Jornal Estado de Minas

O 'gigante' Umberto Eco

Conteúdo para Assinantes

Continue lendo o conteúdo para assinantes do Estado de Minas Digital no seu computador e smartphone.

Estado de Minas Digital

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Utilizamos tecnologia e segurança do Google para fazer a assinatura.

Experimente 15 dias grátis

 

“Estamos entrando em uma nova era”
Umberto Eco, escritor, em 2001

Foi a partir de um aforismo do genial matemático Isaac Newton (“Se vi mais longe, é por estar nos ombros de gigantes”) que outro artista não menos notável, o escritor e semiólogo italiano Umberto Eco (1932-2016), criou uma bela cena para seu romance O nome da rosa em que ressalta o dom do artista de vislumbrar o futuro. Pois é justamente Nos ombros dos gigantes o título de um volume lançado pela editora Record, que reúne palestras proferidas pelo autor no festival La Milanesiana, em Milão, entre 2001 e 2015.

São textos em que Eco, como poucos, sabia unir erudição e clareza para tratar de temas aparentemente banais como beleza, feiura, invisível e segredo. Complementando o que chama de a essência de Umberto Eco, a Record lança também O fascismo eterno, que traz a íntegra de uma palestra proferida nos anos 1990, nos EUA. E, para fechar uma trinca respeitável, a editora oferece uma edição de colecionador de seu principal best-seller, O nome da rosa, com tradução revista por Ivone Benedetti – esse volume terá venda exclusiva pelo site da Amazon.

O festival La Milanesiana foi criado em 2000 pela escritora e cineasta italiana Elisabetta Sgarbi com a intenção de discutir literatura, música, cinema, ciência, arte, filosofia e teatro. Em pouco tempo, as palestras de Eco se tornaram a atração do evento, mobilizando pequenas multidões. Logo no texto que abre a antologia, Eco traça uma linha cronológica dos grandes pensadores que influenciaram uns aos outros – relação semelhante à de pais e filhos: conflitantes e, ao mesmo tempo, estimulantes.

“Estamos entrando em uma nova era”, escreve ele, em 2001, “na qual, com o ocaso das ideologias, o desvanecimento das divisões tradicionais entre direita e esquerda, progressistas e conservadores, atenua-se definitivamente qualquer conflito geracional”. E questiona: “Mas seria biologicamente recomendável que a revolta dos filhos representasse apenas uma adequação superficial aos modelos de revolta oferecidos pelos pais, e que os pais devorassem os filhos presenteando-os simplesmente com espaços de marginalização multifacetada?”.

SLIDES Em seus colóquios, Eco costumava apresentar slides com reproduções de obras de arte que exemplificavam seus conceitos. O livro traz, portanto, entre os 12 textos, quase 150 imagens de quadros, esculturas e outros grandes momentos da criação artística ao longo de cinco séculos.

O trabalho iconográfico é especialmente interessante no último capítulo que trata sobre o sagrado. É quando Eco se deleita (e também o leitor) ao apresentar uma vasta iconografia sacra com criações de Caravaggio, Tintoretto, Giorgione, Lorenzo Lotto e Carlo Maratta.

A própria capa do livro traz como imagem o retrato que William Blake pintou de um Isaac Newton jovem – musculoso, portanto –, uma surpresa diante do habitual senhor, com ar de pensador, com que o público se acostumou a identificar o físico e matemático. A ilustração refere-se à palestra dedicada ao tema “Absoluto e relativo”, especialmente na passagem em que Eco confronta a visão do mundo dos holistas.

Eco é hábil em sua argumentação, pela qual transmite definições que, se parecem definitivas, servem na verdade para abrir debates. Em seu entendimento, por exemplo, a beleza e a feiura devem ser entendidas segundo o momento histórico e os cânones estéticos dominantes. Eco reflete também sobre como o ato de se montar uma lista com preferências muda com o decorrer dos séculos, o que acaba expressando o seu próprio tempo.

NEOCONSERVADOR Em sua última participação no festival, em 2015, o intelectual italiano se apoia no pensamento do filósofo austríaco Karl Popper e do historiador americano Daniel Pipes (figura midiática do neoconservadorismo nos EUA) para investigar a fixação da humanidade por teorias conspiratórias.

“De fato, se estou convencido de que a história do mundo é dirigida por sociedades secretas que estão prestes a instaurar uma nova ordem mundial, o que posso fazer? Só me render e me angustiar. Portanto, as teorias da conspiração direcionam a imaginação pública para perigos inexistentes, distraindo-a das ameaças autênticas”, alerta.

Por outro lado, O fascismo eterno traz a conferência pronunciada em um simpósio organizado pela Columbia University, em 1995, para celebrar a libertação da Europa na 2ª Guerra Mundial.

“É importante lembrar que o texto foi pensado para um público de estudantes americanos e que a conferência ocorreu naqueles dias em que a América havia sido sacudida pelo atentado de Oklahoma e pela descoberta do fato (nem um pouco secreto, aliás) de que existiam organizações militares de extrema direita nos EUA”, escreve Eco, no prólogo. (Estadão Conteúdo)

NOS OMBROS DOS GIGANTES

.
De Umberto Eco
. Record
. 444 páginas
. R$ 199,90

O FASCISMO ETERNO
. De Umberto Eco
. Record
. 64 páginas
. R$ 29,90

.