As mulheres conquistam cada vez mais espaço no universo da mixagem musical. Nestes dias de pandemia e público confinado em casa, as DJs comandam bailes virtuais que vêm chamando a atenção para o talento feminino. Coletivos se organizam e fazem bonito nas redes sociais. Exemplos disso são o grupo Djeias, em Minas Gerais, e UHmanas!, em São Paulo.
“Estou fazendo lives para matar a saudade das boates. Porque não ganho nada, até pago para tocar por causa da luz e da internet”, brinca a DJ Black Josie, que também é professora de música.
Essa mineira, que trabalha há cerca de 20 anos na noite de Belo Horizonte, fundou o coletivo Djeias. A ideia surgiu em 2008, quando ela se apresentava no Galpão Cine Horto e frequentava festas na Gruta. “Ali nasceu o coletivo. Convidamos mulheres que não eram DJs a se aventurarem na noite. A gente dava um curso rapidinho e muitas delas se tornaram DJs depois disso”, conta Josie.
CANAL Em 2018, o coletivo fez uma pausa nas festas e eventos. Mas veio a pandemia, que trancou todo mundo dentro de casa, e as Djeias voltaram à ativa. Elas articulam o lançamento de um canal no YouTube.
“O coletivo está voltando agora. Já que não tem boate por enquanto, não vamos ficar paradas. Vamos criar um canal de produção de conteúdo para as mulheres da arte”, adianta Josie.
Com estreia prevista para 22 de setembro, o canal das Djeias transmitirá entrevistas com artistas, programas temáticos sobre ritmos musicais e apresentações teatrais. “Vai ser algo simples, que trabalhará a transversalidade. Teremos mulheres e homens; pessoas não binárias; mulheres e homens cis. Queremos uma equipe diversa”, explica Black Josie.
A DJ comemora o fato de várias artistas de BH apoiarem o projeto. “A galera com problemas de grana vem se envolvendo neste trabalho, que não dará dinheiro para ninguém”, conta ela. Entre as integrantes estão Fê Linz, Nathalia Mitre, Chica Reis, Mary An, Isabella Figueira, Juliana Abreu, Dadá Scáthach, Flávia Virginia, Nath Leles, Gaya Dandara e Flávia Ellen.
Mary An trabalha profissionalmente como DJ há dois anos. De acordo com ela, graças ao surgimento dos coletivos, tornou-se mais fácil para a mulher ingressar no mundo da discotecagem.
“Antigamente, você precisava fazer curso ou conhecer alguém. De uns cinco anos para cá, começaram a pipocar coletivos para ajudar. Acabou que, hoje em dia, todo mundo é DJ, inclusive eu”, diz.
Antes da decretação do isolamento social, Mary An tocava em festas quase todos os fins de semana. “A pandemia virou tudo de cabeça para baixo. Na semana em que a quarentena começou, eu tinha duas festas e cancelaram. A gente se viu dentro de casa sem fazer nada”, lamenta.
Sem poder se apresentar presencialmente, a saída foi migrar para as plataformas on-line. “No início, eu não tinha a mínima noção de como fazer. Quem se adaptou está aí até hoje, quem não se adaptou caiu no ostracismo”, comenta Mary An.
A mineira diz que Black Josie foi uma das pessoas que lhe ensinaram fazer festas on-line. “Agora tenho de dois a três compromissos por semana”, comemora.
TWITCH Em São Paulo, o coletivo UHmanas!, criado em junho, luta por espaço nas plataformas on-line. Formado por 115 mulheres do Brasil e do exterior, o grupo promove festas diariamente, transmitidas pela plataforma Twitch.
“A programação começa por volta das 14h e vai até uma da madrugada ou mais, dependendo da disposição da DJ”, explica a DJ Deschw, que integra o coletivo.
O grupo surgiu para que as artistas se ajudassem na promoção de eventos on-line e na divulgação dos respectivos trabalhos. “Uma das grandes coisas do UHmanas! foi criar a rede de mulheres, muitas DJs não se conheciam”, conta Deschw.
O coletivo deu visibilidade às artistas. “Várias pessoas que não conheciam o trabalho das DJs passaram a conhecê-lo nas festas”, comemora Deschw.
CONTEÚDO De acordo com ela, o projeto ainda está no começo. “Queremos estruturar nosso canal como plataforma permanente de divulgação de conteúdos para DJs mulheres. A ideia é fazer com que todas consigam viver efetivamente de sua música. UHmanas! não é só um canal, é um posicionamento político”, ressalta.
No início do isolamento social, poucas festas virtuais contavam com DJs mulheres. “Com o surgimento de festivais on-line, percebemos que não havia mulheres ali. Começamos a nos manifestar nos posts. Uma das justificativas era que as pessoas não conheciam DJs mulheres que tocavam com vinil, por exemplo. Isso gerou uma grande revolta nas mulheres que trabalham nesse mercado”, lembra.
Deschw diz que a indústria musical, sobretudo a área de discotecagem, é machista, apesar das conquistas feministas. “Porém, consigo ver um crescimento desde que comecei. A partir do momento em que algumas mulheres começaram a se manifestar, outras passaram a fazer o mesmo”, pondera.
boys Quando a mineira Mary An começou a frequentar festas, raramente via mulheres comandando as picapes. “A gente brincava que era um paredão de boys”, diz ela. “Hoje em dia, todos estranham quando não tem mulher na programação. O protagonismo feminino melhorou muito, mas pode melhorar ainda mais. Espero que o movimento continue se expandindo.”
Black Josie afirma que o fortalecimento da pauta ligada à diversidade no universo da discotecagem é uma grande vitória. “O ideal será o dia em que não vai mais se falar que é mulher, negro, índio. Vai ser uma pessoa!. Porém, ainda não chegamos neste lugar”, diz, afirmando que essa luta só tem se fortalecido.
* Estagiária sob supervisão
da editora-assistente Ângela Faria
NAS REDES
. BLACK JOSIE (@djblackjosie)
. MARY AN (@dj.maryan.music)
. DESCHW (@djdeschw)
. UHmanas! (@uhmanas.tv)
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