Jornal Estado de Minas

Andar com a própria força

Projeto de exoesqueleto ajuda na reabilitação de paraplégicos

Condição física, congênita ou adquirida, a paraplegia se caracteriza pela ausência total ou parcial dos movimentos das pernas. Além das adversidades inerentes à doença, o indivíduo que apresenta o problema enfrenta outras questões que passam mesmo pela interferência na qualidade de vida e na autoestima. De olho no enfrentamento da patologia, grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), apresenta um novo modelo de exoesqueleto voltado para a reabilitação de paraplégicos. O estudo é coordenado por Rogério Sales Gonçalves, professor da Faculdade de Engenharia Mecânica da UFU.



O equipamento, esclarece o professor, consiste em uma estrutura mecânica formada por quatro mecanismos articulados denominados também de pernas – assim, sempre se tem duas pernas em contato com o piso, garantindo a estabilidade do usuário. “O exoesqueleto promove sustentação, estabilidade e segurança. A movimentação das pernas é realizada pelo movimento dos braços dos usuários, sem a necessidade de motores e de baterias.”

A utilização de uma ferramenta que permite a locomoção dos paraplégicos minimiza diversos problemas, segundo o especialista. A falta de movimentação dos músculos pode acarretar feridas profundas na pele, as chamadas escaras, diminuição da capacidade aeróbica, má circulação sanguínea, osteoporose, transtornos renais, infecção urinária, doenças cardíacas, entre outras.

“Esses problemas poderiam ser amenizados se os paraplégicos pudessem ficar em pé e andar. O dispositivo também permite um melhor condicionamento físico, respiratório e fortalecimento dos braços necessários para o acionamento/movimentação das pernas, além de melhorar a circulação sanguínea”, explica Rogério Gonçalves. “O fato de o exoesqueleto possibilitar aos usuários, por exemplo, conversarem em pé, na mesma altura com outras pessoas, pode auxiliar no aspecto psicológico. Variações dessa estrutura podem ser utilizadas também para o tratamento de pessoas que sofrem de alguma doença neurológica”, acrescenta.



O desenvolvimento do dispositivo começou em 2013, a partir de uma dissertação desenvolvida na UFU, de autoria do aluno Glicerinho Soares Júnior, sob orientação de Rogério Gonçalves, com a ideia de conceber um exoesqueleto não motorizado. Uma síntese sobre o aparelho mirou a reprodução do movimento das pernas, de modo a resistir ao peso do usuário. “Na sequência, foram realizadas simulações gráficas em computador e construído um protótipo”, conta.

A principal inovação do exoesqueleto mineiro, pontua o pesquisador, é justamente a capacidade de colocar um paraplégico para andar com sua própria força, o que cria uma estrutura de baixo custo para a locomoção e exercícios de todo o corpo. “O não uso de motores e baterias diminui a complexidade, manutenção e custos do equipamento”, salienta.

Já foram realizados testes em um manequim com as dimensões semelhantes ao homem e, para testes em seres humanos, é necessária aprovação do comitê de ética da instituição de ensino. Segundo o coordenador do estudo, esse pedido será feito em etapas próximas, após melhorias necessárias. “O mecanismo permite o deslocamento somente em linha reta. Estamos implementando melhorias para a aplicação em curvas”, ressalta.


QUALIDADE DE VIDA 

Rogério Gonçalves diz que a motivação para o projeto é oferecer às pessoas paraplégicas a chance de voltar a andar. “É algo que tem diversos benefícios, com foco na qualidade de vida. Um equipamento simples, mas que faz toda a diferença. Queremos ajudar o próximo e atender quem precisa, auxiliar essas pessoas em um futuro próximo.”

A iniciativa também vislumbra a concepção de versões simplificadas da estrutura para simular a marcha humana, o que poderá ser utilizado por pacientes que sofreram AVC, contemplando, por exemplo, o tratamento da espasticidade (quando ocorre um aumento do tônus muscular, envolvendo hipertonia e hiper-reflexia, no momento da contração muscular, causado por uma condição neurológica anormal). O trabalho já gerou uma patente, administrada pela Fapemig e pela UFU. “Estamos trabalhando para que a tecnologia esteja disponível no mercado a baixo custo, de forma que possa atender todos, inclusive as crianças”, finaliza.

É algo que tem diversos benefícios, com foco na qualidade de vida. Um equipamento simples, mas que faz toda a diferença. Queremos ajudar o próximo e atender quem precisa, auxiliar essas pessoas em um futuro próximo”


Rogério Sales Gonçalves, professor da Faculdade de Engenharia Mecânica da UFU e coordenador do estudo