Quando, em 2016, um temporal o atingiu em cheio, o rapper paulistano Projota, de 34 anos, pediu socorro aos amigos. O mau tempo que ele enfrentava era uma depressão que lhe tirou o ânimo para fazer aquilo que sempre sonhou: levar sua música para as pessoas. A saída, segundo ele, foi encontrar o equilíbrio entre o que pode afogar ou apenas molhar – algo que ele aborda de maneira mais ampla no álbum Tempestade numa gota d’água, cujo quinto single – Nossa lei – foi lançado recentemente nas plataformas e no formato de videoclipe, em parceria com o carioca Xamã e o produtor Insane Tracks.
A canção fala sobre um casal que, apesar de algumas diferenças, dá de ombros para as convenções do mundo e constrói seu universo para viver juntos. A letra traz uma citação direta do sucesso O Sol, de Vitor Kley, e relembra o verso "não vem de garfo que hoje é dia de sopa", cantado por Wilson Simonal nos anos 1960. "Quando fiz o refrão ‘o mundo que se dane, a gente faz nossa lei’, achei que tinha muito a ver com o Xamã. Ele é um cara que não se importa com padrões estipulados. Ele fala como ninguém da massa, do cotidiano popular", diz Projota, que ainda chama a atenção para o flow (a forma como a letra se encontra com o ritmo) usado pelo parceiro. "É o do vendedor de amendoim, que fala rápido, mas passa a mensagem e te vende o produto. Sou muito fã dele", diz.
Xamã, que desde 2017 tem chamado a atenção no mundo do rap e prepara um novo álbum para novembro, devolve o elogio. "Sempre ouvi o som do Projota, ele é um dos pioneiros no Brasil a tocar no rádio. Se o rap vive um momento bom, deve isso muito a ele. Fazer uma parceria com o Projota é como fincar uma bandeira na Lua", diz. A história do amendoim não é à toa. "Eu vendia no trem. Para oferecer para as pessoas, fazia uma rima. Quando saía mais suingado, elas compravam. É aquele suingue de camelô, das ruas, que eu trouxe para o meu rap", conta.
Outra canção do álbum, que tem como objetivo descontruir algo enraizado na sociedade, é Sai do rolê, lançada em maio, que fala sobre a inadequação masculina. Cantados em dueto com a mineira Cynthia Luz, os versos pedem respeito às minas e condena quem as segura – sem consentimento – na cintura ou pelo cabelo na balada.
FAIXAS E PARCERIAS
"Quando minha filha nasceu (o rapper foi pai de Marieva em fevereiro deste ano), visualizei como iria ser o futuro dela, já que a rua é extremamente hostil com as mulheres. A gente tem que lutar diariamente, interna e externamente, contra o machismo E sempre dar um toque para o amiguinho: olha, isso não é legal", diz Projota, que acredita que todo mundo tem a chance de mudar, e por isso se diz contra a cultura do cancelamento, muito comum nas redes sociais atualmente.
Faixa de temática mais forte, Salmo 23 – aquele que fala "Deus é meu pastor e nada me faltará" – aponta as nuvens que ajudaram a formar a tempestade que atingiu Projota anos atrás. Entre elas, as dificuldades que teve na vida, a morte da mãe aos 9 anos, a busca pela fé e a violência das ruas. Escrita pelo rapper mais uma vez em parceria com Insane Tracks, a música ainda traz reflexão sobre a fama, algo que, nos últimos anos, o cantor tem vivenciado de perto – ele soma mais de 1,5 bilhão de visualizações em seu canal na VEVO, foi destaque na edição do Rock in Rio no ano passado e tem singles de diamante duplo, diamante, ouro e platina. Projota já cantou com Anitta, Anavitória, Thiaguinho, o grupo cubano de hip-hop Orishas e o cantor colombiano J Blavin.
CANAL NO YOUTUBE
Tempestade numa gota d’água foi concebido para ser lançado em duas partes neste ano, mas, por conta da pandemia, a estratégia foi alterada e, a partir de agora, as faixas chegarão ao público de maneira mais espaçada. A última, no primeiro trimestre do próximo ano, será Vale das sombras, um dueto com a cantora Maria Rita, já gravada e com videoclipe pronto. "Essa música vai encerrar esse ciclo de falar sobre a depressão. Foi a primeira que fiz para Deus, da forma como o enxergo, uma energia que se conecta conosco e que me tirou desse vale das sombras. Não é religião, mas algo espiritual", diz.
Projota só pôde comprar seu primeiro videogame aos 25 anos. Era um Playstation 2, aparelho já ultrapassado para a época. De lá pra cá, o entusiasmo pelos jogos só aumentou. Em sua casa, há uma área só para isso, com decoração temática, planejada para ser cenário de um canal sobre o tema, ideia que ele alimenta há cerca de três anos.
Com a parada forçada pela pandemia, o rapper sentiu que era a hora de dar o play no canal Projota Game Room, no YouTube, no qual apresenta diferentes quadros, entre eles o Vem Pro X1, que, quinzenalmente, recebe um convidado para um bate-papo e, claro, uma partida, e o Casal que joga, que tem como parceira sua esposa, a atriz Tâmara Contro. Lançado há três semanas, o canal já conta com quase 40 mil inscritos. "Meu sonho sempre foi ter todos os videogames que lançassem. É uma paixão mesmo. A partir do momento em que pude comprar, não parei mais."