Lava-jato, tornozeleira eletrônica, políticos (como Gilmar Mendes e Jair Bolsonaro), malas de dinheiro, chás alucinógenos, assuntos do cotidiano (como o metrô) e até homenagens póstumas. Esses são alguns dos temas abordados pelas 17 marchinhas selecionadas para a 7ª Edição do Concurso Mestre Jonas, que serão apresentadas na noite desta sexta (26), com festa no Parque Municipal.
A novidade deste ano é que o público participa da escolha já nesta etapa classificatória. Além das 14 selecionadas pela comissão julgadora, três foram eleitas pela votação popular na internet. “A gente tinha divulgado que era apenas uma, mas, na verdade, são três mesmo. O edital dizia isso. Por isso houve a inclusão de mais duas na lista”, explica o organizador do evento, o produtor cultural Kuru Lima.
Uma das escolhidas foi Rol Bar, um trocadilho com roubar, que fala de um boteco na capital federal frequentado pelo pessoal do Congresso Nacional. A música é uma parceria do cantor e compositor Marcos Catarina com Flávio Boca, que venceu o Mestre Jonas em 2015 com Rejeitados de Guarapari. “A gente se inscreveu aos 45 do segundo tempo. E nem fizemos campanha na internet. Foi uma surpresa ela ter sido a mais votada pelo público”, diz Marcos, que, apesar de já ter feito algumas marchinhas anteriormente, foi selecionado pela primeira vez no concurso. “E já entrei com duas (concorrentes neste ano). Foi muito bacana. Vamos torcer. Marchinha tem que ter uma estrutura simples, divertida e, sobretudo, a piada tem que ser boa. Esse é o segredo”, afirma.
A outra composição dele na disputa é 30 ovos por 10, inspirada num caso real ocorrido em Ibirité no ano passado. O vendedor de ovos Gabriel Cordeiro foi questionado por uma menina se não tinha vergonha de seu trabalho. A resposta do comerciante viralizou na internet, e ele conquistou milhares de admiradores. “Respondi que vergonha eu teria se roubasse um pai de família ou se traficasse, mas o que ela pensa sobre isso eu não ligo, pois quem eu quero que enxergue e se orgulhe do meu esforço são meus pais.”
Marcos Catarina conta que essa história o marcou e foi inspiração para que criasse uma marcha bem irreverente para homenagear trabalhadores como Gabriel. “Ninguém pode ter vergonha de um ofício nem humilhar ninguém por isso. Qualquer emprego é honrado, ainda mais nesses tempos de crise. São essas pessoas que precisam ser valorizadas. Até convidamos o Gabriel para estar conosco na semifinal no Parque”, conta. O músico, que é irmão do saudoso cantor e compositor Vander Lee (1966-2016), frisa a importância de o carnaval de rua de Belo Horizonte celebrar a folia com canções locais e autorais. “São músicas que falam da gente, feitas por autores daqui e que trazem as temáticas do nosso tempo.”
POLÍTICA Mais uma vez, a política dominou as canções. No entanto, Kuru Lima observa que há uma diferença em relação aos anos anteriores, em que fatos mais regionais se sobressaíam, como são exemplos Prefeito, libera o cooler, endereçada ao ex-prefeito de BH Márcio Lacerda, e Na coxinha da madrasta, sobre um escândalo na Câmara Municipal. Essa última composta por Flávio Henrique, que morreu neste mês em consequência de febre amarela e será homenageado pelo Mestre Jonas.
Em 2018, observa Kuru, foram os assuntos da política nacional que fizeram a festa dos compositores. “O cenário mudou. Deixou de ser local para ser mais abrangente. Desde o ano passado, quando a gente teve O baile do cidadão de bem (Helbeth Trotta, Jhê Delacroix) vencendo e Solta o cano (Marcos Frederico, Vitor Velloso) em segundo, essa tendência já despontava”, afirma.
Um ponto positivo desta edição é que a participação feminina aumentou. Das 17 selecionadas, três contam com compositoras. “É bacana isso, até porque, quem começou essa história toda de marchinhas foi uma mulher, Chiquinha Gonzaga com Ó abre alas”, comemora Rita Maria Leonardo, autora junto com Maria Regina Paletta de Trombeta. Foi após a semifinal de 2017 do Concurso Mestre Jonas que as amigas – integrantes do Grupo Delas, junto com Terezinha Franco – decidiram compor uma marchinha.
