A clean beauty, ou beleza sustentável, conquistou definitivamente seu espaço na indústria cosmética. A cada dia, mais marcas e consumidores investem em produtos que sigam o conceito. Mas o que determina se um item ou conduta se encaixa ou não nessa definição?
A beleza sustentável tem diversos aspectos, mas, via de regra, é definida por produtos que não façam mal ao meio ambiente ou ao nosso organismo. Porém, a ideia ampla permite diferentes concepções. Pessoas veganas, por exemplo, podem defender que um produto é maléfico ao planeta se testa em animais ou utiliza derivados deles em sua composição.
Outra visão se refere ao descarte. Uma empresa pode trazer produtos veganos e livres de crueldade ou testes em animais, mas ter embalagens com plástico em excesso e não contar com um programa de descarte ou refil, por exemplo.
Dentro dessa série de pontos de vista, um aspecto importante é não desistir de focar em um aspecto, caso o outro não esteja presente. Para os adeptos da clean beauty, se possível, dentro da sua realidade, invista em produtos e práticas que envolvam diversos aspectos.
Se seu bolso ou suas necessidades não permitem a escolha de um produto vegano, cruelty free, com descarte responsável, uso de refil e embalagens recicladas e utilização de matérias-primas dentro de um contexto socioambiental sustentável, opte por pelo menos uma dessas opções e dê um passo de cada vez. "Não é porque você não pode fazer tudo que vai fazer nada. O pouco que cada pessoa pode fazer tem um impacto enorme e faz uma grande diferença", defende a maquiadora Gabriela de Araújo Britto, de 33 anos.
ESCOLHA SUAS BATALHAS
Vegana há sete anos, Gabriela, que já trabalhava com maquiagem, começou a fazer uma transição dos cosméticos que usava e, ali, descobriu o mundo da beleza sustentável. O processo começou na vida pessoal e, conforme estudava, Gabriela passou também a fazer substituições na maleta profissional. "É preciso ir testando e conhecendo, até para saber o que vai funcionar para minhas clientes, que podem ter necessidades e gostos diferentes dos meus. Mas eu vi que tem muita coisa que é possível trocar sem nenhum prejuízo ou mudança no resultado final", garante.
Além de escolher cosméticos veganos, a maquiadora começou a dar preferência a fórmulas mais naturais, com menos ativos químicos e sintéticos, além dos itens que têm embalagens recicláveis e políticas de devolução nas próprias lojas. Para Gabriela, na hora de escolher o que comprar, é importante analisar, além da composição de cada cosmético, a responsabilidade socioambiental da empresa. "Existem muitas marcas que se preocupam com o meio ambiente, mas não com os seres humanos, associando-se a trabalho escravo ou à exploração de comunidades, por exemplo."
Para Gabriela, a falta de acesso não se determina somente pela questão financeira, mas pelo conhecimento, pela facilidade de encontrar esse ou aquele produto perto de você e até mesmo de ter tempo para pensar nisso. "Uma reflexão é pensar que aquela pessoa que trabalha o dia todo, passa três horas dentro de um ônibus, mal tem tempo para si e quer se sentir bonita, você vai julgá-la por comprar um batom na loja que está mais perto dela? Vai duvidar do amor dela pelo seu animal de estimação por não usar um produto vegano? ", questiona.
OUVIR OS PACIENTES
Em julho deste ano, a partir da experiência na formulação de cosméticos personalizados, a dermatologista Daniele Balbi fundou a Noviole. O nome vem do conceito da empresa, "não viole" o planeta, os animais e seu corpo. Os biocosméticos funcionais, veganos, cruelty free e dentro do conceito de clean beauty, livre de ativos tóxicos para o organismo e para o planeta, surgiram quando a médica passou a ouvir ainda mais os pacientes.
