Jornal Estado de Minas

MOVIMENTO ANTIVACINAS

COVID-19: desinformação sobre vacinas pode ter consequências de longo prazo

Uma pesquisa feita pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) identificou riscos sociais de longo prazo nas campanhas de desinformação sobre vacinas geradas pela pandemia. O crescimento de movimentos e discursos contra a vacinação, iniciante no Brasil até o início da pandemia de COVID-19, pode ter consequências de longo prazo para campanhas futuras, de acordo com pesquisadores. 





 


O estudo analisou, de forma sistemática, interações sobre a temática da vacinação no Twitter (8,3 milhões de tuítes, feitos por mais de 2 milhões de usuários únicos) e Youtube (mais de 93 mil vídeos foram coletados), além de monitoramentos exploratórios do Instagram, Facebook e Telegram, entre maio e novembro do ano passado.

A pesquisa foi coordenada pelo Núcleo de Educação em Saúde Coletiva (NESCON), da Faculdade de Medicina da UFMG, em parceria com o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS). 
 
Investigando fatores que têm contribuído para a redução da cobertura vacinal no Brasil na última década, os pesquisadores apontam que, historicamente, gargalos de infraestrutura, recursos humanos e logística são os mais relevantes para a compreensão do problema. 





Segundo eles, mesmo que se identifique um aumento na hesitação vacinal nos últimos anos, a desinformação não era uma peça central no contexto brasileiro. Isso se deve tanto à consolidação do Programa Nacional de Imunização (PNI) quanto à fragilidade de movimentos antivacina no país.

O contexto da pandemia, porém, abriu espaço para a ampla circulação de discursos em plataformas digitais, como Twitter, Instagram e Telegram, que podem contribuir para a hesitação vacinal, aponta a pesquisa. A politização da COVID-19 alimentou um questionamento sistemático da vacinação, com a difusão de teorias conspiratórias e de suspeitas não fundamentadas contra os imunizantes usados no país.
 

Consequências futuras 


Sábado Girardi, pesquisador e um dos coordenadores da pesquisa, acredita que esses discursos podem não ter surtido efeito imediato na contenção da vacinação de adultos contra a COVID. “Mas eles semeiam ideias e suspeitas que não eram relevantes em nosso contexto. Isso afeta a forma como as pessoas entendem as vacinas e pode ter consequências de longo prazo para campanhas futuras”, afirma.





A pesquisa da UFMG tem resultados semelhantes aos estudos de referência sobre desinformação, como a das pesquisadoras americanas Leticia Bode e Emily Vraga (2015), que mostraram que a sedimentação de desinformação ao longo do tempo a torna mais naturalizada e de difícil contestação. 

“Quando pensamos as ações de imunização no Brasil, o fortalecimento da desinformação sobre vacinas é um desafio novo e que veio para ficar. Será importante compreender como muitos dos discursos contra as vacinas da COVID-19 vão dialogar com o contexto mais amplo de nosso calendário vacinal, erguendo novos fatores de hesitação”, afirma Ricardo Mendonça, professor do departamento de Ciência Política da UFMG e que também integra a pesquisa.
 
*Estagiária sob supervisão