Jornal Estado de Minas

PLANO B

Festivais de cinema on-line contabilizam recorde de público


O Festival Internacional do Filme de Animação de Annecy, na França, maior do mundo no gênero, entregou os prêmios de sua edição 2020 no último domingo (21). A produção franco-dinamarquesa Calamity: A childhood of Martha Jane Cannary, de Rémi Chayé, levou o Cristal de melhor filme. Trata-se da cinebiografia animada de Calamity Jane (Jane Calamidade),  famosa aventureira do Velho Oeste norte-americano.





Acostumado a receber milhares de pessoas anualmente na pequena cidade localizada nos Alpes, o festival deste ano poderia simplesmente não ter sido realizado, já que, diante da pandemia do novo coronavírus, o governo francês vetou aglomerações e impôs rígidas medidas de isolamento social. Annecy, no entanto, optou por seguir adiante com sua programação de filmes, debates e a cerimônia de premiação – tudo transmitido on-line. O catálogo de filmes selecionados continuará disponível até o próximo dia 30 para todos os territórios. O acesso é liberado mediante pagamento de taxa de cadastro, no valor de 15 euros (R$ 87,60).

SOLIDARIEDADE

Com grande interesse do público asiático, é provável que o festival francês, criado em 1960, tenha alcançado sua maior audiência neste ano. “A comunidade de artistas e profissionais da indústria da animação tem sido extraordinária. Eles demonstraram grande solidariedade e nos deram asas. Paradoxalmente, o papel unificador desempenhado por Annecy nunca foi tão forte quanto neste momento desafiador”, declarou o diretor do festival, Mickaël Marin, à imprensa europeia.

No Brasil, com sua edição 2020 também prevista para o período da quarentena, o Brasília International Film Festival (BIFF) foi do desespero ao recorde. A sétima edição da mostra estava marcada para abril, um mês depois do início da quarentena no Brasil, que levou ao cancelamento dos eventos culturais.





Com uma programação que incluía estreias aguardadas, como a do filme polonês indicado ao Oscar Corpus Christi, o BIFF também apostou no formato on-line. Em cinco dias no ar, o festival registrou mais de 50 mil acessos na plataforma de exibição. A edição presidencial de 2018 recebeu 8 mil pessoas em 10 dias de evento.

Resultados como esse indicam que o futuro dos festivais será digital? “Será uma tendência, até porque o mundo não será mais o mesmo, mas festivais são encontros, feitos da festa do encontro, com debates, pessoas de diferentes lugares. Eles existem para ser uma vitrine nacional e internacional, mas também para se mergulhar numa programação que não é feita só de filmes”, argumenta Anna Karina, diretora do festival brasiliense.

Anna Karina avalia que tomou a decisão acertada ao optar pelo festival virtual. “Tivemos uma resposta muito boa, mantendo a premiação e resolvendo toda a questão complicada de entendimento e negociação com realizadores, para garantir a exibição, proteção de pirataria, que ainda é difícil, mas tivemos muito apoio, até pela pauta mundial do ‘fique em casa’, já que o BIFF foi num momento em que o mundo todo estava em quarentena.”





Ela vê com otimismo a chance de “chegar na casa de mais gente” e cita que os filmes do BIFF, disponibilizados gratuitamente na plataforma Looke durante os dias do evento, foram vistos por pessoas de todas as regiões brasileiras. A intenção agora é uma versão on-line nas futuras edições do evento.

Por outro lado, Anna Karina salienta a importância da realização presencial. “Se passarmos a ter festivais só on-line, o que será feito para fomentar o turismo? Há toda uma cadeia profissional envolvida em um festival. O on-line comporta todo mundo? Além disso, não há a mesma resposta do público. Pode ter votação, comentários, mas, para o realizador, sem a tela grande e a sala não é a mesma coisa. Ainda que haja curadoria na internet, festivais como o de Tiradentes pautam lançamentos durante o ano todo. Mexe muito com a distribuição. Se tudo for on-line, deixa de ser 'Tiradentes', 'Brasília', 'Gramado'. Não podemos deixar de existir como festivais”, argumenta.

