Inezita Barroso (1925-2015) foi, definitivamente, uma mulher de verdade. Capaz de, em 1956, comandar um jipe com dois marmanjos que não sabiam dirigir e viajar de São Paulo até Belém do Pará fazendo pesquisa sobre o folclore. Capaz também de pagar as contas como professora de violão, dando aulas das 8h às 20h, nas quais ensinava jovens a tocar Jovem Guarda e Bossa Nova – gêneros de que ela não gostava – quando a carreira como cantora desandou. Capaz, ainda por cima, de barrar todo artista que tocasse instrumento elétrico de aparecer em seu programa.
Para boa parte do público, Inezita Barroso foi a apresentadora do Viola, minha viola, da TV Cultura – programa que comandou por 35 anos, até poucos meses antes de morrer. Mas o documentário Inezita, de Helio Goldsztejn, que será lançado nesta terça (16) em Belo Horizonte, no Sesc Palladium, com a presença do diretor, procura fazer um retrato completo da personagem. Ainda que tenha seu nome definitivamente ligado à viola, Inezita também foi atriz, cantora, professora universitária, folclorista, bibliotecária, mãe e avó. E não dispensava uma cerveja e um uísque, ambos sem gelo, para não prejudicar a voz.
“Não queria uma heroína, uma figura endeusada. Queria mostrar a mulher, coisa que descobri por meio dos depoimentos”, afirma Goldsztejn, também diretor do programa Metrópolis, da TV Cultura. Em 2017, o Itaú Cultural realizou a exposição Ocupação Inezita, que recuperou sua trajetória. “Eles nos solicitaram acesso às imagens de arquivo do programa. A partir disso, nos sugeriram um documentário”, conta Goldsztejn, que, além do acervo da Cultura, utilizou o arquivo da própria Inezita (bibliotecária que era, deixou tudo organizado).
ENTREVISTAS O diretor entrevistou ainda 43 pessoas, como as atrizes Ruth de Souza, Nicete Bruno, Eva Wilma e o humorista Ary Toledo, as cantoras Mary e Marilene Galvão e Roberta Miranda, os jornalistas Zuza Homem de Mello e Rodrigo Faour, o cantor e compositor Renato Teixeira, além da filha da biografada, Marta, e das netas Paula, Cristina e Fernanda.
“Na verdade, eu conhecia a Inezita do Viola, minha viola. Ao longo da pesquisa, me descobri completamente fascinado por ela. E até espantado, pois ela optou pela viola ainda criança”, diz Goldsztejn. Inezita é apresentada no filme como uma mulher à frente de seu tempo – “É um chavão, mas ela realmente foi” – capaz de ir contra a família abastada e se tornar atriz (não por acaso, um de seus filmes mais conhecidos é Mulher de verdade, no qual foi dirigida por Alberto Cavalcanti, em 1954) e cantora.
Os casos que surgem por meio dos depoimentos impressionam. Inezita, mais de 80, estava internada com pneumonia, em São Paulo, e se deu alta para celebrar, com o gogó a toda, os 30 anos do Viola, minha viola. Defensora da música de raiz, não abriu exceção alguma em seu programa. Chitãozinho e Xororó só foram convidados para uma edição porque, um dia, a mãe da dupla, fã de Inezita, lhe perguntou a razão de seus filhos nunca terem aparecido lá. Na sequência, vemos a participação dos irmãos, acompanhados somente de violão, viola e percussão. O programa era aberto a todos, desde que fosse da maneira de Inezita.
INEZITA
Documentário de Helio Goldsztejn. Sessões diárias, de terça (16) a domingo (21), às 19h30, no Sesc Palladium – Avenida Augusto de Lima, 420, Centro. A sessão de hoje será comentada pelo diretor. Entrada franca.