Rosualdo Rodrigues*
Especial para o Estado de Minas
Desde Vale tudo, uma novela não se propõe a discutir o presente político do Brasil com tanta veemência quanto Amor de mãe. A atual novela das 21h da TV Globo é um assumido folhetim à moda antiga, cheio de coincidências, triângulos amorosos, filho perdido que reencontra a mãe..., mas utiliza isso como ponte para tratar de temas urgentes na atual conjuntura do país.
A associação a Vale tudo não é mero acaso. A trama de Gilberto Braga foi exibida num momento político melindroso – entre 1988 e 1989 –, quando o Brasil, recém-saído de uma ditadura militar, tentava se equilibrar sobre uma nascente democracia e o povo enxergava com mais nitidez os contornos da corrupção. Amor de mãe chega num momento ainda mais trágico, marcado pela ascensão da extrema-direita e uma acirrada polarização política.
Um momento que justifica um discurso ainda mais contundente – reforçado até mesmo em outros programas da Globo, como o humor crítico e as paródias ácidas no Zorra, o drama da ótima série Segunda chamada – que discute os mesmos temas da novela no microcosmo de uma escola pública noturna – ou na novela Bom sucesso, que partiu em defesa dos livros e da leitura.
Só que, além de colocar em pauta a discussão em torno da ética, como fez Gilberto Braga, Manuela Dias, autora de Amor de mãe, vai além. A luta ambiental, a ganância do capital, diálogos feministas ou críticos ao machismo e romances inter-raciais sem um contexto de conflito (alguém pode achar excesso de romantismo da autora, mas ela já disse numa entrevista que foi uma opção pessoal naturalizar o tema), por exemplo, atravessam toda a história.
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Será que a professora terminará misteriosamente assassinada por milícias? É bem provável que não. O público que vibra com Amor de mãe certamente não vai se contentar em ver, no final, Álvaro (Irandhir Santos), o empresário sem nenhuma moral, fugir num jatinho dando uma banana para o Brasil, como fez Marco Aurélio (Reginaldo Faria) em Vale tudo. Os tempos são outros, e a capacidade redentora da ficção nunca se fez tão necessária.
*Rosualdo Rodrigues é jornalista