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Karim Aïnouz lança no streaming longa sobre refugiados confinados

%u2018Aeroporto central%u2019, que acompanha um ano na vida de um iraquiano e um sírio na Alemanha, chega nesta sexta (24) às plataformas digitais


24/04/2020 04:00 - atualizado 23/04/2020 22:21

Um jovem sírio e um pai de família iraquiano são os dois principais personagens do filme. Diretor tem a intenção de rodar uma sequência sobre a história deles na Alemanha(foto: JUAN SARMIENTO/DIVULGAÇÃO)
Um jovem sírio e um pai de família iraquiano são os dois principais personagens do filme. Diretor tem a intenção de rodar uma sequência sobre a história deles na Alemanha (foto: JUAN SARMIENTO/DIVULGAÇÃO)
Primeiro documentário em longa-metragem do cineasta cearense Karim Aïnouz, Aeroporto central traz em seu DNA a surpresa e a ironia, segundo o diretor. “Seria um filme sobre um parque, que virou um filme sobre um espaço para refugiados. Um hangar que existia para consertar aviões de guerra virou um abrigo para quem fugia da guerra.”

Rodado entre 2016 e 2017, lançado no Festival de Berlim em 2018, quando levou o prêmio da Anistia Internacional, o filme chegaria aos cinemas brasileiros no fim do mês passado. Obviamente, não chegou. Vem a público nesta sexta-feira (24), com lançamento nas plataformas de streaming.

Mesmo que não tenha sido esta a intenção original do diretor, Aeroporto central é um longa sobre confinamento. “É um filme sobre uma nova vida da qual não se tem a menor ideia do que vai ser. As pessoas estão confinadas ali contra a sua própria vontade, sem referência do que vai ser o futuro. Esperamos que melhor do que o passado. Então, acho que o filme mostra um pouco do que estamos vivendo agora”, afirma Aïnouz.

O aeroporto central do título é Tempelhof, construído em 1923, no Centro-Sul de Berlim. Seu prédio principal foi considerado uma das 20 maiores estruturas artificiais do mundo. Na década de 1930, o governo nazista promoveu uma grande reestruturação, para fazer dele um símbolo da grandeza alemã defendida por Hitler.

Ao longo de sua história, Tempelhof serviu para testar grandes aeronaves, abrigou prisioneiros da Segunda Guerra Mundial, foi base militar americana. Em 2008, foi desativado como aeroporto. Desde 2010, seu aeródromo deu lugar ao Parque Tempelhof, o maior parque público de Berlim.

A história da utopia urbana, a possibilidade de mostrar uma horta construída em meio a uma pista de pouso foi o que interessou o cineasta,  que há muitos anos se divide entre a Alemanha e o Brasil.

Só que ele acabou descobrindo uma outra história em 2016. Desde o ano anterior, Tempelhof servia como abrigo de emergência de refugiados recém-chegados à Alemanha.

“Foi naquela época em que começaram a chegar as pessoas fugidas da guerra da Síria. Fiquei muito incomodado com o modo como a grande mídia estava cobrindo o assunto, mostrando aquelas multidões entrando no continente europeu. Fui visitar os hangares, e aquilo aconteceu de maneira improvisada. Quando vi, descobri que tinha que documentar aquilo, mostrar a história dos personagens sob uma perspectiva mais íntima.”

(foto: Loic Venance/ AFP)
(foto: Loic Venance/ AFP)

"É um filme sobre uma nova vida da qual não se tem a menor ideia do que vai ser. As pessoas estão confinadas ali contra a sua própria vontade, sem referência do que vai ser o futuro. Esperamos que melhor do que o passado. Então, acho que o filme mostra um pouco do que estamos vivendo agora"

Karim Aïnouz, cineasta


PERSONAGENS 
Dois deles são as figuras-chave do documentário. Ibrahim Al Hussein era, na época das filmagens, um refugiado sírio de 18 anos que havia deixado seu país sozinho. A família continuava numa vila de 3 mil habitantes, na fronteira sírio-turca. Outro é o fisioterapeuta iraquiano Qutaiba Nafea, que chegou à Alemanha com a mulher e usou seu inglês fluente para atuar como tradutor no trato entre os recém-chegados e os alemães.