“Fomos à festa e estávamos nos divertindo muito, rindo sem parar. O clima estava ótimo. Mas como estamos numa faixa etária um pouco acima da maioria de quem estava lá (risos), a gente ficou com a impressão de que acharam que tínhamos tomado ou bebido alguma coisa”, conta. Foi assim que surgiram os primeiros versos da música que fala de mocinhas de 60 que adoram chá de limão, camomila e menta, mas que um dia pegaram a folha errada e saíram para o carnaval. “Tem toda uma picardia. A gente faz essa brincadeira de que as mocinhas confundem as ervas. Cada um que pense o que quiser. A música não vem para explicar, mas está aí para divertir e fazer dançar.”
Veterano no concurso, o compositor Marcos Frederico, um dos integrantes da Orquestra Royal, grupo que venceu em 2014 com o Baile do Pó Royal, e em 2016 com Não enche o saco do Chico, concorre com A dancinha da tornozeleira, composta com Belisário Nogues. O músico ressalta que é frequente a participação de integrantes da orquestra na competição. Joilson Cachaça e Alfredo Jackson também estão no páreo, com Bolsomico.
“Em dezembro, a gente já começa a compor, a produzir os vídeos, o que é um outro diferencial. A gente faz meio que por esporte. Gostamos muito de compor e, ao mesmo tempo, nos divertimos”, diz Marcos Frederico. Ele lembra que, cada vez mais, os músicos têm se preocupado em aprimorar os arranjos e criar um estilo de fazer marchinha. “Temos como referência as marchinhas tradicionais, mas queremos evoluir em termos de linguagem, de harmonia”, diz. Mais do que uma marchinha, Marcos espera que Dancinha da tornozeleira se torne uma dança realmente. “Quem sabe um monte de gente não estará no carnaval com uma tornozeleira como adereço e vai sair dançando por aí? A dancinha é que é o mote. É essa a novidade.”
As 10 melhores marchinhas escolhidas pelo júri na seletiva do Parque Municipal se apresentam na grande final em 4 de fevereiro, no espaço cultural Distrital, dentro do Mercado do Cruzeiro. Neste ano, o concurso vai distribuir prêmios para as três melhores marchinhas, além do Troféu Mestre Jonas. O prêmio para o 1º lugar é de R$ 5 mil; o 2º lugar, R$ 3 mil; e o 3º receberá R$ 1,5 mil.
CONCURSO MESTRE JONAS
Seletiva de marchinhas da edição 2018, nesta sexta (26), das 18h30 às 22h, no Parque Municipal (entrada pela Avenida Afonso Pena, 1.377, Centro). Ingressos gratuitos pelo site www.sympla.com/mestrejonas
• Quem compete
Confira as 17 marchinhas que disputam hoje um lugar entre as 10 finalistas
1 - A dancinha da tornozeleira, de Marcos Frederico e Belisário Nogues
2 - Bananalândia e a im(p)unidade parlamentar, de Zé Mendish e seu Carpado Poético-Musical
3 - Black fraude, de Aline Leodore
4 – Bloco do torresmo, de Fábio “Floc” Mação e Haroldo Ribeiro Gomes
5 – Bolsomico, de Joilson Cachaça/Afredo Jackson
6 – Carnaval psicodélico, de Daniel Saavedra
7 - Festa no céu, de Raul Mariano
8 - Gente fina feita pra brilhar, de Leo Mendonza
9 - Marchinha do assombração, de Gustavo da Macedônia
10 - Mátria amada, de Irene Bertachini e Deh Mussulini
11 - Não vem se eu não quiser, de Carlos Linhares
12 - Pai, cadê você?, de Aggeo Simões, João Faleiro e Henrique Lizandro
13 - Trinta ovos por dez, de Marcos Catarina e Roni Valk
14 – Trombeta, de Rita Maria Leonardo Guerra e Maria Regina Gomes Paletta
15 – Rol Bar (votação popular), de Flávio Boca e Marcos Catarina
16 - Esperando o metrô (votação popular), de João Batera e Dimas Lamounier
17 - Palhaço tupiniquim (votação popular), de Ricardo Gomes