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Estado de Minas

Conforto e atenção para pacientes e familiares

Diferentemente do que muitos pensam, cuidados paliativos ajudam a minimizar o sofrimento e melhorar a qualidade de vida de quem enfrenta uma doença incurável


31/10/2021 04:00 - atualizado 30/10/2021 23:01



A palavra paliativo vem do verbo paliar. É derivada do latim pallium, que quer dizer manto. Assim, palliare significa “cobrir com um manto”. Na origem, a palavra fala sobre oferecer abrigo, e é exatamente esse o sentido dos cuidados paliativos: trazer conforto, minimizar o sofrimento, dividir, ofertar algo que é seu para o outro. São cuidados prestados ao paciente e familiares que receberam a notícia de uma doença grave, incurável, e que acarretará perdas físicas progressivas até o falecimento, o que não se limita a pacientes oncológicos, por exemplo.
 
 
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(foto: Pascal POCHARD-CASABIANCA/AFP)
 
"Para quem não sabe, os cuidados paliativos são uma abordagem que visa melhorar a qualidade de vida dos pacientes e familiares que enfrentam problemas associados com doenças ameaçadoras à vida. Busca-se a prevenção e o alívio do sofrimento por meio da identificação precoce e tratamento impecável da dor e de outros problemas físicos, psicológicos, psicossociais e espirituais", explica a médica oncologista Carolina Vieira.

Uma grande parcela da população sofre com muitos tipos de patologias consideradas graves, incuráveis ou que também ameaçam a vida, como as neurodegenerativas, cardiológicas graves e tantas outras doenças crônicas. Todos que recebem diagnósticos desse tipo podem se beneficiar dos cuidados paliativos.

VISÃO EQUIVOCADA 

Durante muitos anos, os cuidados paliativos foram vistos de forma equivocada, associados à fase terminal de pacientes oncológicos e doentes graves, quase como uma forma de negligência diante da doença para aguardar a morte chegar mais rápido. Apesar do avanço da informação, um episódio ocorrido em setembro, durante a CPI da COVID-19, mostrou o quanto a prática ainda é envolta em ignorância e desconhecimento.

O senador Otto Alencar (PSD-BA) afirmou que uma operadora de saúde, que estava sendo investigada, teria criado a figura do "paliativista", referindo-se à especialidade, erroneamente, como se fosse algo novo e oriundo de uma suposta prática de negação de atendimento a pacientes graves da infecção pelo coronavírus. Em outras reuniões que se seguiram, membros da CPI e alguns dos depoentes também chegaram a dizer que cuidados paliativos só são ofertados à beira da morte e que a prática é similar à eutanásia.

Segundo a médica geriatra Simone de Paula Pessoa Lima, que atua em cuidados paliativos na empresa mineira especializada em atenção domiciliar Saúde no Lar, independentemente do tempo de vida do paciente, o objetivo é aliviar o sofrimento, tratar a dor e sintomas físicos, sociais e psicológicos. “Há muito o que pode ser feito pela pessoa diagnosticada, e não pela doença em si. Até porque, mesmo uma patologia crônica e incurável pode demorar a evoluir. Todo o processo de cuidados faz com que a qualidade de vida seja a melhor possível dentro das possibilidades existentes”, esclarece.
 
 
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(foto: Arquivo Pessoal)


Busca-se a prevenção e o alívio do sofrimento por meio da identificação precoce e tratamento impecável da dor e de outros problemas físicos, psicológicos, psicossociais e espirituais”


Carolina Vieira, médica oncologista
 
 
 
É o caso da dona Maria, de 98 anos, avó de Josielle Barbosa, de 36, técnica de enfermagem. A senhora está sob cuidados paliativos desde dezembro de 2016. A família preferiu não identificá-la. “Minha avó é portadora de Alzheimer desde antes de 2005. A doença evoluiu muito e, em 2014, ela quebrou o fêmur. Isso fez com que o quadro piorasse ainda mais. Em dezembro de 2016, foi internada com uma broncopneumonia e os médicos estavam na dúvida se deveriam intubá-la ou levá-la para o CTI.”

A família de Josielle sabia que a intubação não melhoraria nem faria regredir a doença neurodegenerativa, mas deixaram que os médicos decidissem o que era melhor para Maria. “Como ela já era acompanhada por geriatra, o especialista entrou em contato e acordo com o geriatra do hospital onde ela estava internada e optaram por mantê-la sob os cuidados paliativos”, diz.

Em um primeiro momento, Maria foi levada para o quarto para a administração da medicação, visando ao seu conforto, e, apesar do quadro crítico, com o tempo apresentou melhora. Quando teve alta do hospital, começou a receber o atendimento e cuidados paliativos em casa. “Contamos com o suporte de toda uma estrutura. Além de equipe médica, fisioterapeuta, enfermeiros e fonoaudiólogos. Esse acompanhamento é feito até hoje. Tanto é que, apesar de algumas internações em hospital durante esses anos, foram relativamente poucas, exatamente por conta desses cuidados."
 
 
 Há muito o que pode ser feito pela pessoa, e não pela doença em si. Até porque, mesmo uma patologia crônica e incurável pode demorar a evoluir. Todo o processo de cuidados faz com que a qualidade de vida seja a melhor possível dentro das possibilidades existentes”


Simone de Paula Pessoa Lima, médica geriatra

 
 
VIVÊNCIAS E DESAFIOS 

A coordenadora de enfermagem da Saúde no Lar, Juliana Ferreira das Neves Dantas, conta que, para que tudo aconteça da melhor forma, existe uma equipe de enfermagem responsável por esse cuidado. O direcionamento é por entender as vivências e desafios enfrentados pelo paciente, com o objetivo de elaborar as intervenções junto a outros profissionais de saúde, de maneira sistêmica. “Os enfermeiros atuam dando suporte técnico. Eles são o elo da equipe multidisciplinar e identificam situações de possível tratamento para redução da dor, ofertando conforto ao paciente.”

Porém, mais que atentar ao paciente, é fundamental abraçar e envolver também os familiares. Afinal, há um sofrimento geral ocasionado pelo diagnóstico em si, pela progressão da enfermidade e também pela possibilidade da perda. “É por isso que os cuidados paliativos englobam essa equipe multidisciplinar, composta por inúmeros profissionais da área da saúde e quantas outras especialidades o doente e entes queridos demandarem para esse apoio”, ressalta Simone.

Uma doença incurável muitas vezes vai evoluir para uma fase de dependência e necessitará de mais cuidados. O responsável por essa dedicação, por mais que exista um cuidador, tende a ser um membro da família. “Amparar o familiar é fundamental para que ele possa cuidar do paciente de forma adequada e para que esteja melhor preparado para o que vai acontecer”, complementa.

Segundo Juliana, o tipo de atenção diária varia de caso para caso, porque vai de acordo com o grau de dependência em que o paciente se encontra naquele determinado momento. Mas o foco é o conforto e alívio dos sintomas, independentemente da doença. “Esse cuidado não tem tempo determinado. Pode durar dias, meses ou anos, sempre com o intuito de controlar a dor, melhorar a qualidade de vida e trazer harmonia emocional e psicológica ao paciente e seus familiares”, explica.

Assim, diferentemente do que pode ser considerado, os cuidados paliativos não adiam nem antecipam a morte. Muito menos promovem a eutanásia. O termo mais adequado seria a ortotanásia, que trata os sintomas para que o falecimento aconteça no tempo natural, da melhor forma possível, com o mínimo de desconforto e sofrimento, proporcionando ao paciente uma morte digna, sem prolongá-la ou abreviá-la.





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