"A partir da necessidade de alguns deles, eu criava dermocosméticos personalizados e manipulados. Levava em conta tanto as particularidades daquela pele quanto os princípios dos pacientes veganos, por exemplo", conta Daniele. Depois de alguns anos, surgiu a ideia de criar a Noviole e seguir os princípios de uma beleza responsável com o consumidor e com o planeta. Daniele acredita que já não é possível viver sem considerar o impacto que temos no mundo.
Para ela, sendo o setor de cosméticos e beleza um dos que cresceu durante a pandemia, é importante que percebamos o impacto que ele tem no mundo, como um todo. E tomar atitudes para que esse impacto se torne mais positivo do que negativo. "Tudo o que fazemos no planeta volta para nós de alguma forma. É possível cuidar do meio ambiente sem abrir mão dos resultados de um cosmético eficaz", acredita a dermatologista.
Com o desejo de empreender e, ao mesmo tempo, fazer sua parte para viver em um mundo mais saudável, Daniele optou por "atacar" em diversas frentes. Os dermocosméticos da Noviole, além de veganos, cruelty free e clean beauty, não têm embalagens secundárias, apenas o próprio frasco. As informações e composição, quando não cabem no frasco, são inseridas em rótulos-bula. Os cinco produtos disponíveis, focados no skincare, são multifuncionais, diminuindo o consumo de embalagens.
Daniele também optou por valorizar e priorizar a biodiversidade brasileira e usar elementos encontrados em nossos frutos, plantas e elementos. "Temos o que o mundo todo quer em termos de biodiversidade. É é importante enxergarmos esse potencial e usar em nosso favor, ao mesmo tempo em que investimos em políticas de extração sustentáveis e que favoreçam as comunidades locais."
VISÃO GLOBAL
Para a empreendedora Juliana Arneitz Ferrari, de 34 anos, a clean beauty vai além dos produtos de beleza. Em sua vivência de uma beleza sustentável, ela leva em consideração o uso de todo tipo de cosméticos, inclusive os de higiene pessoal.
Vegana, ela ressalta que é preciso cuidado com a forma como o veganismo é usado nesse conceito. "A clean beauty não é uma prerrogativa exclusiva ou necessariamente 100% vegana. E vegano também não pode ser visto como saudável só por isso. Existem diversos produtos vegan com uma infinidade de química, por exemplo", chama a atenção.
Juliana ressalta a importância de enxergar o mundo como um todo na hora de fazer as próprias escolhas. Além do âmbito particular, ela vê a importância de as empresas atentarem ao que estão fazendo – se estão modificando um aspecto de um produto com foco em um nicho de mercado, buscando o lucro, ou se realmente têm aquela causa como princípio.
"Encomendei escovas de dente de bambu para diminuir o descarte de plástico, e elas vieram embaladas em plástico. Não faz o menor sentido. Daí surge a importância de enxergar e avaliar o impacto de um produto como um todo. Até mesmo a emissão de carbono do transporte", comenta.
Em um mercado que cria cada vez mais necessidades, Juliana defende produtos multifuncionais. Assim como o uso de refis é bom para o bolso do consumidor e diminui a produção de lixo. Juliana também acredita que o conceito de clean beauty deve englobar uma beleza inclusiva, não só para quem consome, mas também para quem produz e trabalha em qualquer lugar dessa cadeia de produção.
Para começar
» Vá aos poucos. Não é necessário, nem sustentável jogar fora todos os produtos que você tem. Termine
de usá-los, uma vez que já
foram produzidos.
» Troque aos poucos. Um ou dois cosméticos de cada vez e vá testando marcas até encontrar suas preferidas.
» Siga, nas redes sociais, pessoas que falam sobre o assunto e dão dicas e feedbacks sobre cosméticos.
» Mande mensagens ou e-mails
para as marcas com suas dúvidas
sobre os produtos.
» Não ache que não tem o direito ou que seria hipocrisia investir em produtos veganos se come
proteína animal ou derivados.
Faça o que puder.
» Invista em produtos multifuncionais.