Enrolado, liso, rastafári, curto e longo. Estas são algumas das expressões que nomeiam diferentes penteados ou cortes. E é exatamente o cabelo o ponto de partida do diretor Sérgio Gag no documentário Fios de alta tensão, que aborda a importância dessa parte do corpo e seus adereços na construção da identidade de diversos grupos sociais.
A ideia de produzir o longa foi concebida no fim de 2016, com as gravações no ano seguinte. O filme está na programação do Festival Internacional de Documentário de Moda (Feed Dog Brasil) e no Mira – Festival de Cine Latino-americano Independiente de Bonn, na Alemanha. Criado em 2015, em Barcelona, com o objetivo de apresentar o universo da moda como elemento cultural, o Feed Dog chegou ao Brasil em 2017 com edição em São Paulo. Este ano, Belo Horizonte é a sede do evento, que conta com a exibição de filmes, exposição fotográfica e bate-papo sobre a moda e as expressões artísticas. As atividades se encerram hoje, no Sesc Palladium e no Museu da Moda.
Com a intenção de registrar a diversidade cultural do Brasil, o diretor escolheu Belém, Salvador, São Paulo e Rio de Janeiro para as gravações. “Em Salvador, a influência das matrizes africanas é muito forte. Em Belém, fomos atrás dos indígenas. Já em São Paulo e Rio de Janeiro, procuramos mostrar a miscigenação”, conta Gag. Foram ouvidas pessoas de classes sociais, cores e gêneros diferentes. “É curioso que, quando se trata de cabelo, sempre tem gente com alguma coisa para contar. Foram muitos depoimentos que colhemos. Tivemos uma dificuldade muito grande para escolher quais entrariam no filme. Tem muito material bom que acabou ficando de fora”, afirma.
À primeira vista, o tema pode parecer banal, mas Fios de alta tensão não se preocupa com estética a partir dos diversos penteados. O longa parte de um objeto para mostrar a luta de diferentes grupos para se reafirmar e lutar contra o preconceito através dos cortes, estilos e adereços para o cabelo. “Quando estávamos gravando em Salvador, havia uma senhora no Pelourinho com um turbante muito bonito. Perguntei a ela se o fato de pessoas brancas usarem aquele adereço não a incomodava. Ela me respondeu que era justamente o contrário: usando o turbante de maneira respeitosa, era bom para reafirmar a cultura dela”, disse. Caso semelhante ocorreu com um rapaz de cabelo rastafári. Segundo o diretor, ele afirmou que o uso do estilo por outras pessoas era uma forma para diminuir o preconceito em relação ao rastafári.
Diante da polarização do país, em que discursos de ódio e intolerância se fazem cada vez mais comuns, a exibição de Fios de alta tensão no Feed Dog se torna uma forma de resistência. “Esse é um filme político, não político-partidário, mas político. Espero que as pessoas possam enxergar isso. Espero que esse documentário possa levantar discussões e reflexões, principalmente agora que vivemos um momento em que minorias estão sendo muito atacadas”, conclui Gag.
* Estagiário sob a supervisão do subeditor Pablo Pires Fernandes
FIOS DE ALTA TENSÃO
Hoje, às 17h30. No Sesc Palladium (Av. Augusto de Lima, 420, Centro. (31) 3270-8100). O Festival Internacional de Documentário de Moda (Feed Dog Brasil) ocorrer também no Museu da Moda (Rua da Bahia, 1.149, Lourdes). Entrada franca. Programação completa: br.feeddog.org.