo, mas em setembro do ano passado precisei fazer exames urgentes, já que tive uma lesão no ombro e perdi o movimento do braço direito, com dores muito intensas. Foi, então, que peguei COVID-19 e fiquei internada. E o pós-COVID me trouxe muitas mudanças de rotina e no corpo como um todo: insônia, fraqueza, perda de memória, dores crônicas e, há cerca de três meses, muitas coceiras na pele com vermelhidão.”
Yara Simões observa piora nos sintomas nos períodos em que dorme mal ou fica irritada e ansiosa. Para amenizá-los, ela tem mantido a pele bem hidratada, reforça o consumo de água, e faz acupuntura associada à terapia. “Tenho mantido uma rotina mais ativa. E, quando percebo que estou mais agitada, mudo o foco para algo que me relaxe, assim evito a ‘onda’ de coceiras, que são desagradáveis”, afirma.
PRECAUÇÃO
- Beber muita água: somos formados por 70% de água e a pele, sendo o maior órgão no corpo, sua necessidade de hidratação é ainda maior. Uma pele bem hidratada ajuda a não agravar algumas manifestações
- Hidrate bem a pele: mantenha a pele bem hidratada com cremes específicos para corpo e rosto, e isso vale para os homens também. Tão importante quanto beber água é manter hidratada a parte mais externa do corpo
- Use protetor solar todos os dias: mesmo em dias sem sol aparente, não se esqueça do protetor solar. Priorize as regiões mais expostas à luz natural, artificial e ao frio. O protetor solar é a única forma de prevenção do câncer de pele, um dos mais comuns no Brasil
- Durma bem: a qualidade do sono é fundamental para manter o funcionamento do corpo equilibrado e evitar uma baixa de imunidade
- Faça atividades que tragam a você alívio mental e físico: pode ser caminhada, leitura, cozinhar, assistir a um filme. O importante é buscar um momento de desconexão dos problemas
Fonte: Aline Okita, dermatologista da Academia da Pele