Enquanto o isolamento social se prolonga, a situação de grupos de teatro alternativo de Belo Horizonte se torna cada vez mais complicada. Sem patrocínio fixo e impossibilitadas de se apresentar, companhias enfrentam graves problemas para manter as próprias sedes.
“Com a pandemia e este mundo caótico que estamos vivendo, todos os nossos espaços foram fechados e muitos perderam o emprego. Toda a cadeia produtiva em torno dos grupos de teatro foi atingida”, afirma Léo Quintão, um dos fundadores do Movimento de Espaços de Teatro Dança e Circo (Meta). Além dos atores, técnicos de luz e som, produtores, costureiras e vendedores ambulantes vêm sendo prejudicados com o fechamento dos espaços.
O Meta, criado em 2016 para atender profissionais de BH, passou a abrigar artistas de todas as regiões de Minas, com a chegada da pandemia. “Era importante que os grupos se organizassem para conseguirmos sobreviver minimamente”, explica Léo.
A esperança do setor é a liberação do dinheiro previsto na Lei Aldir Blanc, aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente da República. “Já estamos fechados há cinco meses e meio, mas a documentação (referente à disponibilização dos recursos) ainda não saiu”, adverte o ator.
EMERGÊNCIA “O que nos incomoda muito é o fato de as esferas estadual, municipal e federal não entenderem o significado real da emergência. Existe uma burocracia enorme em volta da Lei Aldir Blanc. Foram várias vitórias desde a aprovação da lei, mas o processo está muito demorado”, afirma Léo. “A burocracia está matando a cultura”, denuncia.
Quando o dinheiro for liberado, a capital mineira deve receber cerca de R$ 15,8 milhões para serem destinados ao setor cultural. A Prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Secretaria Municipal de Cultura e da Fundação Municipal de Cultura, criou o Comitê de Acompanhamento da Implementação da Lei Aldir Blanc, com 23 integrantes, entre representantes do setor artístico e do poder público.
A proposta é assegurar “a construção democrática das estratégias de repasse dos recursos” e “promover a aplicação dos benefícios de modo eficaz, assegurando apoio efetivo aos profissionais da cultura”, informa nota da secretaria.
A primeira reunião do comitê vai ocorrer entre 17 e 21 de agosto, por meio de plataformas virtuais. “É preciso lembrar que esse dinheiro já estava separado para a cultura. O artista não vai recebê-lo de presente, ele terá de prestar contas e depois fazer a contrapartida. Isso já faz parte do nosso ofício. O dinheiro não é dado”, reforça Léo Quintão.
LUZ E ÁGUA Ator da Cia. Pierrot Lunar, Léo Quintão diz que o grupo, que mantém há 12 anos sede própria no Bairro Floresta, enfrenta grave crise. “Cortamos luz, água, internet. Desligamos tudo e conseguimos negociar com o proprietário a redução no valor do aluguel”, informa. Para ajudar nas despesas, o grupo faz “vaquinha” on-line (https://benfeitoria.com/espacoaberto).
“A resistência dos artistas e espaços não é nova. Com a pandemia, isso só se externaliza e traz luz a ações que já são históricas. As pautas são as mesmas”, reclama o ator e gestor cultural Rogério Gomes. Ele é um dos responsáveis pelo Espaço Cor(tição), em Venda Nova. O local é compartilhado pelos grupos Cóccix, do qual Rogério faz parte, e Teatro Negro e Atitude.
“Há o risco iminente de fecharmos. Estamos conseguindo dialogar com a proprietária do imóvel, até porque ela nos conhece há anos. Mas o aluguel está atrasado e não sabemos quanto tempo iremos aguentar”, lamenta o ator.
GRUTA! Toda Deseo, grupo criado em 2013, também busca resistir. “Temos muitas expectativas e nenhuma perspectiva. Fazemos ações on-line, mas sem nenhum dinheiro envolvido. Estamos tentando nos fortalecer como coletivo, sem grana. Tentamos nos fortalecer internamente para que, no pós-pandemia, possamos voltar com mais força”, conta Rafael Bacelar, um dos fundadores da trupe.
O grupo é responsável pelo espaço A Gruta!, na Zona Leste de Belo Horizonte, marco da cena alternativa. “É um local muito importante, com mais de 10 anos de história. Vários grupos já passaram por la”, ressalta Rafael.
A Gruta! quase fechou as portas. Isso só não ocorreu devido a uma “vaquinha” on-line. “Ela está nos ajudando a segurar as pontas”, diz Rafael Bacelar.
*Estagiária sob supervisão da editora-assistente Ângela Faria