Juntos desde 1995 e radicados desde 2000 em Londres, o mineiro Bruno Verner e a paulista Eliete Mejorado formam com o Tetine um caso raro na música eletrônica. Produzem sem parar, sempre juntos, fazendo da música sua principal linguagem. Mas não a única, vale dizer. Sua produção abrange também a performance, as artes plásticas e o audiovisual.
Recém-lançado, Animal numeral é seu 20º álbum. Veio a público neste outubro, um mês depois de outro lançamento, o álbum Tetine vs. Pasolini, registro ao vivo de performance realizada em 2018 no Sesc Paulista, em São Paulo. “Acho que a gente é meio compulsivo. Temos uma necessidade de botar para o mundo o que está acontecendo através do som. Trabalhos mais pop viram disco, trabalhos de performance viram disco. É o nosso jeito de existir como um grupo independente até hoje”, afirma Verner, de 48 anos.
''Eu me vejo como um alienígena. Estou há 20 anos na Inglaterra, mas, mesmo estando incorporado e gostando da minha vida, nunca me senti daqui e nunca me sentirei. Ao mesmo tempo, ainda que me sinta brasileiro, sou sempre um turista dentro do meu próprio país. Esta posição estranha, de diáspora, gera um trabalho que não é todo mundo que aceita''
Bruno Verner, músico
Via de regra, o universo da produção eletrônica dá mais importância às batidas do que propriamente às letras. No Tetine, som e palavra têm igual importância. Em 11 faixas, Verner e Mejorado, recorrendo a synthpop, pós-punk e até mesmo uma pitada de samba versam sobre genocídio (This is the voice), exclusão social (Why bandido), crime (Canibalia), amor e desamor (On ne badine pas avec l’amour).
Na faixa-título, uma das poucas em português, eles pegam emprestado a melodia de Partido alto (Chico Buarque) para um samba torto, pesado, em que cantam “Deixa a poeira passar/Deixe esse samba esticar, deixa eu entrar/Deixa a poeira assentar pro Animal numeral”.
INVENÇÃO
Animal numeral foi todo produzido e gravado pelos dois. Verner, criado no pós-punk, vê a eletrônica como sua “ferramenta de invenção”. “Comecei a fazer música eletrônica nos anos 1980 em Belo Horizonte. Para mim, ela nunca foi só música de pista. É também, mas não o principal. Através dela posso incorporar poesia, melodia, canto”, afirma.
Nascido em BH, ele integrou grupos seminais de pós-punk da cidade, como R. Mutt e Divergência Socialista. Mudou-se para São Paulo no início dos anos 1990 para estudar linguística na USP. Do encontro com Mejorado nasceu o Tetine, que criou toda a sua história em Londres. “Eu me vejo como um alienígena. Estou há 20 anos na Inglaterra, mas, mesmo estando incorporado e gostando da minha vida, nunca me senti daqui e nunca me sentirei. Ao mesmo tempo, ainda que me sinta brasileiro, sou sempre um turista dentro do meu próprio país. Esta posição estranha, de diáspora, gera um trabalho que não é todo mundo que aceita.”
A mais recente apresentação do Tetine em BH foi há dois anos. Em breve, poderá haver outra, já que no início de 2020 Verner e Mejorado devem vir ao Brasil.
Animal numeral
. Tetine
. Slum Dunk Music, 11 faixas
. Disponível nas plataformas digitais e em LP