Reunir os amigos para fazer um som sempre foi o passatempo preferido de Regina Souza. O clima descontraído desses saraus é a marca de vários trabalhos da cantora. No final dos anos 1990, ela, Marina Machado e a fotógrafa Márcia Charnizon montaram o espetáculo Hebraico, registrado em disco, hoje esgotado. Mantendo a vibe de juntar a turma, Regina reuniu outros amigos em seu quarto álbum, Chegaí. Em 25 de junho, o primeiro projeto completamente autoral da mineira será lançado nas plataformas digitais.´
A opção pelo álbum de inéditas, 19 anos depois do lançamento de Regina Spósito, o disco de estreia, é o reflexo do fim de um ciclo de transformações vividas desde 2013. As 13 faixas de Chegaí foram compostas entre 2018 e 2020, período que a cantora define como “menos pesado, com mais ar”.
“Levei tempo para elaborar o luto, muita mudança aconteceu em minha vida. Passei muito tempo comigo, sempre escrevendo. Quanto mais escrevia, mais leves as coisas ficaram”, diz Regina. Em 2016, a cena musical brasileira sofreu um baque com a morte repentina do cantor e compositor Vander Lee, aos 50 anos, ex-marido dela e pai de sua filha Clara.
“O disco está solar”, comenta Regina, animada com o resultado do novo som, feito com Du Macedo (violão, guitarra, cavaquinho, vocais e arranjos), Claudio Queiroz (bateria e percussão) e Fred Jamaica (baixo e vocais).
Com as letras em mãos, Regina apresentou seu trabalho autoral para a preparadora vocal Babaya, que a incentivou a seguir em frente. Inicialmente, ela não pensava em disco. Porém, o álbum ganhou vida quando participou do projeto Roda de Samba da Babaya e conviveu com o diretor musical Du Macedo.
ENSAIOS “O Du chamou o Claudinho, que chamou o Fred. Os meninos vieram, começamos a ensaiar até perceber que tínhamos uma história bacana. As músicas estavam no ponto para serem apresentadas em um show”, relembra Regina.
Com a inauguração da Casa Outono, criada por amigos no Bairro Carmo, ela e sua banda fizeram três apresentações, mesclando o repertório de álbuns anteriores de Regina às novas músicas. Do palco para o estúdio, foi tudo muito rápido. Com passagem de avião já marcada para a cidade do Porto, em Portugal, onde Regina estudaria filosofia, a turma não podia perder tempo.
“Apesar de falar de coisas boas e difíceis da vida, não sinto peso nesse disco. Sempre vejo o lado bom das coisas. Fico atenta às minhas inspirações, tenho muitos amigos e, principalmente, me agarro na espiritualidade. Cada vez mais tranquila, menos ansiosa”, conta ela.
Regina Souza diz já ter material para um novo trabalho autoral. Porém, antes de voltar ao estúdio, sabe que precisa esperar, torcendo para que Chegaí seja bem aceito. A COVID-19 não vai atrapalhar a agenda. “Primeiro quero sentir a resposta do público, que as pessoas conheçam o trabalho. Não vou passar o carro na frente dos bois. Acho que a pandemia vai nos deixando mais reflexivos. Com tanta coisa acontecendo, ficou tudo muito pequeno”, pondera a cantora.
TENSÃO O ano de 2020 trouxe um novo horizonte para Regina. Aluna do curso de filosofia da PUC Minas, em Belo Horizonte, ela foi estudar em Portugal graças a um acordo de cooperação da universidade com instituições do exterior. Um mês depois de desembarcar no Porto, o confinamento social foi decretado pelo governo português. “No começo, era muito tenso. Saí no Dia das Mães, a perna ficou bamba e fiquei muito insegura”, relembra.
No Porto, Regina divide apartamento com os integrantes do grupo Lúdica Música, de Juiz de Fora. “Incrível como eles me acolheram, como somamos experiências de vida”, comenta.
A mineira volta para o Brasil em julho, mas não sabe se retornará a Portugal no segundo semestre, como estava previsto. “Está tudo muito incerto, é difícil tomar uma decisão agora”, comenta.
O avanço do coronavírus abalou Regina. Para se adaptar às aulas virtuais, ela teve de abandonar uma das quatro matérias. “Ouvíamos as informações sobre números de mortos na Espanha e na Itália, dava muita tristeza, muita ansiedade. Pensávamos que quando chegasse ao Brasil, seria uma catástrofe. A pandemia é maior do que a gente. Temos de aprender a lidar com ela.”
Para Regina, o mais grave de tudo é o fato de o vírus afastar as pessoas. “O ser humano é um ser de relações, não é para ficar sozinho. Ainda bem que temos a internet, as chamadas de vídeo ajudam demais.” No entanto, ela pondera: “Será que a humanidade vai entender que algumas coisas precisam mudar de rota? Será que isso vai acontecer? Algumas mudanças ainda vão demorar muito séculos.”
Otimista, a cantora tem fé em dias melhores. “Está havendo uma mudança lenta. Ela não vem em massa, vem nos pequenos grupos, mais conscientes, que vão espalhar suas ideias para os outros. Esse trabalho de rede de consciência está ocorrendo nas lutas contra o preconceito, o racismo, a fome e a miséria. E também em favor da alimentação saudável.”
BETINHO Regina tem outros projetos, além de Chegaí. A animação Zeropeia, baseada nos livros de seu tio, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, terá continuação com músicas inéditas de Flávio Henrique, Tizumba, Affonsinho e Vander Lee, além de canções de Zeca Baleiro e Flávio Renegado.
E Hebraico, o disco esgotado, lançado há 22 anos, deve chegar agora ao Spotify. Para os fãs, outra boa notícia: há um registro daquele show. “Sempre tive a mania de registrar tudo. Hoje, a Marina (Machado) dá graças a Deus por eu ser assim”, diverte-se Regina.
CHEGAÍ
De Regina Souza
Lançamento na quinta-feira (25), nas plataformas digitais