Outros festivais no Brasil e no mundo anunciaram que vão aderir ao modelo virtual para garantir sua realização neste ano. O Festival Internacional de Toronto promete uma edição híbrida para setembro, misturando programação on-line com eventos presenciais, dentro do possível, dependendo da situação da crise sanitária.





Principal evento brasileiro dedicado aos gêneros fantástico e terror, o Fantaspoa, realizado anualmente em Porto Alegre, anunciou que este ano será totalmente on-line e gratuito. Os mais de 110 filmes da programação serão disponibilizados entre 24 de julho e 2 de agosto na plataforma Darkflix.

Mostras menores também migraram para o formato durante a pandemia. Até 9 de julho, a Fundação Clóvis Salgado exibe Clássicos do Cinema Japonês totalmente on-line. São 10 produções do país asiático transmitidas “ao vivo” pelo canal da fundação no YouTube, ou seja, só é possível assistir em um horário específico. Uma alternativa enquanto o Cine Humberto Mauro, em Belo Horizonte, está fechado. A grade de programação está disponível no site www.fcs.mg.gov.br .

O Sesc também está com programação cinematográfica gratuita, pela mostra #EmCasaComSesc, em uma plataforma própria de vídeos sob demanda, acessível em sescsp.org.br/cinemaemcasa. Nesta quinta-feira (25), entram quatro novos títulos no catálogo, entre eles Paterson, de Jim Jarmusch, estrelando Adam Driver.





Outra saída utilizada no momento é o drive-in, no qual o público comparece sem sair dos automóveis. Será o caso do Festival de Brasília, o mais antigo do país, que quase teve sua 53ª edição cancelada por falta de recursos. Na última sexta-feira, o governo do Distrito Federal confirmou a realização da mostra. Será em “outubro ou novembro” e em formato híbrido, com filmes exibidos em plataformas digitais e também no Cine Drive-In da capital federal, inaugurado em 1973. O local já tem recebido mostras comerciais durante a pandemia.

O Festival de Brasília anunciou que terá sessões em espaço drive-in da capital federal, além de exibições no streaming (foto: Evaristo Sá/AFP)

MÚSICA

Esse tipo de estrutura pode abarcar não só o cinema, mas também eventos musicais. Uma das maiores produtoras de shows do mundo, a Live Nation anunciou seus primeiros espetáculos de verão no Hemisfério Norte no modelo, em que os espectadores assistirão aos shows de dentro de seus carros. Os músicos country Brad Paisley e Darius Rucker estarão entre os artistas que encabeçam a série de apresentações, junto com o rapper e cantor Nelly, que comemora o vigésimo aniversário do álbum Country grammar.

De 10 a 12 de julho, o festival Live From the Drive-In terá nove apresentações, nas cidades de St. Louis, Nashville e Indianapolis. Será permitido ao público levar suas próprias cadeiras, comida e bebidas para aproveitar os shows nos estacionamentos em frente ao palco. Cada carro irá dispor de um espaço demarcado, onde poderá estacionar para garantir o distanciamento social entre o público, disse a produtora. A capacidade será para 600 a mil carros, dependendo da cidade

Apesar da “nova realidade” dos eventos, a Europa começa a retomar o funcionamento dos cinemas. Na França, as salas reabriram na segunda-feira (22), seguindo protocolos de distanciamento entre o público, uso de máscaras e álcool em gel. No Reino Unido, a reabertura está prevista para o próximo dia 4.





No Brasil, a realização de eventos culturais e a reabertura de cinemas, teatros e galerias seguem sem previsão. Diante desse cenário, alguns eventos que mantinham sua previsão de realização no segundo semestre começam a oficializar o cancelamento. É o caso do Festival Sarará, em Belo Horizonte. Inicialmente previsto para agosto, ele tinha sido adiado para o fim do ano. Mas na terça-feira (23) a organização confirmou que a próxima edição ocorrerá apenas em 28 de agosto de 2021. Os ingressos já adquiridos passam a ser válidos para o ano que vem. (Com agências de notícias)