A letra de “Eduardo e Mônica”, música da Legião Urbana, guia a narrativa do filme homônimo, gravado ainda em 2018 e que, enfim, chegou aos cinemas, em cartaz desde o mês passado. Como acontece com tantos pares, eles se encontraram sem querer, numa festa estranha, com gente esquisita.
Só que Mônica, anos mais velha, é médica recém-formada (na letra original, estava quase se formando). Eduardo, ainda nas aulinhas de inglês, estuda para passar no vestibular.
Só que Mônica, anos mais velha, é médica recém-formada (na letra original, estava quase se formando). Eduardo, ainda nas aulinhas de inglês, estuda para passar no vestibular.
Tal qual a música, o longa marca o tempo inteiro as diferenças entre os dois, tão opostos quanto Godard e a lanchonete; novela e Van Gogh. Essa história você já sabe. Que tal, então, conhecer as trajetórias de outros casais que, apesar da diferença de idade e das discrepâncias naturais que vêm com ela, provam que é difícil abalar uma relação que nasceu para dar certo? Feito Eduardo e Mônica, para eles, a idade, realmente, é só um número.
Desde o primeiro momento, os 14 anos de diferença entre Grasiele Diniz dos Santos, de 33 anos, e Adriano de Camargo Oliveira, de 47, foram invisíveis para os dois. Diferentemente de alguns casais que se conheceram mais novos ou em fases muito diferentes da vida, os dois estavam estabelecidos profissionalmente e em vivências semelhantes.
A professora e empreendedora e o auditor federal de finanças e controle se conheceram por meio de uma amiga em comum e trocaram telefone. Na mesma semana, depois de conversas on-line, marcaram um jantar e, desde então, vivem os efeitos de um "amor à primeira vista".
A professora e empreendedora e o auditor federal de finanças e controle se conheceram por meio de uma amiga em comum e trocaram telefone. Na mesma semana, depois de conversas on-line, marcaram um jantar e, desde então, vivem os efeitos de um "amor à primeira vista".
Porém, o que sempre foi irrelevante para os dois parecia – e ainda parece – incomodar pessoas que nem sequer conhecem o casal. Grasi conta que costuma perceber olhares e gestos sutis, tanto de amigos quanto de desconhecidos. E que, em outras ocasiões, as coisas já ficaram mais escancaradas. Ela ressalta a visão patriarcal e machista nos julgamentos.
"É como se ele fosse o que chamam de velho da lancha e vivêssemos de interesse. Demonstram um interesse extremo em saber da minha vida profissional, como se para comprovar os próprios preconceitos, e fica muito perceptível", revela.
"É como se ele fosse o que chamam de velho da lancha e vivêssemos de interesse. Demonstram um interesse extremo em saber da minha vida profissional, como se para comprovar os próprios preconceitos, e fica muito perceptível", revela.
Porém, apesar de momentos constrangedores, Grasi afirma que os números nunca foram obstáculo para nada. Mais jovem, ela curte músicas atuais, mas se engana quem pensa que Adriano não conhece ou compartilha os gostos da esposa. Antenado, ele sabe mais sobre os lançamentos pop do que ela.
A ligação instantânea do primeiro encontro virou casamento em seis meses e, desde então, cada vez menos a idade passa pela cabeça do casal. Com grupos de amigos ou sozinhos, eles gostam tanto de noites calmas em casa pedindo comida, quanto de momentos animados em barzinhos e festas. A sintonia e o equilíbrio regem a vida a dois.
A empresária comenta ainda que, na visão de algumas pessoas equivocadas e machistas, Adriano seria considerado "o máximo" por estar com uma mulher mais nova. Mas aí outro preconceito entrava em cena. "Ficamos sabendo que justificavam pelo fato de eu ser gorda, que apenas pelo meu peso uma mulher mais nova estaria com um cara mais velho e diminuíam ele como se fosse o melhor que conseguiria."
E no fim, tanto Adriano quanto Grasi mostraram que, sim, um era o melhor que o outro poderia ter na vida e seguem muito felizes, obrigado. Espiritualistas, os dois acreditam que seu amor é um reencontro e, atualmente, preparam-se para aumentar a família e celebrar cinco anos de casados. "Nossa relação é muito profunda. Não é a nossa idade ou aparência física que nos une ou determina o que sentimos e pensamos um do outro. Temos muita sorte e nos amamos, isso é só o que importa", completa.
