A aplicação da neuroarquitetura tem como ponto de partida a compreensão da relação do comportamento humano com o ambiente físico preexistente. A arquiteta e urbanista Sheyla Passos, professora do curso de arquitetura e urbanismo do UNI-BH, mestre em ambiente construído e patrimônio sustentável pela UFMG, reforça que a neuroarquitetura é a introdução dos fundamentos da neurociência e da psicologia na arquitetura.
“Trata-se do entendimento dos elementos do ambiente físico visando à criação de uma arquitetura que se relacione, de maneira mais intensa, com a experiência sensorial dos moradores e usuários. É o que costumo chamar de arquitetura dos sentidos, que visa potencializar estratégias que proporcionem saúde física e mental por meio da arquitetura e do urbanismo.”
Muitos imaginam que a neuroarquitetura só possa ser aplicada em um projeto novo, começando junto com a planta da casa ou do escritório, mas Sheyla Passos garante que não: “Ela pode ser implantada em edificações já concluídas e antigas, sim. Nesse tipo de projeto, temos a oportunidade de reformular e transformar o ambiente, a depender, claro, de sua estrutura e instalações, ou seja, de seus elementos imutáveis”.
AMPLITUDE Nesse processo de readaptação, Sheyla Passos explica que a aplicação da neuroarquitetura é ampla: “Os princípios da neuroarquitetura compreendem não só o psicológico, mas o aspecto neurológico e fisiológico da experiência humana no espaço, utilizando estratégias que visam proporcionar saúde (física e mental) e buscando uma qualidade espacial que pode envolver, desde o uso da luz natural, da ventilação natural, da integração com o verde (uso de plantas em geral), das cores, do conforto térmico e acústico até a introdução de elementos que considerem a identidade dos moradores e que criem uma verdadeira fusão entre a função do espaço e um local mais saudável.”
As plantas, a natureza e o verde são elementos fundamentais dentro da neuroarquitetura. “Entender cientificamente como o ambiente impacta os moradores e usuários de um determinado espaço confere mais consciência e sentido e, usado como método, proporciona maior objetividade ao processo de concepção dos projetos na introdução de elementos comprovadamente relacionados à melhoria da saúde.”
Sheyla Passos ensina que a principal função da planta está diretamente relacionada à promoção do ambiente com mais qualidade, seja por meio da melhoria do espaço termicamente, acusticamente, seja por uma maior predisposição para hábitos saudáveis; para prevenção de doenças respiratórias (promovendo um ar mais puro), para melhorar o humor, entre outros. “Vale ressaltar que, além de espaços arquitetônicos, o uso de vegetação no ambiente urbano também é de extrema importância por vários motivos, inclusive para a melhoria dos microclimas, promovendo saúde.”
Projetos promovem qualidade de vida
A arquiteta destaca que o designer de interior também tem relação com a neuroarquitetura. Ela conta que a reformulação e criação de espaços internos podem aplicar, diretamente, as estratégias da neuroarquitetura para a promoção da saúde dos usuários. “Isso é de extrema importância para os projetos. Entender e ter consciência de como utilizar as cores, como potencializar a entrada de luz natural, de sol, como conhecer e entender as plantas para saber qual a melhor escolha para os espaços abertos (cobertos e/ou descobertos) e para espaços fechados, por exemplo, certamente produzirá ambientes mais confortáveis e saudáveis.”
Sheyla Passos afirma que sempre houve a introdução de algumas questões e pressupostos colocados agora pela neuroarquitetura. Porém, a discussão, na maioria das vezes, relacionava-se com conceitos filosóficos, como o da fenomenologia, manifestado na experiência em relação aos sentidos humanos.
INCONSCIENTE “Esse conceito, de forma geral, mas não reducionista, aplicado a uma corrente arquitetônica, leva em conta uma abordagem mais subjetiva, para além de uma visão que coloca a arquitetura como válida apenas para cumprir sua função. Dizemos que, ao habitar um determinado espaço, o que afeta o usuário são os sentimentos que ele provoca em função da luz, cor, som, cheiros etc., impactando algo inconsciente. Isso agrega conforto ambiental ao espaço. Considerando isso, essa preocupação e raciocínio projetual sempre existiram.”
Porém, integrada e relacionada à neurociência e à psicologia a ponto de estabelecer uma metodologia de criação projetual, a neuroarquitetura pode, sim, ser considerada uma novidade. “Então, a principal diferença aqui é que esse estudo e forma de projetar passa a se basear em evidências neurocientíficas que “edificam o humano”, para dizer de forma subjetiva.
Estabelecendo esse método como um novo processo de concepção, a neuroarquitetura capacita o profissional para a real compreensão dos objetivos a serem proporcionados pelos espaços. “A importância disso está exatamente na ampliação da interdisciplinaridade das áreas e na criação de um método científico para obtenção do resultado desejado”, comenta Sheyla.
“Esse método de análise e interpretação das relações entre arquitetura (ambiente) e o homem (comportamento), certamente produz uma série de benefícios, todos ligados à melhoria da vida por meio da criação de espaços mais saudáveis e mais coerentes com as sensações humanas. Intervenções arquitetônicas e urbanísticas que modelam, conformam e compõem a vida.”
Neuroarquiteutra no Uni-BH
A neuroarquitetura é apresentada no UNI-BH dentro das unidades de conhecimento de projeto de interiores, arquitetônicos e urbanísticos. E de duas formas: indireta, aplicando conceitos como da arquitetura dos sentidos; arquitetura humana; arquitetura narrativa; arquitetura afetiva, entre outros. E de forma direta, no desenvolvimento de uma metodologia projetual (baseada em evidências científicas) centrada no ser humano e no impacto que o ambiente pode trazer para sua saúde, bem-estar e desempenho. Assim, o profissional se forma consciente de suas ações projetuais respaldadas, além da sensibilidade e subjetividade, no saber técnico e científico, conferindo à relação “ambiente e comportamento” um caráter mais potente, mais facilmente aplicável, mais responsável e,
por consequência, mais transformador.
Para ler
"Neuroarquitetura - A neurociência no ambiente construído”, de Vilma Villarouco, Nicole Ferrer, Marie Monique Paiva, Julia Fonseca e Ana Paula Guedes, da Editora Rio Books, de 2021. Livro apresenta o novo diálogo que integra arquitetura e neurociência, buscando entender trocas possíveis entre esses campos: por exemplo, como o cérebro processa o ambiente que vivenciamos; ou como a arquitetura pode, conhecendo melhor os mecanismos dos processos neurais, planejar experiências que tragam saúde e bem-estar em projetos arquitetônicos. As autoras procuraram introduzir o leitor, mesmo o leigo, às bases da neurociência, a fim de prepará-lo para entender arquitetura de uma forma nova: a teoria e a prática da neuroarquitetura.