
“Não aguento mais ficar trancada em casa. Não vejo a hora de voltar aos ensaios.” O desabafo é de Teuda Bara, uma das fundadoras do Grupo Galpão, que se tem desdobrado para cumprir rigorosamente a quarentena.
“Às vezes, vou até minha janela e recito umas poesias para a vizinhança. Também vejo TV, escuto música, leio. Mas como sou inquieta, é realmente difícil pra mim”, revela. Porém, Teuda está conformada: “Vou completar 80 anos em 2021, não posso brincar com a saúde. Se é para ficar em casa, então vamos ficar.”
Dona de sonora gargalhada e famosa pela agitação, Teuda se desdobra para cumprir o isolamento social. “Nunca vivi algo assim. Não tenho muita paciência para ficar quieta. É muito chato permanecer em frente a uma tela, ficar ali apertando botões”, reclama, contando que detesta as parafernálias eletrônicas. “Tive uma resistência enorme a entrar no WhatsApp, mas hoje consigo dominar a fera. Essa é a única rede social que tenho. Para ser sincera, não gosto das outras.”
Teuda diz que as redes são “muito chatas” porque estimulam as pessoas a bisbilhotar a vida alheira. Por isso, ela se limita ao WhatsApp – e olhe lá. “Não quero outras redes, pois vão ficar dando palpite na minha vida. Porém, agora somos obrigados a esse isolamento social, um inferno para o artista”, comenta.
A atriz do Galpão passou uma terça-feira triste devido à morte do colega Flávio Migliaccio, na segunda-feira. O ator, de 85 anos, deixou à família uma carta relatando sua desesperança com o mundo e o Brasil. “Isso me deixou muito machucada, o recado dele foi muito contundente”, diz.
ENSAIO
Teuda lamenta que a quarentena tenha interrompido os ensaios presenciais de Quer ver escuta, o novo trabalho do Galpão. “Trata-se de um espetáculo sobre poemas que estrearíamos em abril, no Festival de Curitiba. Nele, a gente usa a poesia de todos os jeitos”, explica.
O isolamento social exige que a trupe agora ensaie por meio do aplicativo Zoom, cada um em sua casa. “Não é a mesma coisa, claro, mas seguimos trabalhando, ansiosos para que isso tudo passe logo e a gente possa cumprir a agenda.”
A 25ª montagem do Galpão nasceu do projeto Experimentos cênicos, realizado pelo grupo em sua sede, em Belo Horizonte. “Vamos levar à cena a poesia viva do Brasil contemporâneo. Serão encenados textos da nova geração de poetas de todas as partes do Brasil, numa mistura de teatro, literatura e performance”, diz Teuda.
A atriz lembra que, durante a quarentena, o grupo vem apostando em projetos on-line para ficar perto de seu público. “Estamos disponibilizando espetáculos em nossa página no YouTube. Os atores fazem leituras dos textos ligados ao processo de pesquisa da nova peça”, ressalta. Ao se despedir do repórter, Teuda faz questão de mandar um recado para o público: “Por favor, fiquem em casa. Vamos escutar o que diz a Organização Mundial da Saúde. Não brinquem com coisa séria!”