Sérgio Sant´Anna ainda não tinha 35 anos quando foi convidado para compor a equipe de professores da recém-criada Faculdade de Comunicação Social da Universidade Católica de Minas Gerais, a PUC Minas. Seu primeiro diretor, o jornalista Lélio Fabiano dos Santos, apresentou a Sérgio uma faculdade de proposta inovadora, fundada na liberdade de pensamento e debate naqueles difíceis tempos da ditadura militar.
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Como professor, Sérgio Sant´Anna também era uma atração à parte, mesmo numa faculdade voltada para a liberdade de pensamento e criação. Ele escrevia com giz no quadro negro, como era o costume nas escolas da época, mas como se não aceitasse a efemeridade dessa escrita, preferia não apagá-la, ao acabar o espaço, e passava a escrever nas paredes, feitas de chapas de MDF ainda sem pintura. E ali sua caligrafia permanecia, como sua literatura permaneceu na memória e no coração dos estudantes que conviveram com ele.
Para mim, um estudante de jornalismo mal saído da adolescência e interessado em literatura, ter sido aluno de Sérgio Sant´Anna foi uma dádiva que me desperta o desejo de prestar-lhe uma justa, embora inútil, homenagem. Ele me apresentou grandes escritores que eu ainda não conhecia, apontou caminhos para minha escrita, ensinou que bem escrever não se aprende estudando teoria ou gramática, mas se abrindo ao prazer da leitura e à descoberta da técnica implícita nos textos dos grandes escritores.
Talvez por isso eu tenha lido, e releia, toda sua obra, marcada pela mistura de várias linguagens artísticas e de ficção e memória. Uma fonte inesgotável de descobertas literárias. Dois semestres que marcaram minha vida.