NO FORRÓ
E a vontade de Edmilson Dantas de Araújo, de 61, professor de educação física, e Maria Leonor Dillerbeck Dantas de Araújo, de 67, aposentada, veio meio de repente, em abril de 1982, e até hoje não parou de crescer. Leonor, formada em psicologia, e Edmilson, nas próprias palavras "um vagal", se conheceram em um forró para angariar fundos para a barraca do Piauí, na antiga Festa dos Estados.
Ela pegou o telefone dele e ele passou três dias achando que ela não tinha dado bola. De repente, chega a ligação de uma amiga de Leonor – ela tinha perdido a voz, mas queria entrar em contato e sair com Edmilson.
Ela trabalhava no Setor Bancário e ele precisava comprar um tênis no Conjunto Nacional. Lembrando do próprio nervosismo no dia, conta que os dois andaram juntos até o shopping para almoçar. Desde esse dia, nunca mais se separaram.
Apesar de terem poucos anos de diferença, as fases que os dois viviam eram muito contrastantes, o que acentuava os cinco anos entre eles. Aos 21, Edmilson procurava emprego enquanto esperava a reabertura de concursos, que haviam sido suspensos na cidade. "Naquela época, Brasília tinha poucas opções e, como meus pais tinham uma condição tranquila, eu tocava violão e jogava futebol", lembra, rindo.
Enquanto isso, a Mônica, opa, a Leonor trabalhava em um banco e fazia a segunda graduação. De carro, ela buscava o namorado, que, algumas vezes, se infiltrava na sala de aula apenas para ficar com a amada.
Quando não conseguia, ele ficava no carro, compondo poesias para Leonor. Depois, era hora de lanchar e namorar. Os points eram a lanchonete Janjão e o Cine Drive-In. "Qualquer lugar que a gente pudesse ficar dentro do carro e namorar", confessa Edmilson. Nove meses depois, um Edmilson aflito disse para Leonor que não aguentava mais vê-la indo embora e queria ficar junto definitivamente.
IMPRESSIONAR
Para concretizar o desejo, Edmilson pediu a ajuda de uma bem relacionada Leonor, que conseguiu um emprego para o boyzinho que queria impressionar. Veio o casamento, sem festa e sem lua de mel, o foco era no apartamento que o casal estava montando juntos.
Apesar de não ter festa, a celebração foi de respeito. A igreja estava cheia e, depois dos votos, Edmilson e Leonor se divertiram fazendo fotos no "Chevetinho" da noiva. Foi só aí que os dois perceberam o pneu furado. Com o bom humor característico, se divertiram pedindo carona e chegando vestidos de gala no almoço de aniversário do irmão de Leonor.
No primeiro ano de casamento, Leonor engravidou do primeiro filho e Edmilson passou em um concurso da Polícia Civil. Em 1987, chegou o segundo filho e Leonor mudou de emprego. "A vida foi acontecendo e nós dois sempre juntos", afirma.
Hoje, a diferença já não existe. Pouco tempo depois do casamento, Edmilson conta que ele já aparentava ter a mesma idade da mulher. "No início, havia essa diferença, mas foi positiva porque ela, com a vivência e a maturidade que já tinha, me impulsionou pra frente e me apoiou em tudo", diz Edmilson.
Foi com o apoio da parceira que aos 30 anos ele fez faculdade. Desejando cursar educação física e seguir um sonho, recebeu o acolhimento de Leonor, que sempre dizia: "Você precisa fazer o que ama e não alguma coisa só porque dá dinheiro".
Em 2019, o casal enfrentou "a barra mais pesada". Leonor teve um aneurisma e ainda se recupera da doença. Mas aquela vontade de estar juntos e o amor verdadeiro perduram e os dois seguem sempre juntos e se apoiando.
Homens mais velhos se relacionando com mulheres mais novas são o mais "comum", em grande parte devido ao machismo, e Edmilson comemora o fato de que cada vez mais casais estão se libertando dessas ideias retrógradas. "Essa diferença não existe. Se para um homem é tudo bem, para a mulher é a mesma coisa. Essa visão delimita e atrapalha o amor das pessoas. E quando existe o sentimento, é isso que importa", afirma Edmilson.