Andar sobre duas pernas, perder a cauda e não ter mais o corpo coberto de pelos não foram os principais elementos que, na evolução da humanidade, levaram ao surgimento do homem moderno. Há 2,5 milhões de anos, os primeiros espécimes do gênero Homo já eram assim. Porém, uma diferença drástica os aproximava mais dos macacos primitivos do que da nossa espécie: seus cérebros diminutos, da metade do tamanho do de um ser humano.
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Maria Ponce de León, do Departamento de Antropologia da Universidade de Zurique e principal autora do artigo, explica que, embora longe de terem as habilidades cognitivas do homem moderno, esses espécimes já eram capazes de fabricar diversas ferramentas, necessárias para sobreviver às novas condições climáticas da Eurásia, mais quente e com novas fontes de alimentos que exigiam adaptações tecnológicas.
Segundo Ponce de León, durante esse período, as populações ancestrais se tornaram mais complexas e diversificadas, o que pode ser constatado pela descoberta de vários tipos de ferramentas de pedra. “É provável que as primeiras formas da linguagem humana também se tenham desenvolvido durante esse período”, diz. Fósseis encontrados em Java, na Indonésia, fornecem evidências de que as novas habilidades cognitivas surtiram efeitos práticos: pouco tempo depois de surgirem na África, já estavam migrando para o sudeste da Ásia.
Pensamento complexo
A pesquisadora esclarece que, além do tamanho, o cérebro humano difere do dos grandes macacos na localização e na organização de regiões individuais. “As características típicas dos humanos são principalmente as regiões do lobo frontal, responsáveis pelo planejamento e pela execução de padrões complexos de pensamento e ação e, em última instância, também pela linguagem”, observa. Como essas áreas são significativamente maiores no cérebro humano, as regiões cerebrais adjacentes se deslocaram mais para trás quando o órgão evoluiu em tamanho.
Reconstruir a cronologia e o modo de evolução do cérebro dos hominídeos requer um bom conhecimento dessas mudanças sutis, observa a paleontóloga Amélie Beaudet, da Universidade Autônoma de Barcelona, que não participou da pesquisa. “Nesse aspecto, a parte inferior do lobo frontal, onde se localiza a área de Broca, tem sido foco de investigações e intensas discussões”, diz. “Além de ser um marco crítico para a reorganização do cérebro, ela desempenha um papel fundamental na produção e na compreensão da linguagem, cuja evolução é um tema igualmente intrigante. A área de Broca dos humanos difere estruturalmente da de nossos parentes vivos mais próximos, os chimpanzés e bonobos”, explica.
Segundo a especialista, esses dois animais têm um sulco diferente nessa região, denominado sulco fronto orbital. “Isso está ausente em humanos, que, em vez disso, têm dois sulcos verticais. Em estudos evolutivos humanos, presume-se que os cérebros dos chimpanzés e dos bonobos se aproximam mais da condição primitiva do dos hominídeos.” O surgimento do sulco único, diz Beudet, pode ser interpretado como o primeiro passo da organização do cérebro humano.
Mas Christoph Zollikofer, também pesquisador da Universidade de Zurique e coautor do estudo, diz que, até agora, era difícil fazer essa análise. “Como as impressões deixadas pelos sulcos nas superfícies internas dos crânios fósseis variam consideravelmente entre os indivíduos, não era possível determinar claramente se um fóssil de Homo em particular tinha um cérebro mais semelhante ao de um macaco ou um mais humano”, afirma. De acordo com ele, as tomografias computadorizadas dos crânios estudados permitiram, pela primeira vez, fazer essa diferenciação, determinando que o cérebro humano surgiu há 1,7 milhão de anos.