Tim Maia já havia aspirado todos os pós e entornado todos os líquidos naquele ano de 1975, quando se sentou com o amigo Tibério Gaspar em um fim de semana. Depois de mandar mescalina para dentro, passou a folhear o livro indicado pelo amigo, cheio de conceitos sobre os quais jamais ouvira falar. Universo em desencanto, mundo racional, racional superior, cultura racional, energia racional. A história é assim: todos os viventes da Terra vieram de outro planeta. A Terra é nosso exílio, nos sujando e nos magnetizando, submetendo-nos a todo tipo de sofrimento. A saída? Ler o livro Universo em desencanto e seguir os ensinamentos de Manoel Jacintho Coelho até atingirmos o estágio da imunização racional e sermos resgatados por seres extraterrenos que nos levarão de volta ao mundo original. Quando fechou o livro, Tim já era outro homem.
A conversão de Tim Maia (1942-1998) à cultura racional rendeu três álbuns, execrados na época pela crítica, mas considerados hoje cálices sagrados por colecionadores e fãs da soul music brasileira. Embriagado pelos mandamentos do livro, o cantor parou com o álcool, com a cocaína e com a carne vermelha.
FUNK O devoto Tim entregou ao Universo Racional o que tinha de melhor. Músicas que haviam sido terminadas em 1974 – sobre a base mais influenciada pelo soul e o funk norte-americano de toda a sua biografia – tiveram as letras modificadas, adaptadas ao discurso das elevações espirituais. O primeiro álbum saiu em 1975 e o segundo em 1976. O terceiro projeto, Racional 3, gravado também em 1976, só seria lançado 35 anos depois.
Os discos foram imediatamente amaldiçoados. “Aquelas letras se tornaram um atestado de otário para Tim”, diz Nelson Motta, biógrafo do amigo. Proibidos pelo autor e com prensagens descontinuadas, os álbuns se tornaram peças arqueológicas. “O vinil dos dois primeiros custa, no mínimo, R$ 1 mil cada. O terceiro pode ter um valor menor”, diz o jornalista Ramiro Zwetsch, dono da loja paulistana Patuá Discos.
E, então, eis que surge o universo encantado do streaming. Esses álbuns, como muitos outros discos de Tim, não estavam disponíveis nas grandes plataformas de música.
Quase ao mesmo tempo, um Tim Maia ainda desconhecido virá à tona ainda neste semestre, com gravações em espanhol que ele nunca lançou. Carmelo explica: “Meu pai, depois de ficar desiludido no Brasil, foi para os Estados Unidos e ficou por lá cinco anos, recebendo influências de latinos e norte-americanos. Gravou uma série de discos entre 1994 e 1998, ano de sua morte, cuja produção não era nada comum. Em dois anos, fez cinco CDs. Um deles, que nunca lançou, traz Primavera, Azul da cor do mar e Cristina em espanhol.”
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