Mas o acesso não foi simples, Aïnouz comenta. “Naquele momento, era um entra e sai de televisão, ninguém queria ser filmado. Havia até aqueles que queriam destruir as câmeras. O que fiz foi ir uma vez por semana nos hangares, durante seis meses, para entender quem queria contar sua história.” Assim ele chegou aos dois protagonistas, e aos outros tantos personagens que vão construindo o filme.

“O Ibrahim me encantou justamente por ele representar o ‘vírus’, o jovem árabe que chega para tomar o emprego dos outros, explodir tudo. E, na verdade, era o contrário. Era apenas um garoto que tinha fugido da guerra com a esperança de encontrar uma vida melhor”, diz o diretor sobre o jovem sírio, que atuou também como narrador da história.

O cineasta rodou o documentário com uma equipe mínima: apenas ele, o fotógrafo colombiano Juan Sarmiento e a produtora espanhola Eva Schulthess, todos estrangeiros residentes em Berlim.

“Ficávamos ali, sempre com alguém fiscalizando a gente, filmando durante três dias. No começo, não gostavam, reclamavam, mas, depois de seis meses o povo se acostumou, pois não éramos mais novidade.”

A câmera não é a dos documentários jornalísticos, que vai atrás da notícia. Está a maior parte do tempo parada. “A gente dizia que ia ‘pescar’. Vamos ver se alguém se aproxima, para aquilo virar um campo de empatia.”

Sem entender nada de árabe e muito pouco de alemão, Aïnouz revela que não sabia o que estava filmando. “Era na intuição.” A história só foi se desenhando na montagem, quando as falas foram traduzidas.

Aeroporto central apresenta um ano na vida daqueles que viveram em Tempelhof – dos sete hangares, três deles se tornaram abrigos, com capacidade para até 7 mil pessoas. Em árabe, Ibrahim vai conduzindo a narrativa mês a mês, mostrando a mudança climática, a chegada e a partida daquelas pessoas, e também como tudo, a despeito do tempo, continuava igual. Há também grandes planos abertos, que dão a dimensão do tamanho daquele espaço.

CINEMA 
O documentário foi lançado no cinema na Alemanha e na França e vendido para televisões estrangeiras. De acordo com Aïnouz, Aeroporto central chegaria às salas brasileiras ainda em 2018. Mas acabou atropelado pela produção de seu longa de ficção A vida invisível.

 “Apresentei o documentário um dia no Festival de Berlim e, no dia seguinte, estava no Rio de Janeiro fazendo a pré-produção do filme. Ficou muito emendado, daí resolvi esperar.”

Nesses dois anos, Aïnouz não parou. Filmou e lançou A vida invisível (2019) e o documentário Nardjes A., que teve première em fevereiro passado, na mostra Panorama, do Festival de Berlim.

Nardjes A. acompanha uma ativista argelina em meio às manifestações populares daquele país e nasceu durante a produção de outro filme, Argelino por acidente (título provisório). Esse último filme remonta à história dos pais do cineasta – ele, um engenheiro argelino; ela, uma bioquímica brasileira.

A despeito do confinamento em decorrência da pandemia do novo coronavírus, Aïnouz diz que está “a 200 mil por hora”. Em meio aos projetos em andamento, sonha em, no futuro, dar sequência à história dos protagonistas de Aeroporto central.

“Como é um filme sobre a chegada, queria seguir com outro, falando de como é viver em um lugar novo, como é a interação com a cultura alemã.” O que o documentário não diz é o que ocorreu com seus principais personagens.

Aqui, Aïnouz dá um spoiler: Ibrahim gerencia uma cadeia com oito salas de cinema em Berlim e Qutaiba, que teve sua primeira filha na Alemanha, trabalha na área de marketing de uma empresa de internet.

AEROPORTO CENTRAL
Documentário de Karim Aïnouz. Estreia nesta sexta-feira (24), nas plataformas de streaming Now, Vivo Play, Oi Play, Itunes, Google+, Filme Filme e Looke.


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