As afinidades políticas e literárias de Xico Sá, Maria Ribeiro e Gregório Duvivier existiam como amor à primeira vista. Desde sempre. Mas, conta Xico, foi na estrada, no uísque dos camarins e na sinceridade dos palcos que a “banda de rock” afinou e deu liga. Crônicas pra ler em qualquer lugar é o fruto dessa liga. Costuradas por uma introdução escrita a seis mãos, as 43 crônicas reunidas no pequeno livro são um verdadeiro desabafo coletivo sobre os novos tempos. Mistura de textos publicados em jornais com outros inéditos, o livro é o que Xico Sá chama de “ménage à trois da crônica brasileira”.
Além das seis mãos, o projeto tem fígados corajosos, de acordo com Xico. “Hepaticamente falando, confesso que ainda não bebi a cota que Dionísio e Baco me reservaram nesta Terra. Meu problema, como diz a lição de anatomia da música brega, sempre foi o coração”, garante o escritor.
De acordo com o autor de Big jato, a crônica é um gênero literário urgente no Brasil de hoje. Nesse espaço, é possível cultivar a crítica de forma mais leve e pessoal. “Nunca precisamos tanto da crônica de amor, de humor, de sacanagem – a resistência ao falso moralismo – ou, mais diretamente, de política. É isso que nosso livro traz, às vezes com muito lirismo e, em algumas outras páginas, com certa indignação ou desabafo”, avisa o escritor. Para ele, o cronista precisa se expor.
A política pauta boa parte dos textos, mas há reflexões sobre música, cultura, internet, futebol e religião. O tom polêmico faz parte da cartilha dos autores. Em Querido pastor, Duvivier assume a identidade de Jesus para passar um sermão no pastor-deputado e avisar que é de esquerda, já que são os pobres os aptos a entrar no reino dos céus. Maria Ribeiro conta de sua batalha para “virar” votos na eleição de 2018, em Obrigada, Bolsonaro. E Xico Sá faz homenagem a Chico Buarque em Ouvindo o disco novo do Chico. É esse o tom do conjunto de crônicas, que pode ter aspecto de déjà vu, mas ajuda a rir das próprias mazelas.
Quatro perguntas para...
Xico sá
escritor
Você se sente exposto quando escreve crônica ou participa de programas de debate?
Sou do tipo de cronista que se faz personagem nos textos, que se confessa para o garçom, que revela as pequenas glórias e os fracassos, que chora em público e não usa 'óculos escuros para as minhas lágrimas esconder'. Cronicamente exposto. É do jogo. Nos debates acontece a mesma coisa, mas, falando, sou um pouco mais contido do que escrevendo.
É preciso se expor no Brasil de hoje?
Não é obrigação. Cada um é livre para decidir a sua história, mas prefiro me manifestar, provocar, não deixar quieto. Afinal de contas, o momento político é gravíssimo. Como ficar calado diante da censura a livros ou da destruição das universidades? Não dá. Nesse sentido, faço barulho como um morador de Bacurau.
Você participou dos programas Saia justa (GNT), Papo de segunda (GNT) e Amor e sexo (Rede Globo). Agora, faz parte do Redação SporTV, às sextas-feiras. Do que você mais gosta na televisão?
Sigo assombrando os generosos telespectadores somente às sextas, no programa Redação. No começo, por causa da timidez de matuto do sertão, morria de medo das câmeras, mas com o tempo perdi a vergonha. Sempre fui um velho homem do texto, imprensa escrita, que é o que mais amo fazer. Mas com o desmantelamento da nossa profissão, não tem escolha: meto a cara em tudo o que aparece. Afinal de contas, sapo não pula por boniteza, sapo pula por necessidade.
Qual é o seu maior vício?
A única droga pesada que consumo no momento é o Twitter. Ando muito careta na velha trindade religiosa do sexo, drogas e rock'n'roll.
CRÔNICAS PRA LER EM QUALQUER LUGAR
. De Gregório Duvivier, Maria Ribeiro e Xico Sá
. Todavia
. 110 páginas
. R$ 44,90