Se tem alguma coisa para comemorar neste período em que não há nada bom para ninguém é que os Rolling Stones conseguiram, com uma só canção, exprimir sentimentos que vêm perpassando por todos nós durante o longo período de isolamento social. “Eu sou um fantasma/ Vivendo em uma cidade fantasma” canta Mick Jagger logo no início de Living in a ghost town.
Divulgada esta semana, é a primeira faixa inédita da banda em oito anos, seu melhor lançamento em mais de uma década. Não custa lembrar que o álbum mais recente com material inédito, A bigger bang, já tem 15 anos. Ninguém é bobo de achar que Jagger, Keith Richards, Ron Wood e Charlie Watts, tão separados estavam na apresentação do Together at home, no sábado passado (18), se reuniram para gravar esta canção que cai como uma luva nos tempos de COVID-19.
Jagger revelou ter escrito Living in a ghost town em 10 minutos. A gravação ocorreu em Los Angeles e Londres, em 2019, a finalização se deu agora, durante o período de distanciamento social. Um vídeo da canção mostra, em preto e branco, os Stones em estúdio. Mas o que chama a atenção são as imagens quase caleidoscópicas registradas nas últimas semanas, que exploram vários cantos de Londres completamente vazios.
A letra é absolutamente premonitória: “Eu tive que ir para o subterrâneo/ A vida era tão bonita/ Então fomos todos trancados”, diz uma parte. “Não está sendo divertido/ Se quero uma festa/ Será uma festa apenas para um”, diz a estrofe final. Eles poderiam estar falando sobre a nostalgia de tempos passados que a velhice interrompeu, quem sabe? Fato é que o lançamento, agora, deu outra conotação para a letra.
Para além da sincronicidade com os tempos vividos, há a música em si. E ela deixa o blues do álbum de covers Blue and lonesome (2016, mais recente lançamento da banda) para abraçar o reggae, ainda que com muita sutileza. Há um leve sotaque dub em algumas passagens. Que dias ensolarados venham para nos tirar das cidades fantasmagóricas.