Três anos após pisar no tapete vermelho em Cannes com um filme de Kleber Mendonça Filho, a atriz mineira Bárbara Colen volta ao festival de cinema francês com mais um longa do diretor pernambucano. Se em Aquarius ela interpretou a protagonista Clara quando jovem – o filme tem uma passagem de tempo e Sonia Braga assume o papel na segunda fase –, agora Bárbara vive Teresa em Bacurau, que compete pela Palma de ouro. Com 19 filmes em disputa (anunciados ontem; especula-se que o novo Quentin Tarantino ainda possa ser incluído, caso fique pronto a tempo), o festival ocorre de 14 a 25 de maio e tem o mexicano Alejandro González Iñárritu como presidente do júri. O ator francês Alain Delon receberá a Palma honorária.
“Por mais que houvesse rumores de que Bacurau estaria na lista (da competição oficial em Cannes), a gente fica na expectativa. E, quando confirmou, foi uma alegria só. É muito forte poder voltar lá com um filme do Kleber. É mais significativo ainda”, diz a atriz.
Em 2016, quando o diretor e sua equipe estiveram na Croisette, eles aproveitaram os holofotes da sessão oficial de Aquarius no Palácio dos Festivais para protestar contra o processo de impeachment de Dilma Rousseff, levantando cartazes em que denunciavam um “golpe” em andamento no Brasil. Nos dois anos seguintes o Brasil não teve longas selecionados para a competição em Cannes. A única vez em que o país ganhou a Palma de Ouro foi em 1962, com O pagador de promessas (1962), de Anselmo Duarte.
“As coisas pioraram demais para o Brasil depois daquilo. Isso sem mencionar o processo de perseguição que Kleber passou a sofrer. Passaram a esmiuçar a vida dele, achar coisas que não existem. Aquarius era a grande aposta naquele momento para o Oscar, e acabou sendo preterido, lamentavelmente”, diz a atriz. Pequeno segredo, de David Schürmann, foi o candidato apresentado pelo Ministério da Cultura (MinC) à Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood.
A perseguição a que Bárbara se refere diz respeito à prestação de contas de O som ao redor (2012), o primeiro longa de ficção do diretor pernambucano. A Secretaria Especial da Cultura, órgão que substituiu o MinC, aponta que houve irregularidade na utilização de recursos incentivados – o orçamento do filme teria ultrapassado o teto permitido – e pede a devolução de R$ 2,2 milhões aos cofres públicos. O diretor recorreu duas vezes, mas não teve seus recursos acatado.
“É tudo muito surreal, mas voltar a disputar Cannes é superimportante para o cinema nacional. Ainda mais neste momento de desmonte total que estamos atravessando na cultura. Mostra que estamos no caminho certo, estamos colhendo frutos de um trabalho. É um alento e um sinal de esperança”, afirma Bárbara.
Bacurau, cujo nome se refere a um pássaro de hábitos noturnos, tem roteiro e direção de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles e mistura os gêneros western, aventura e ficção científica, segundo a produção. Na sinopse divulgada, Bacurau é um pequeno povoado do sertão brasileiro que se despede de Dona Carmelita, mulher forte e querida, falecida aos 94 anos. Dias depois, os moradores do lugarejo percebem que a comunidade não consta mais nos mapas.
Bárbara Colen afirma que foi uma decorrência natural voltar a trabalhar com Kleber Mendonça e que outras pessoas de Aquarius também estão no novo projeto. “Eu tinha ficado muito próxima, inclusive do Juliano, que, em Aquarius foi o diretor de arte e agora é codiretor e roteirista. Mas desta vez, ao contrário do que aconteceu com a Clara, papel para o qual fiz testes, eu fui convidada”, conta.
VOLTA
Segundo a atriz conta, Teresa é muito parecida com ela, mas não dá detalhes da personalidade de sua personagem. Ela é uma mulher nascida no fictício povoado, mas que não mora lá. Quando retorna, muitos anos depois de ter emigrado, os acontecimentos se precipitam. “Esse retorno coincide com o período em que dona Carmelita morre e é aí que a história se desenrola. O interessante é que esse é um filme coletivo, de atores, não tem um protagonista muito claro”, comenta.
O elenco conta ainda como Karine Teles (Benzinho), Silvero Pereira (BR-trans), Antonio Saboia (O mecanismo), o ator alemão Udo Kier (Pequena grande vida) e Sonia Braga novamente. Bárbara Colen comemora o fato de que, desta vez, pôde contracenar com a eterna Gabriela, já que, em Aquarius, as duas interpretaram o mesmo papel. “Foi muito intenso o processo de preparação, porque ficamos muito juntos nesse período de imersão em Recife e no sertão nordestino. Foi maravilhoso ter esse contato novamente com a Sonia.”
O longa foi rodado no Sertão do Seridó, divisa do Rio Grande do Norte com a Paraíba, no ano passado. As locações foram encontradas depois de a equipe percorrer mais de 10 mil quilômetros em Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. As filmagens duraram dois meses e três dias, com uma equipe de 150 pessoas. As cidades de Parelhas (RN) e Acari (RN) serviram de base para a produção.
Bárbara é natural de Belo Horizonte, mas morou durante três anos em Barcelona. Quando atuou em Aquarius, ela ainda vivia na Espanha. Há um ano, a atriz voltou a morar na capital mineira. “Amo BH e foi importante voltar até para aproveitar melhor as oportunidades. Aqui é a minha base e fica mais fácil me deslocar. Muitos projetos estão acontecendo não só no cinema, mas também no teatro e na TV.”
A atriz protagonizou o especial de fim de ano da Globo Minas Dia de reis e tem mais uma produção global em andamento, a série Onde está meu coração, de George Moura e Sergio Goldemberg, dupla responsável por trabalhos como Onde nascem os fortes, O canto da sereia e O rebu. A atração ainda não tem previsão de estreia. No cinema, Bárbara Colen esteve nos filmes Baixo Centro, de Ewerton Belico e Samuel Marotta, e No coração do mundo, de Gabriel Martins e Maurílio Martins. Ela acaba de finalizar sua participação em Breve miragem de sol, dirigido por Eryk Rocha e protagonizado por Fabrício Boliveira. “Os trabalhos estão ficando mais intensos, mas está bacana”, afirma.
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