Fernanda Gomes*
O Monobloco enfrenta o coronavírus com batucada – agora virtual –, disposto a não deixar o samba morrer, apesar da possibilidade de cancelamento do carnaval em fevereiro de 2021. Considerado um dos maiores blocos de rua do Brasil, o grupo carioca, criado em 1996 pela banda Pedro Luís e A Parede (Plap), costumava fazer shows durante o ano para manter seus músicos. Mensalmente, promovia oficinas percussivas em Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo, entre outras cidades, formando batuqueiros para alegrar a folia. O isolamento social pôs fim a essa agenda. Mas as aulas continuam.
Celso Alvim, maestro da bateria, diz que oficinas on-line se transformaram na única fonte de renda do Monobloco, que reúne multidões durante seus desfiles. “Estamos tentando nos ajudar, entrar em contato com a galera, mas é um momento bem difícil”, afirma.
DE CASA
Se a pandemia pôs fim às oficinas presenciais, as atividades virtuais ganharam força. “O desafio está sendo bem legal. Antes, os alunos chegavam (ao local da aula) e já tinha aquela música sendo tocada. Agora, no on-line, é o aluno em casa, mandando vídeo e mostrando o que está tocando”, explica Alvim.
Um dos pontos positivos das aulas virtuais é estimular a autonomia dos oficineiros. “Você passa a enxergar o aluno de forma mais individualizada. Às vezes, na bateria coletiva, fica um pouco complicado prestar atenção em cada um”, diz.
A oficina on-line permite reunir em uma só “sala” os 200 alunos de Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro. Celso Alvim, aliás, já planeja manter o sistema on-line quando as aulas presenciais forem retomadas.
Por enquanto, as duas centenas de vagas foram preenchidas. “Como ainda é uma novidade, ficamos receosos de abrir. Talvez em setembro teremos novas turmas”, informa Celso.
Mas o Monobloco é democrático. A quarentena inspirou o projeto Batuque Criativo, que desafia o fã a inventar sons dentro de casa. Vale tudo: panela, garrafa, lata de biscoito, balde, colher e porta-guardanapo. Celso, por exemplo, convida todo mundo a usar a máquina de lavar roupas como parceira. No Instagram do Monobloco, ele batuca a lavadora de sua casa, enquanto canta o xote Ovo de codorna, sucesso de Gonzagão. Em outro post, usa hashis ( aqueles pauzinhos japoneses), panela e garrafas para a performance de Andar com fé, de Gilberto Gil.
Num vídeo enviado por um fã, pandeirista faz animado improviso com com a máquina de lavar roupas – ela, em funcionamento. Em outro post, o compositor Pedro Luís, “puxador” do Monobloco, usa uma embalagem de cosméticos azul para cantar Morena tropicana, hit de Alceu Valença. “Isto aqui é uma zabumbinha de lata”, ensina. Sidon Silva, fundador do bloco, “toca” um tabuleiro. “Depois de catar o feijão, mete bronca na batucada!”, diz.
“Quem é músico, ainda mais percussionista, está o tempo inteiro batucando em algo. Ficamos sempre ligados no som e em certos ritmos que os aparelhos domésticos fazem”, brinca Celso.
Em outra frente, o Monobloco já planeja folia virtual para fevereiro de 2021. “Teremos vídeos editados dos nossos alunos, talvez façamos uma live na época do carnaval. Acho que os outros blocos também farão movimentação on-line bacana. O público estará em casa, mas com vontade de curtir”, acredita Celso.
Na opinião do maestro do Monobloco, a folia pode ganhar nova data ainda no primeiro semestre de 2021. “Levo fé que vamos ter carnaval, que poderemos sair para a rua. Vai ser uma redenção para a cultura, que tem sido tão demonizada por alguns, embora seja tão necessária nestes tempos de pandemia.”
Alvim acredita que até o fim do primeiro semestre de 2021 a vacina da COVID-19 estará sendo distribuída, permitindo o carnaval fora de época. “Agora, sou completamente contra fazer algo que coloque a segurança das pessoas em risco”, avisa o percussionista.
MINEIRÃO
Comandar o Monobloco é um desafio, principalmente nestes tempos avessos a multidões. “Durante os desfiles de carnaval, costumamos reunir em torno de 200 mil pessoas em São Paulo e umas 300 mil no Rio. Mas o nosso maior público nos últimos anos está em Belo Horizonte. No entorno do Mineirão, saímos com cerca de 400 mil pessoas. São desfiles superlegais e a gente espera poder manter isso”, reforça Celso.
Porém, o maestro tem dúvidas sobre a folia pós-COVID. “É difícil saber como as pessoas vão encarar o carnaval. Será uma coisa melhor por causa do sentimento reprimido, ou algo com medo? Talvez seja a mistura dos dois, mas a gente vai fazer a nossa parte da maneira mais segura possível”, promete Celso Alvim.
* Estagiária sob orientação da editora-assistente Ângela Faria
#BATUQUE CRIATIVO
Informações: @monoblocooficial